Muro da ocupação israelense na Cisjordânia completa 11 anos

Em abril, a construção de um muro de concreto que corta a Cisjordânia em flagrante ocupação do território palestino e segregação, por parte de Israel, completa 11 anos. Uma delegação brasileira participou em um dos protestos realizados tradicionalmente às sextas-feiras, acompanhada pelo Portal Vermelho, e presenciou a organização, em comitês populares, da resistência palestina.

Por Moara Crivelente, da redação do Portal Vermelho

Muro de separação em Aida - Moara Crivelente / Portal Vermelho

A “barreira de separação”, também conhecido por “muro de segurança” pelos israelenses, ou “muro da vergonha”, segundo os palestinos, teve sua construção ordenada pelo antigo primeiro-ministro Ariel Sharon, em 2002, enquanto se desenvolvia a Segunda Intifada palestina. A intifada foi um levante popular contra a ocupação israelense, então intensificada pela operação militar "Escudo de Defesa", que matou cerca de 500 palestinos e causou grande destruição na Cisjordânia.

A construção deste muro tornou-se rapidamente a maior, mais cara e mais influente construção na história israelense, segundo muitos analistas, e já vem sendo debatida pela política interna em um formato problemático que mostra contornos confusos aos que esperam bases ideológicas para a manutenção ou destruição desta barreira.

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O antigo ministro da Defesa Moshe Arens, por exemplo, de direita, defende a destruição da "barreira de separação" por acreditar que ela é prejudicial para a imagem internacional de Israel, e que já não tem utilidade. São frequentes os levantamentos estatísticos que abordam, em Israel, o imapacto da construção na "segurança", enquanto atores internacionais atribuem a melhoria da situação ao envolvimento da Autoridade Palestina na questão, através da "coordenação" entre israelenses e palestinos.

Por outro lado, esquerdistas israelenses como o parlamentar Eitan Cabel, do Partido Trabalhista, dizem que a destruição do muro fortalecerá propostas de um único Estado binacional, impulsionando a anexação da Cisjordânia por Israel. Neste caso, ou o Estado seria não-judeu, ou não-democrático. Por isso, a proposta é a manutenção de um muro que contemple as fronteiras de 1967 (quando Israel passou a ocupar territórios árabes, na Guerra dos Seis Dias), ou seja, as reconhecidas internacionalmente para uma solução de dois Estados.

A "barreira de segurança"

Para alavancar o processo e convencer os poucos que ainda precisavam ser convencidos sobre a construção do muro, Sharon usou a “instabilidade” e a preocupação pela “segurança” israelense (contra o gradual levante palestino e os ocasionais ataques a locais públicos), principalmente devido ao aumento na construção de colônias judias em pleno território palestino, tanto na Cisjordânia quanto na Faixa de Gaza.

Atualmente, o muro está quase completo, dividindo vilas, terras e famílias. A presença de oito metros de altura de concreto lembra aos palestinos diariamente sobre a separação, a alienação das suas terras e plantios, aos quais alguns conseguem chegar apenas passando por postos de controle militar israelense, ocasionalmente.

Dos dados mais facilmente verificáveis, fornecidos por organizações israelenses para a defesa dos direitos humanos como B’Tselem, para além das mudanças constantes no projeto de construção (que vai além-Linha Verde, acordada internacionalmente para demarcação de fronteiras), em 2012 havia já 525 quilômetros de muro construídos, sendo que 85% desta extensão estava dentro do território palestino.

Nesta tendência, há já quase 9% do território palestino do lado “israelense” do muro, que tem oito metros de altura ao longo de 10% da construção, e cercas elétricas de dois metros de altura em 90%. O custo total da construção, até 2012, havia sido de 2,6 bilhões de dólares, fora os 260 milhões de dólares anuais gastos em manutenção.

As discussões entre os partidos e grupos da sócio-política israelense tornaram a interpretação da questão mais complicada do que apenas no sentido ético da “ocupação” do território palestino.

Por exemplo, os colonos judeus já assentados na Cisjordânia se dividiram no debate entre os que temiam ficarem alijados dos serviços públicos israelenses, os que defendiam que a construção fosse ainda mais dentro do território palestino (para aumentar a capacidade de anexação) e assim garantir mais vantagens durante as negociações. Os palestinos não poderiam ser permitidos sentir que a construção do muro de acordo com a Linha Verde era uma garantia da preservação dos seus territórios.

Protestos semanais e comitês populares

A Segunda Missão de Solidariedade ao Povo Palestino (organizada pelo Comitê pelo Estado da Palestina, e que esteve na Cisjordânia entre 18 e 24 de abril, representando diversas entidades da esquerda brasileira) participou no protesto contra o muro da ocupação em Bil’in, organizado pelo coordenador do Comitê de Luta Popular local Abdallah Abu Rahma.

Abu Rahma expôs um filme sobre os protestos organizados pelos comitês populares da Cisjordânia, que se coordenam para unificar a luta contra a ocupação. O método escolhido, de acordo com os coordenadores, é a resistência pacífica, através de diversas atividades que dificultam a ocupação e marcam a presença palestina. Um exemplo dado por Abu Rahma foi o trabalho constante na terra, melhorando e cultivando campos destruídos pelas forças israelenses ou ameaçados pela construção do muro.

O coordenador de Bil’in disse que, dos planos previstos para a construção do muro na região, através dos protestos e da assistência de advogados, que conduziram a causa através de recursos mais “convencionais”, um tribunal israelense emitiu uma decisão judicial sobre a ilegalidade do muro, em 2007, apesar de só terem congelado a sua construção quatro anos depois, em 2011.

Além disso, de acordo com Abu Rahma, as ações diretas de comitês como o de Bil’in provocaram a redução da extensão territorial confiscada através da construção do muro, de 58% para 25% dos quase 4.000 dunams (aproximadamente 400 hectares) que formam Bil’in.

Ainda assim, o muro está presente, e separa Bil’in de uma colônia judia cujos adolescentes ortodoxos assistem aos protestos, de cima de uma colina, instigando os soldados enquanto estes lançam granadas de gás-lacrimogênio e outros efeitos contra os protestantes, até mesmo os que levavam bandeiras brasileiras. Em resposta, jovens palestinos lançam pedras contra os soldados, em outra ação que se tornou simbólica.

O protesto atrai ativistas solidários à causa palestina de diversas regiões do mundo, conta Abu Rahma, que diz receber grupos de diferentes países a cada sexta-feira. Naquela ocasião, entretanto, um jogo de futebol atrasado, em homenagem a um jovem palestino morto durante os protestos, em 2007, fez com que o número de participantes tivesse sido reduzido.

Abu Rahma já passou temporadas nas prisões israelenses, e em uma delas, de cerca de um ano e meio, a acusação havia sido montada sobre o testemunho de um garoto de 12 anos, preso pelas forças israelenses e interrogado até que revelasse o nome do coordenador.