Augusto Buonicore: “O Brasil de hoje tem muito de João Amazonas”

A Fundação Maurício Grabois em parceria com a Editora Anita Garibaldi, a Comissão Especial de Anistia Vanda Sidou, a Associação 64/68 Anistia, o Comitê Estadual da Verdade e Os Desaparecidos Políticos, lançou na noite da última segunda-feira (13), em Fortaleza, o livro “Meu verbo é lutar – A vida e o pensamento de João Amazonas”, de Augusto Buonicore.

Antes da apresentação da biografia, foi exibido um vídeo-documentário que registra imagens do Araguaia, o velório do líder comunista e o dia em que suas cinzas foram espalhadas na região, atendendo ao pedido do próprio João Amazonas.

Benedito Bizerril, membro da Fundação Maurício Grabois no Ceará, destacou mais uma ação da organização. “Este é um momento importante, uma oportunidade de conhecer melhor a vida e a luta de João Amazonas que teve papel preponderante na vida política do país, com atuação destacada na luta em defesa dos direitos dos trabalhadores, do Brasil e do Socialismo”, ratificou.

Dasafios para escrever a biografia

Augusto Buonicore, autor da biografia, considera eventos este uma oportunidade de ampliar e divulgar a própria história do Brasil. “Falar de João Amazonas é falar do país, das conquistas do povo brasileiro que a juventude desconhece. É impossível se conhecer a história do Brasil sem conhecer a história dos comunistas brasileiros”, defendeu.

Segundo o escritor, o trabalho de pesquisa foi árduo. “Não foi fácil escrever esta biografia. Estudar períodos marcados pelas ditaduras do Brasil – Estado Novo e a Militar – representa muita dificuldade pela forma como as documentações eram tratadas. Muitas foram destruídas para não incriminar pessoas. Além disso, os próprios militantes comunistas faziam questão de esquecer fatos, ter o mínimo de informação possível para não serem torturados”.

Buonicore acrescenta ainda que documentações do próprio PCdoB também foram destruídas com o objetivo de preservar a integridade de lideranças comunistas. Além disso, acrescenta, a morte de tantos membros do PCdoB também dificultou o acesso às informações. “Durante a ditadura, foram assassinados quase uma centena de militantes do PCdoB, desses, mais de uma dezena só de membros do Comitê Central do Partido, dentre eles Ângelo Arroyo, Pedro Pomar, Maurício Grabois, dentre outros”, enumerou.

O escritor destaca também a postura reservada de João Amazonas. “Ele falava pouco sobre si mesmo. Costumava dizer que ‘o importante é a causa e o Partido’. Só no final da vida falou sobre sua infância e juventude, mesmo assim de maneira limitada. Ele era avesso ao personalismo”, recordou.

Para a construção da biografia de Amazonas, Buonicore destaca uma valorosa colaboração. “Edíria Carneiro, esposa do líder comunista, cedeu farta documentação familiar e nos apresentou outro lado de Amazonas que surpreendeu. Ele parecia ser duro, mas era um companheiro amoroso e se referia à esposa como ‘minha eterna namorada’”.

Mais sobre Amazonas

Mas o lado político e articulador de João Amazonas foi seu maior legado. Ele iniciou sua militância na década de 1930, quando era ainda um jovem operário. “A afinidade com o PCdoB surge no movimento de resistência ao nazifascismo. Considero a maior contribuição que os comunistas deram à humanidade a derrota do nazifascismo que dominava praticamente todo o mundo. E Amazonas está no centro desta luta, junto com seus camaradas, no Brasil”, ratifica Augusto Buonicore.

O escritor ressaltou a participação do líder comunista no comício da Aliança Nacional Libertadora, em Belém, no ano de 1935. “Foi nesta mesma época que ele organiza o sindicato na sua cidade natal e torna-se dirigente expressivo”.

Augusto Buonicore falou sobre o êxito comunista nas eleições de 1947, quando o Partido estava há poucos dias na legalidade, com a eleição de um senador – Luiz Carlos Prestes – ; 14 deputados federais, dentre eles João Amazonas e Maurício Grabois; e ainda mais de 40 deputados estaduais.

Em 1962, João Amazonas foi um dos principais responsáveis pela reorganização do PCdoB. “Ele aprofundou o debate de ideias com contribuições teóricas relevantes e grande poder de articulação”, reforçou o escritor.

