Câmara de São Paulo restaura 15 mandatos comunistas de 1947
Devido à anulação do registro do Partido Comunista, todos se elegeram pelo PST. Entre os eleitos está a primeira mulher vereadora de São Paulo, Elisa Kauffmann Abramovich.
Publicado 18/04/2013 10:39 | Editado 04/03/2020 17:16
A Câmara Municipal de São Paulo aprovou nesta quarta (17 de abril), o projeto de resolução de autoria do vereador Orlando Silva (PCdoB), que promove uma reparação histórica dos vereadores eleitos em 1947 pelo Partido Social Trabalhista (PST), não empossados por motivação política e ideológica. O projeto foi aprovado em votação simbólica, por unanimidade de todos os líderes partidários.
A decisão da Câmara de São Paulo se dá após votações ocorridas na Câmara de Deputados e no Senado, com o mesmo teor de devolução simbólica dos mandatos de 14 parlamentares comunistas cassados no período de reabertura política pós-guerra e do senador Luiz Carlos Prestes.
Entre os vereadores está a primeira mulher eleita vereadora em São Paulo, Elisa Kauffmann Abramovich. Os demais são Adroaldo Barbosa Lima, Antonio Donoso Vidal, Armando Pastrelli, Benedito Jofre de Oliveira, Benone Simões, Calil Chade, Carlos Niebel, Iturbides Bolivar de Almeida Serra, Luis João, Mario de Sousa Sanches, Mauro Gattai, Meir Benaim, Orlando Luis Pioto e Raimundo Diamantino de Sousa.
Em sua justificativa, o projeto de Orlando diz que “o ato de impedimento de posse destes parlamentares se constituiu em ato de inominada violência, contra a democracia e os princípios da soberania popular.”
“É dever de justiça desta casa, reconhecer ainda que simbolicamente, a representação popular daqueles que eleitos, foram injusta e ilegalmente impedidos de assumir seus assentos nesta Câmara Municipal de São Paulo”, diz o vereador Orlando.
Contexto histórico
O ato de cassação dos mandatos remonta a uma série de eventos articulados para derrubar os mandatos comunistas que avançavam por todo o país, durante o governo de Eurico Gaspar Dutra. Em 7 de maio de 1947, o Superior Tribunal Eleitoral, por três votos a dois, cancelou o registro do Partido Comunista do Brasil, numa decisão arbitrária, considerada um erro judiciário que manchou o regime democrático consagrado pela Constituição de 1946. De imediato, o Partido Comunista do Brasil recorreu ao Supremo Tribunal Federal contra a decisão.
Em dezembro de 1947, a cidade de São Paulo voltou a escolher seus representantes da Câmara Municipal através do voto direto, superando os tempos de exceção do Estado Novo. Devido ao cancelamento do registro do Partido Comunista do Brasil, os comunistas se organizaram e disputaram pela legenda do PST elegendo uma bancada de quinze parlamentares.
Pedro Pomar
Em 2 de janeiro de 1948, o deputado Pedro Pomar (PSP) denunciou o fato ocorrido em São Paulo, na Câmara dos Deputados, no Rio de Janeiro. Segundo a biografia de Pomar (no prelo), em trecho oferecido com exclusividade ao Portal Grabois pelo autor Osvaldo Bertolino, ele relatou que o Tribunal Superior Eleitoral havia anulado os votos de mais de 150 mil eleitores ao cassar vereadores e o prefeito de Santo André, Armando Mazzo, eleitos pelo PST no estado de São Paulo.
“Trata-se de um desses atos monstruosos que revelam o caráter de classe, o caráter profundamente reacionário desta Justiça Eleitoral, que constituiu-se em um tribunal da ditadura, tornando-se o maior eleitor do grupo fascista no poder”,discursou Pomar.
Segundo Pedro Pomar, em 31 de dezembro de 1947 o TSE praticou medida atentatória ao povo que na eleição escolheu vereadores e o prefeito do segundo município industrial do estado de São Paulo, “um prefeito democrático, popular, saído da classe operária”.
Para Pomar, os grupos que governavam o país tendiam à anulação das conquistas democráticas, das esperanças na representação popular, de ver instaurado um clima de tranquilidade e de união nacional. “Há um grupo, porém, obstinado, com propósitos firmes, com a obsessão de fazer desaparecerem todas essas conquistas, intimidando o povo e oprimindo-o. Vão além: desejam arrancar os representantes comunistas desta Casa”, denunciou.
A fundamentação dos votos de alguns juízes, de acordo com Pedro Pomar, revelava o caráter da decisão “reacionária, fascista, profundamente atentatória à democracia no Brasil”. A decisão feria a democracia e fazia com que o povo descresse na Justiça.
É o mesmo Pedro Pomar quem explica a armadilha criada para derrubar os mandatos comunistas, a partir da direção nacional do próprio partido que os elegeu. O Diretório Central do Partido Social Trabalhista havia comunicado que o seu Diretório Estadual em São Paulo era irregular, pedindo a anulação de registro dos seus candidatos, ainda no princípio de novembro de 1947. O TSE concluiu pela inexistência da direção do partido no estado. O Tribunal Regional Eleitoral (TRE) interpretou essa decisão no sentido de que o Diretório Estadual estava nulo a partir da data da decisão do TSE, em 6 de novembro de 1947. As eleições aconteceram em 9 de novembro e o Diretório Estadual do PST tinha, portanto, todos os seus atos reconhecidos como legais. Apesar disso, o TSE resolveu praticar o esbulho no dia 31 de dezembro de 1947.
Por Cezar Xavier, para a Fundação Maurício Grabois.