Ação de Cabo Anselmo é relatada por ex-presos
Em depoimento à Comissão da Verdade de Pernambuco, dois ex-presos acusam Cabo Anselmo de ter atuado em interrogatórios e de ter torturado durante a ditadura
Publicado 16/03/2013 20:19
José Anselmo dos Santos, Cabo Anselmo, ficou conhecido na memória política da ditadura como o agente duplo que delatou os militantes da Vanguarda Popular Revolucionária (VPR) encontrados mortos na Granja São Bento, em Abreu e Lima, incluindo sua própria companheira, a paraguaia Soledad Barret.
Na audiência pública realizada na última quinta-feira (14) pela Comissão Estadual da Verdade com ex-presos políticos e parentes de mortos e desaparecidos vinculados ao Partido Comunista Brasileiro Revolucionário (PCBR), entretanto, outra faceta do Cabo Anselmo foi levantada: a de interrogador e torturador.
Presos em março de 1972, após o suposto acidente de carro que vitimou o casal Miriam e Luís Alberto Benevides e que acabou desencadeando o desmanche do PCBR em Pernambuco e a consequente prisão de 18 pessoas, os também ex-militantes do partido Sônia Beltrão e Romildo Maranhão confirmaram terem sido torturados pelo Cabo Anselmo. Também dizem ter testemunhado ele torturar outras pessoas enquanto estiveram sob custódia do Estado, nas dependências do Destacamento de Operações de Informações – Centro de Operações de Defesa Interna (DOI-Codi) e do Departamento de Ordem Política e Social (Dops) no centro do Recife.
Na época, eles ainda não sabiam que estavam na presença do agente duplo. Cabo Anselmo era identificado entre os cativos como “Paulista”, pelo seu sotaque. Começou a chamar a atenção dos presos políticos pela agressividade e também pelos cabelos longos
e roupas de civil que usava durante os interrogatórios, além de algumas gírias utilizadas pelos grupos de esquerda. “Certa vez ouvi ele dizendo que ia abandonar um interrogatório porque tinha ‘ponto’ importante. Então nós começamos a desconfiar que ele era um infiltrado”, revelou Sônia Beltrão. O termo era utilizado para locais e horários de encontro entre militantes clandestinos para troca de informações.
Apenas após serem liberados foi que identificaram o torturador como sendo o Cabo Anselmo.
“Paulista pessoalmente colocou os cabos em mim para eu entrar no eletrochoque”, contou
Sônia. “Certa vez, eu fui levado para uma sala e presenciei o Cabo Anselmo espancar o (deputado federal) Pedro (Eugênio) com um pedaço de pau”, testemunhou Romildo Maranhão. “Ele é reconhecível com ou sem a suposta cirurgia plástica até hoje”, garantiu. O ex-preso político disse, ainda, que presenciou o Cabo Anselmo caminhando na companhia do delegado Sérgio Fleury, do Dops/SP comandante da operação na granja São Bento, meses antes do massacre.
De acordo com Nadja Brayner, relatora dos processos envolvendo o PCBR na Comissão, os novos fatos abrem uma nova linha de investigação envolvendo as ações do Cabo Anselmo no Estado. Como próximo passo, foi tido como fundamental um depoimento do deputado Pedro Eugênio (PT), também preso político na época e citado como vítima das
torturas, prevista para as próximas semanas.
Jornal do Commercio