Capitais terão marchas contra o Estatuto do Nascituro
Capitais realizam marchas neste sábado (15) contra o Estatuto do Nascituro, que prevê medidas polêmicas como o que está sendo chamado de “Bolsa Estupro”, um auxílio financeiro para mulheres terem os bebês frutos de estupro.
Por Paloma Rodrigues*, na Carta Capital
Publicado 14/06/2013 18:32
O projeto conta o apoio da bancada evangélica. O projeto precisa ainda passar pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) antes de ir ao plenário da Câmara – e seguir para o Senado.
"O Projeto de Lei n. 478, fere e revoga diversas conquistas já feitas pela autonomia da mulher: como o direito ao aborto em caso de estupro e fetos inábeis", diz Mariana Beltrame, 23 anos, fotógrafa e uma das organizadoras do Ato em Belo Horizonte. Na capital mineira já são mais de 1,5 mil pessoas confirmadas na manifestação. Em São Paulo já passam de 15 mil. Os eventos também acontecerão no Rio de Janeiro, no posto 5 em Copacabana, Recife e Porto Alegre. Em Brasília, a organização chama as mulheres a protestarem contra a condição de "encubadoras". Outras manifestações estão marcadas para Santa Maria, Jaraguá do Sul e Joinville, todas em Santa Catarina, e Campina Grande, na Paraíba.
Os defensores do Estatuto do Nascituro desejam que seja atribuído ao zigoto e ao embrião, mesmo antes da fecundação, a condição jurídica e moral atribuída a uma pessoa nascida. "O atraso começa pela referência ao termo nascituro, absolutamente inadequado por referir-se àquele conjunto de células pré embrionárias que têm possibilidade de se transformar em ser humano e pessoa, se houver o desenvolvimento intra-uterino e a ocorrência do nascimento com vida", escreveu em artigo para CartaCapital Ana Maria Costa, presidente do Centro Brasileiro de Estudos de Saúde (Cebes).
Para Júlia Rodrigues, integrante da Comissão Organizadora do Fórum sobre Feminismo e Direitos Humanos e Secretária da Comissão da Diversidade Sexual e Direito Homoafetivo da OAB, Subseção de Campina Grande, Paraíba, o principal ponto de retrocesso é o impedimento completo de interromper gestações, diferentemente da legislação atual que abre três exceções (estupro, fetos anencéfalos e casos que representem risco de vida para a mãe). "O problema é que a mulher está sendo obrigada a seguir com a gravidez, o que implica em uma série de sofrimentos como ter de relembrar cotidianamente do abuso sofrido", diz ela. "O Estado também pretende procurar o pai do bebê para que ele se responsabilize pela pensão. Apenas se o pai não for encontrado é que o Estado se responsabilizará pelo auxílio financeiro".
O que pode acontecer a partir disso, segundo Júlia, o Estatuto abre uma lacuna que pode permitir que os estupradores peçam a guarda das crianças. "O pai pode pedir direitos de paternidade. Ele pode exigir da mãe o direito de criar e cuidar." Em quais casos se poderia dizer que a justiça intercederia em favor do estuprador? Júlia explica que, mesmo atualmente, o estupro por vezes é amenizado pelas circunstâncias. "Por exemplo uma mulher que estava bêbada e foi estuprada. É considerado estupro porque não foi consentido, mas muitos veem a bebida como um facilitador dado pela mulher. O juiz pode amenizar a culpa do estuprador e acreditar que ele tem condições de dividir a guarda daquela criança". A consequência disso para as mulheres, defendem os coletivos feministas, será a de conviver com seus agressores ao longo de toda a vida.
Nos casos em que o pai da criança não for encontrado, o Estado se responsabilizará pela criança oferecendo auxílio financeiro, a partir de um fundo a ser criado. "O projeto é muito aberto e ainda é difícil saber como realmente vai acontecer".
Os atos pretendem chamar atenção pra pauta e que elas mobilizem a sociedade civil para pressionar as votações. "Temos uma bancada evangélica muito concentrada em aprovar esse projeto como se ele não representasse grandes mudanças, por isso temos textos tão abertos", diz Júlia, mas para ela esta é a maior ameça do Estatuto. "Um texto tão aberto abre lacunas para diversos processos, como por exemplo, as mulheres terem de provar que de fato sofreram um aborto espontâneo para que não sejam processadas judicialmente".
*é jornalista de CartaCapital