Apesar de atuar na ilegalidade, em 1964, com o golpe militar, Amazonas e outros dirigentes elaboram estratégia de luta contra a ditadura. “Ele defendia a postura de ‘radicalizar ampliando e ampliar radicalizando’. Defendia propostas de lutas radicais de onde surgiu o principal movimento de luta armada e resistência à ditadura – a Guerrilha do Araguaia. Os militares tentaram apagar o movimento da história exterminando mais de 60 militantes comunistas. Brasileiros que desapareceram nas mãos da ditadura militar e até hoje continuam desaparecidos”.

Segundo Buonicore, João Amazonas não defendia só o braço armado na luta contra a ditadura. “Ele foi um dos grandes elaboradores de estratégia e trabalho de resistência nas cidades pois acreditava que a luta deveria ser guerrilheira e institucional. Defendeu a frente ampla em 1966, com Carlos Lacerda e João Goulart porque acreditava que cada cisão da ditadura era fundamental. Teve papel importante na luta pelas Diretas e dizia sempre que ‘devemos ir onde a batalha se apresenta’. Amazonas articulou também a vitória que pôs fim à ditadura como um dos principais articuladores do Colégio Eleitoral”, enumerou.

Augusto Buonicore considera que o “Brasil é radicalmente diferente de 1985 pra cá”. “Vivenciar momentos como este, poder falar para a sociedade abertamente, a eleição de um operário e de uma ex-guerrilheira, tudo é fruto desta ruptura de 1985 que João Amazonas foi protagonista”.

Uma das últimas bandeiras defendidas por Amazonas, no final de 1088, foi a unidade da esquerda para a disputa das eleições de 1989. “Foi dele a proposta desta frente de esquerda que teve Lula como candidato. Não saímos vitoriosos naquele ano por pouco devido ao pesado ataque da mídia conservadora. Esta foi uma grande sacada do Amazonas que permitiu uma das maiores vitórias do povo brasileiro. João Amazonas morreu poucos meses antes da vitória de Lula. O Brasil que temos hoje tem muito de Amazonas”, ratificou.

Participações

Messias Pontes, presidente da Associação 64/68 Anistia, destacou a satisfação de participar de um evento como este. Ele falou ainda das ações da associação, que tem priorizado a memória dos que lutaram em defesa de um Brasil melhor. “O que falta no país é que esta nova geração precisa conhecer nossa história. Estamos juntos nesta trincheira de lutar pelo resgate da memória, da verdade e da justiça”.

Marcos Venicius, membro do grupo Desaparecidos Políticos, destacou sua visita à região do Araguaia e a vivência com camponeses. “Brilha nos olhos deles o que defendia os comunistas. O povo da mata passa a ser parte deste povo. João Amazonas, presente!”

Carlos Augusto Diógenes (Patinhas), presidente estadual do PCdoB-CE, destacou o papel de Amazonas na reorganização do Partido no Ceará. “Tive a oportunidade de encontrá-lo quando saímos da clandestinidade, em 1980. Ele pediu que viesse para o Ceará encontrar aqui Gilse Cosenza, Abel Rodriges, Benedito Bizerril, Messias Pontes e outros valorosos camaradas. Amazonas reunia a simplicidade de ideias com força e firmeza. Sabia que o Brasil entrava numa nova realidade e tinha compreensão política disso”.

“Se hoje fazemos parte de um Partido respeitado, com participação política ampla e atuação em várias frentes de luta, devemos isto a João Amazonas que sempre compreendeu as necessidades do povo e buscava soluções para elas. Nosso desafio é continuar esta luta e preservar o legado de Amazonas”, defendeu Patinhas.

O vereador Evaldo Lima também ratificou a importância de preservar a memória de líderes como João Amazonas. “Este é um momento de comemoração, ato em que destacamos a trajetória deste camarada e conjugamos o mesmo verbo de luta”. Já o deputado estadual Lula Morais destacou a vida de João Amazonas como “fio condutor da história revolucionária do Brasil”. “Reforçar sua importância é continuar a história”.

Outros lançamentos

Além da biografia de João Amazonas, a Fundação Maurício Grabois já tem agendado mais um lançamento importante de biografia no Ceará. Em junho, no dia 6, será lançado o livro "Meu Companheiro – 40 anos ao lado de Luiz Carlos Prestes", de Maria Prestes, viúva do Cavaleiro da Esperança. Neste ano outros títulos também foram lançados pela fundação, como a biografia de Maurício Grabois e ainda sobre os 90 anos de atuação do Partido Comunista do Brasil.

Da redação, de Fortaleza,
Carolina Campos