Uma proposta de reforma política democrática e criativa

Em encontro realizado com a presidenta Dilma para discutir a Reforma Política a OAB e o MCCE apresentaram o Projeto de Iniciativa Popular Eleições Limpas. Na oportunidade ela manifestou sua simpatia pela proposta. E, nos últimos dias, a imprensa tem noticiado a possibilidade de o governo vir a apoiar este Projeto caso não seja aprovado o plebiscito sobre a Reforma Política.

Por Aldo Arantes*

A luta em defesa do plebiscito é fundamental. Coloca nas mãos do povo a decisão de qual Reforma Política atende ao seu interesse. Todavia, na hipótese de não haver plebiscito, é fundamental que as forças democráticas construam uma alternativa de Reforma Política que conte com apoio de amplas camadas da sociedade, organizações sociais e partidos políticos. E esta alternativa deve ser buscada de imediato.

Há anos o congresso tenta votar uma Reforma Política e não consegue. E a razão é simples. Há, com variantes, a Reforma Política Democrática e a Antidemocrática. A primeira visa aprofundar a democracia e construir um poder político em maior sintonia com o povo brasileiro, sobretudo com as camadas mais pobres da população. Esta alternativa visa, também, elevar o nível de consciência política da sociedade e consolidar partidos os partidos políticos. A segunda é uma reforma política que pretende concentrar, mais ainda, o poder político das elites, reduzindo o número de partidos e ampliando a força do dinheiro no processo eleitoral.

A inexistência de uma maioria para qualquer destas propostas explica o fato do Congresso não ter conseguido aprovar uma Reforma Política até agora. Diante da evidente crise de representação política as forças conservadores do Congresso se apressam em elaborar um projeto dentro de 90 dias.

As primeiras declarações de integrantes da Comissão, indicada para esta tarefa, não abordam as questões estruturantes de uma Reforma Política Democrática tais como o financiamento de campanha e o sistema eleitoral. Levantam questões como a não reeleição para cargos executivos, a coincidência das eleições e a proibição das coligações proporcionais. Querem votar logo e submeter o “prato feito” ao referendo popular.

O momento é decisivo. Ou os defensores da Reforma Política Democrática se unem e mobilizem a opinião pública ou será aprovada uma Reforma Antidemocrática. Somente esta união e uma ampla mobilização da sociedade pode barrar a manobra dos setores conservadores e assegurar a aprovação de uma Reforma Política Democrática.

E esta alternativa surgiu com a proposta da OAB, MCCE e outras entidades. Estas entidades partem da constatação de que o País enfrenta uma crise de representação política. E que a raiz desta crise está no financiamento privado de campanha, através do qual o poder econômico exerce sua influência para compor governos e representações parlamentares à sua imagem e semelhança. E abre caminho para a corrupção eleitoral através do “caixa dois” de campanha.

A Lei da Ficha Limpa deu importante contribuição ao adotar medidas de combate às consequências da corrupção eleitoral. Mas é necessário extirpar sua causa. E a causa fundamental da corrupção eleitoral está no financiamento privado de campanha, sobretudo no financiamento de empresas. Daí a centralidade que o debate sobre a Reforma Politica ganhou no país.

Na Audiência Pública realizada no Supremo Tribunal Federal, para discutir a Ação Direta de Inconstitucionalidade da OAB sobre o financiamento privado de campanha, inúmeras personalidades deram números sobre o tema. O Deputado Henrique Fontana denunciou que os gastos gerais da campanha eleitoral de 2002 evoluíram drasticamente de 827 milhões de reais em 2010 para 4 bilhões e 900 milhões. E, dentre os 513 deputados eleitos em 2010, 369 estão entre os que dispunham de mais recursos para suas campanhas.

Na mesma oportunidade o diretor de Pesquisas do Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro, Geraldo Tadeu, declarou que tem havido um aumento da contribuição de empresas e uma redução da pequena contribuição de pessoas físicas. Em 2008 empresas doaram 86% dos recursos da campanha eleitoral. Em 2010 doaram 91,30% e em 2012 95,10%. Tais números são mais fortes do que qualquer denúncia da influência do poder econômico no processo eleitoral. Esta influência desvirtua gravemente o resultado eleitoral e a vontade do cidadão.

O Projeto de iniciativa popular apresentando pela da OAB, MCCE e várias endades sociais, intitulado Eleições Limpas, prevê o financiamento público de campanha visando democratizar a disputa eleitoral. Prevê, também, a doação de pessoas físicas no limite de R$ 700,00, doados aos partidos políticos e não aos candidatos.

Todavia a implantação do financiamento público de campanha não é viável no atual sistema eleitoral pois as eleições são realizadas com milhares de candidatos. Por isto torna-se indispensável a adoção de um novo sistema eleitoral que proíba o financiamento privado de campanha e assegure as condições para uma representação politica mais identificada com as causas populares.

O Projeto de Iniciativa Popular estabelece a eleição parlamentar em dois turnos. No primeiro as eleições seriam realizadas em torno da plataforma partidária e da lista fechada de candidatos. Neste turno estaria assegurado o debate em torno de ideias, projetos e não em torno de objetivos individuais. Com base no quociente eleitoral seria definido o número de vagas parlamentares a serem preenchidas por cada partido.

No segundo turno cada partido disputaria o voto popular com dobro das vagas obtidas. Assim o partido que obtiver cinco vagas das cadeiras parlamentares disputaria o segundo turno com os dez primeiros nomes de sua lista partidária. Caberia ao eleitor dar a palavra final sobre quais seriam os eleitos.

Com isto se combina, de forma criativa, o objetivo de elevar o nível da disputa eleitoral em torno de projetos para o País e , ao mesmo tempo, leva em conta a cultura política brasileira da votação em candidatos. Para assegurar a elaboração de uma lista de candidatos, de forma democrática, seria garantida a participação de todos os filiados do partido.

Um dado relevante desta proposta é que ela assegura a coligação proporcional realizada com base em programas políticos comuns. E proíbe a barganha, com a utilização do tempo de TV como moeda de troca.

Só através de uma ampla frente que inclua os mais diversos segmentos, organizações sociais e partidos políticos será possível barrar a manobra dos setores conservadores e assegurar a aprovação de uma Reforma Política Democrática.

O projeto de Iniciativa Popular Eleições tem sido recebido de forma muito positiva por diversos setores da sociedade por representar algo novo, criativo e de caráter democrático. Ele pode se transformar no fator de unificação e mobilização da sociedade. O momento e de urgência política. Para que esta proposta se viabilize é indispensável a coleta de milhões de assinaturas para que ela seja votada pelo Congresso e ter validade para as próximas eleições.

* Aldo Arantes é membro da Comissão de Reforma Política da OAB e membro do Comitê Central do PCdoB