Estados Unidos apostam pela violência na Síria
Os Estados Unidos apostam pela violência para solucionar a crise na Síria e afastam-se das propostas de diálogo realizadas por outros atores, segundo evidenciam declarações de John Kerry em sua primeira viagem por nove nações como chefe da diplomacia da Casa Branca.
Por Luiz Beatón, na Agência Prensa Latina
Publicado 09/03/2013 12:54
O novo secretário de Estado anunciou que seu país enviará alimentos e suprimentos médicos para o braço armado da oposição, o denominado Exército Livre Sírio (ELS), algo que ainda se nega é o abastecimento logístico e confirma a aposta pelo confronto contra o diálogo proposto pela nação árabe, apoiada por Rússia e Irã.
Os Estados Unidos também treinam um grupo de rebeldes sírios na Jordânia, patrocinado por um programa secreto da Agência Central de Inteligência (CIA), disseram funcionários citados pelo Times.
Muitos se perguntam se eles serão os participantes do plano para assassinar o presidente Bashar Al-Assad e o chanceler Walid Al-Moallen, denunciado recentemente pelas autoridades de Damasco.
Tudo parece indicar que em sua passagem pela Europa, o chanceler estadunidense delimitou com seus colegas na França, Reino Unido e Alemanha a participação de cada um nos planos para derrubar as atuais autoridades sírias e estabelecer em Damasco um governo que responda a seus interesses.
Se no início falou-se de uma política "sutil" para a região, onde Síria, Irã e o problema palestino estariam no centro, Kerry deixou claro que não há nenhum afastamento das posições de força que sua antecessora, Hillary Clinton, e os chamados falcões certificaram como via para mudar a ordem no país árabe.
Há meses, aliados incondicionais facilitam armas de todo tipo aos bandos armados sírios, a maioria integradas por terroristas vinculados à Al-Qaida.
Ainda que exista preocupação em círculos ocidentais e em Washington de que a ajuda, que muitos qualificam eufemisticamente de não letal, possa ser desviada a grupos de extremistas islâmicos, essa é a opção confirmada.
Há meses outras nações enviam ajuda aos rebeldes. Reino Unido previu anunciar um pacote de assistência militar "não letal", que poderia incluir elementos como jalecos antibalas, veículos e equipes de visão noturna, segundo relatórios dos próprios meios de imprensa ocidentais.
A Arábia Saudita financia uma grande compra de armas de infantaria da Croácia e a repassa aos grupos irregulares, assegurou The New York Times, o que se une aos grandes arsenais provenientes da incursão ocidental na Líbia, entre outras.
A oposição síria é capaz de manejar adequadamente a ajuda militar que recebe, disse Kerry em declarações citadas pelo jornal nova-iorquino.
O ex-senador falou em Riad, Arábia Saudita, de uma "oposição moderada e legítima" à que chegariam os suprimentos bélicos, algo visto como uma reiteração do jogo duplo da política exterior da Casa Branca.
Pode ser interpretada como outra "sutileza" a negação do presidente Barack Obama de envia armas aos rebeldes. Não faz falta, já que o ministro de Exteriores saudita ratificou em Riad que seu país continuará prestando esse apoio.
Segundo alguns especialistas, num momento em que a Casa Branca centra sua atenção em uma ambiciosa agenda doméstica, é de se esperar uma política externa sem grandes iniciativas diplomáticas, mas Kerry parece disposto a pressionar a deixar algum legado antes de abandonar a política em 2016.
No próprio discurso de investidura de Obama, o tema esteve relegado a um segundo plano para dar relevância a assuntos como a crise fiscal, a mudança climática, a imigração ou os direitos dos homossexuais.
Não obstante esse segundo plano e depois de sua viagem, Kerry esclareceu que fortalecer os vínculos com a Europa e tratar assuntos controversos como a crise nas relações com Israel e o problema palestino, a diferença nuclear com o Irã e a crise na Síria, terão um destacado lugar em sua agenda nos próximos meses.
Depois de um primeiro mandato no qual a ex-secretária de Estado Hillary Clinton tratou de "corrigir" os erros cometidos pela anterior administração republicana de George W. Bush, em especial a retirada das guerras do Iraque e do Afeganistão, agora o desafio parece diferente.
Tudo indica, e segundo a interpretação de Aaron David Miller, analista do Wilson Center, em um artigo na revista Foreign Policy, que Obama fará questão de sair das guerras e se assegurar de não se envolver em nenhuma nova beligerância, mas daí a abandonar os planos do Grande Oriente Médio há uma longa jornada.
Ainda que se fale de mais sutileza na política exterior, é difícil, no entanto que a Casa Branca se afaste dos problemas do Oriente Médio, a crise nos países islâmicos da África e é pouco provável que Obama pressione a busca de um acordo de paz entre israelenses e palestinos.
Está por se ver se depois de sua viagem de estreia, Kerry abre caminhos para estabilizar as relações com a região e assegurar um melhor diálogo a fim de solucionar a suposta ameaça nuclear que Washington e Israel veem em Teerã, assinalam meios de imprensa, já que até agora tudo aponta ao confronto.
Obama e Kerry planejam viajar a Israel, os territórios palestinos e Jordânia para ouvir, algo que não é de costume em Washington. Quanto ao Irã, cujo programa nuclear é uma preocupação importante para a Arábia Saudita e outros países do golfo Pérsico, o chefe dos diplomatas estadunidenses repetiu o estribilho da Casa Branca, de que o tempo se acaba para uma solução diplomática.
Agora está claro que depois de sua visita a Londres, com paradas em Alemanha, França, Itália, Turquia, Egito, Arábia Saudita, Emirados Árabes Unidos e Catar, Kerry tratará de impor a força para procurar um legado de Obama neste campo.
As crises na Síria e no Irã e ajudar a negociar um novo pacto comercial com a Europa serão as matérias que ocuparão sua atenção, e segundo opinam comentaristas políticos, os interlocutores devem se esquecer das sutilezas, a não ser que essa definição sirva como cortina de fumaça para ocultar a guerra encoberta.
*Luiz Beatón é jornalista da redação América do Norte da Prensa Latina.