Comissão Nacional da Verdade completa 1 ano de funcionamento
Segundo a nova coordenadora da Comissão Nacional da Verdade, Rosa Maria Cardoso, as Forças Armadas continuam desafiando as investigações de crimes cometidos por agentes de Estado no período da ditadura militar. A comissão completa nesta quinta-feira (16) um ano de funcionamento, mas ainda com dificuldades de acesso a valiosos arquivos da repressão.
Publicado 16/05/2013 11:25
A Comissão investiga crimes políticos cometidos por agentes do Estado entre 1946 e 1988 e foi instalada há um ano, para atuar, a princípio, por dois anos e encerraria sua pesquisa em maio do ano que vem.
À imprensa, a advogada Rosa Maria Cardoso, que assume nesta sexta-feira (17) a função da coordenadora da comissão e que defendeu a presidente Dilma Rousseff e outros perseguidos políticos na época do regime militar, anunciou que tentará novos "caminhos" para ter acesso aos arquivos da repressão.
O grupo encarregado de investigar crimes do Estado teve sua entrada barrada pelas Forças Armadas nas dependências do CISA, CIEX e Cenimar – os centros de inteligência da Aeronáutica, Exército e Marinha que organizavam as operações de combate a grupos armados nas cidades e nas áreas rurais.
A advogada não adiantou quais caminhos a comissão usará para chegar aos documentos. Uma das possibilidades seria esgotar todas as estratégias legais para entrar nas salas dos centros de inteligência. Reservadamente, já se chegou a discutir um pedido legal de busca e apreensão.
Na terça-feira (14), a presidenta Dilma Rousseff defendeu o trabalho da Comissão como necessário para o Brasil virar uma página da história. Ressalvou que não é questão de vendeta, mas que só tem um jeito de o País dar esse passo, que é fazer com que "a verdade toda emerja e apareça sem nenhum meio-termo" para que isso nunca mais aconteça.
Divulgação do relatório
Integrantes da Comissão se reuniram na terça-feira (14) no Palácio do Planalto com a presidenta. No encontro com os integrantes da comissão, foram antecipadas para a presidenta os resultados de um levantamento dos primeiros 12 meses de trabalho, que será apresentado ao público na próxima terça-feira (21). "Vai haver surpresa", disse Paulo Sérgio Pinheiro, atual coordenador do grupo.
"Vamos oferecer informações concretas." A comissão divulgará um levantamento "quantitativo" e "qualitativo" com informações obtidas por 14 grupos de trabalho.
Pinheiro avaliou que o novo prazo da comissão permitirá ouvir um número maior de agentes da repressão e uma análise da grande quantidade de documentos oficiais. Pinheiro observou que na Argentina a comissão montada para investigar crimes da ditadura ocorrida entre 1976 e 1983 durou nove meses.
Legislação
A Lei 12.528, que criou a comissão, destaca que o grupo pode requerer ao Judiciário acesso às informações. A mesma lei ressalta que é "dever dos servidores e dos militares colaborar com a comissão".
A comissão já tentou de diferentes maneiras convencer os comandos militares a cumprir a determinação. Em junho do ano passado, o ministro da Defesa, Celso Amorim, chegou a sinalizar, em entrevista – tendo ao lado de membros da comissão -, que as Forças Armadas cumpririam a lei e abririam os arquivos dos centros de inteligência. "A lei diz que nós temos todo o dever de cooperar. Em termos gerais, tudo estará aberto", disse na ocasião o ministro. Amorim não repetiu o discurso de seus antecessores de que os papéis da ditadura foram queimados. Mas até o momento, não conseguiu avanços significativos.
Trabalho estendido
A presidente Dilma Rousseff decidiu prorrogar até dezembro de 2014 os trabalhos da Comissão Nacional da Verdade atendendo o pedido de movimentos sociais, como da UNE, que em diálogo com a presidenta solicitou que as investigações fossem prorrogadas.
De acordo com a previsão inicial, a comissão deveria encerrar seu trabalho em maio de 2014. Um dos principais problemas de tempo do grupo é a análise dos documentos que chegam às suas mãos, produzidos por cerca de 90 instituições brasileiras e estrangeiras.
Portas abertas do governo para a Comissão Nacional da Verdade
No gabinete da ministra-chefe da Casa Civil, Gleisi Hoffmann, os pedidos que partem do grupo, instituído oficialmente por Dilma um ano atrás, em 16 de maio de 2012, são prontamente analisados. Quando necessário, outros ministérios são convocados a colaborar, com recursos financeiros, tecnologia e pessoal.
As pastas mais envolvidas nesse esforço são as de Ciência e Tecnologia, Educação, Relações Exteriores e Defesa. No conjunto, o número de assessores da comissão passou de 14 para mais de 70 em um ano. Nos próximos dias a equipe será reforçada por quase uma centena de analistas de informações contratados pelo MEC.
A Casa Civil também analisa a possibilidade de estender por mais seis meses o trabalho da comissão, previsto para terminar em maio de 2014. A mudança evitaria a divulgação do relatório final às vésperas da Copa do Mundo e no período da pré-campanha presidencial.
Embora criada por lei no governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a comissão é mais identificada com o mandato de Dilma, militante de esquerda, a quem coube escolher e dar posse a seus sete integrantes.
A expectativa é de que o grupo produza o mais aprofundado e contundente relatório já feito sobre a ditadura. Embora a comissão não seja ligada ao governo e o relatório não possa ser considerado obra sua, caberia a Dilma divulgá-lo.
Da redação, com informações O Estado de S. Paulo