Publicado 17/08/2013 08:13 | Editado 04/03/2020 17:07
Os governos de Lula a Dilma revelaram suas opções de buscarem incorporar o setor produtivo privado em seus programas governamentais. Justificam que o Brasil precisa estimular o investimento privado, que conjugado com o público, possibilita a elevação dos níveis do crescimento econômico brasileiro, sobretudo em época aguda de crise capitalista.
Com essas razões implementam projetos e programas com medidas que incluíram desoneração em folha de pagamento, incentivos fiscais e tributários, parcerias, concessões, leilões, além de novos modos de gestão em setores da prestação do serviço público.
É importante considerar que esse projeto político herdou uma bomba macroeconômica tucana montada sob o tripé dos juros altos, câmbio flutuante e compromisso com o superávit primário. Uma situação que fragiliza a capacidade indutora do Estado brasileiro.
Esse fato explicava a insuficiência do investimento governamental, pois o acordo tácito firmado entre o tucanato e o rentismo drenava (ainda continua) volumosos recursos públicos para o sistema financeiro internacional e seus vassalos nacionais.
No entanto, constata-se que as medidas implementadas por esse novo projeto desde 2003, até os diais atuais, não enfrentam efetivamente esse limitador estrutural. Em seu conjunto mantém-se uma postura frágil e dúbia.
A Carta ao Povo Brasileiro, assinada por Lula em 2002, sinalizou um compromisso com os contratos anteriores – sobretudo com os do rentismo – justificada pela delicada transição política de então. Entretanto, o circunstancial ganhou dimensão de permanência e só recentemente o governo Dilma Rousseff abriu uma transição para desarmar esse artífice que asfixia as finanças públicas de todo o sistema federativo brasileiro.
Mesmo que tardia e lenta, com idas e vindas, esse caminho está sob fogo cruzado do sistema de oposição fora e dentro do país.
A permanência dessa opção macroeconômica conservadora significa continuar limitando os orçamentos estatais, inviabilizando o planejamento público de longo prazo e o atendimento às demandas populares surgidas nas recentes manifestações. Estas clamaram em seu conjunto por uma intervenção maior do Estado.
Nesses últimos dez anos revelou-se que o ciclo Lula e Dilma não deve ficar preso a essa lógica do possibilismo orçamentário e nem tornar os meios paliativos com o setor privado como perenes. Este capital têm objetivos exclusivos de acumulação e em alguns casos utilizam-se do patrimônio público fragilizando o controle da soberania nacional.
Para ajustar essa diretriz faz-se necessária uma nova repactuação política entre o núcleo de esquerda desse Governo, comprometendo-se com um novo projeto nacional de desenvolvimento e sua viabilização através da liderança insubstituível do Estado nacional.
Percorrendo o desenvolvimento programático do PCdoB encontramos algumas respostas sobre o tema em tela. Em sua sistematização o Partido caracteriza o estágio do desenvolvimento brasileiro – que continua como base no programa aprovado em 2009 – aplicando os pressupostos das transições, seus papéis e suas etapas e assim conclui: “Um país marcado por uma longa formação mercantil-capitalista-escravista, de um capitalismo de desenvolvimento médio tardio e do tipo dependente. Essa condição cria deformações estruturais e crescimento heterogêneo. Por isso restam importantes tarefas democráticas e nacionais, de cunho capitalista a serem efetivadas”. Acrescenta ainda: “Em função do seu estágio de desenvolvimento, essas transições podem ser mais longas, irregulares e acidentadas”. *1
Na 8ª conferência nacional em 1995, marco dessa elaboração, afirma que o conjunto de medidas de feição capitalista em nosso país já é parte integrante da fase de transição ao socialismo. “E para termos êxitos em nosso rumo socialista, devemos compreender que caminhos, métodos, recursos e instrumentos intermediários são necessários para a passagem a esse modo de produção”. *2
A chegada de Lula à Presidência da República abriu uma possibilidade de estabelecermos uma transição rumo a um projeto estratégico para o desenvolvimento do Brasil. Como este – assim afirma o programa atual do PCdoB – é o caminho ao socialismo no Brasil, temos, portanto uma transição dentro de outra.
Esse novo ciclo político, mesmo imerso em contradições, condicionado por fatores políticos, econômicos e ideológicos, estabeleceu alguns caminhos que dialogam com as remoções dos entraves que obstaculizam o progresso brasileiro apontado pelo PCdoB.
Ao buscar – mesmo que de uma forma híbrida – uma nova orientação macroeconômica, realizando programas com foco na superação dos gargalos na infraestrutura, estímulos à produção e a competitividade do país, busca disputar as condições do desenvolvimento pleno das forças produtivas no país. E para esse objetivo atrai o investimento privado produtivo. Em seu conjunto esse esforço é uma condição necessária nas transições como a que está em disputa no Brasil. Ela pode pavimentar um rumo de largo alcance.
Não obstante perceber o capital privado produtivo com um papel complementar, sobretudo nas fases transitórias do desenvolvimento brasileiro, não podemos admiti-lo exercendo o controle em atividades estratégicas da economia nacional. Ao contrário, ele deve estar sob as diretrizes estatais, evitando a inversão do privado sobre o público.
Nesse processo um dos meios difundidos – as concessões públicas e suas derivações, sejam por tempo determinado ou não – compreendo-os como uma privatização temporária ou permanente dos bens e dos serviços públicos, uma modalidade justificada pelos seus gestores pelo esgarçamento do orçamento público. Penso ser mais precisa essa concepção do que outras que resultam mais da justificativa política e não de um novo conceito.
Assimilo seu papel assegurada com premissas que salva guardeiem o controle da soberania nacional, o interesse público e sejam aplicadas num ambiente de transição programática progressista. Que não seja guiado pelo o espontâneo do mercado e sim pelo consciente de um planejamento estratégico conduzido pelo Estado nacional.
Transposto, da teoria do Capitalismo de Estado de Lênin e desenvolvido em artigo por João Amazonas, duas passagens que situa minha opinião:
Lênin: “tendo em conta que a etapa imediata não podia ser o trânsito direto à construção socialista.” “Tinha-se que recorrer aos métodos de rodeio, ao capitalismo de Estado, etc. sem o que a revolução poderia estagnar ou mesmo sucumbi”.
Amazonas: “Chegar ao poder, em certas circunstâncias, não é tão difícil. Difícil mesmo — a experiência o tem demonstrado — é construir o novo regime, identificar e agarrar um por um os elos de uma infinita cadeia de complicados problemas econômicos e sociais nos quais muitas vezes o novo aparece mesclado com o velho”.
Assim penso.
*Divanilton Pereira é membro do comitê central do PCdoB.
*1 e *2 – trechos da exposição especial de Renato Rabelo na 8ª Conferência Nacional do PCdoB em 1995.