Congresso da Contag debate desenvolvimento rural alternativo
Começa nesta segunda-feira (4), e vai até a sexta-feira (8), em Brasília, o 11º Congresso Nacional dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais (CNTTR). O evento reunirá dirigentes sindicais de todo o país para discutir o avanço do capitalismo no campo e seus impactos, o Projeto Alternativo de Desenvolvimento Rural Sustentável e Solidário (PADRSS) e o papel do movimento sindical na luta política brasileira.
Joanne Mota, do Portal Vermelho em São Paulo
Publicado 01/03/2013 11:47
Em entrevista ao Vermelho, Alberto Broch, presidente da Confederação dos Trabalhadores na Agricultura (Contag), explicou que o Congresso tem o papel político de debater e deliberar sobre os grandes temas desafiadores para o Movimento Sindical de Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais (MSTTR), avaliar as contribuições dos governos Lula e Dilma e definir os rumos da ação política do movimento.
Segundo ele, o movimento sindical no campo busca construir um projeto de desenvolvimento que beneficie todos os brasileiros e brasileiras. Para tanto, o dirigente pontua ser “fundamental criar políticas públicas e programas voltados para a distribuição de renda no campo. Não há desenvolvimento no meio rural sem educação, saúde, garantias previdenciárias, salários dignos, erradicação do trabalho infantil e escravo, respeito à autodeterminação dos povos indígenas e preservação do meio ambiente”.
Broch também fez uma breve avaliação dos 10 anos de governos populares e progressistas e destacou os avanços conquistados. "O governo Lula e o governo Dilma implementaram políticas importantes para o setor, que garantiram conquistas antes não alcançadas, mas entendemos que para uma efetiva política de democratização da terra há ainda um longo caminho. O Congresso caminhará também nesse sentido, fará um balanço destes governos e construirá propostas que revertam as desigualdades no campo", ponderou.
Outra questão avaliada pelo dirigente diz respeito à política de assentamentos. Para Broch é necessária uma política de desenvolvimento para estes espaços, que iniba os espaços de concentração de pobreza e fomente as infraestruturas necessárias para manter as famílias na terra, com sustentabilidade e qualidade de vida.
“É fundamental que o governo altere a lógica das políticas públicas até então praticadas em nosso país. De forma a atingir o cerne das questões estruturantes que produzem a exclusão, a degradação ambiental, a exploração do trabalho e as desigualdades. O Estado deve perceber que para construir um país soberano, é preciso pensar em uma estratégia de desenvolvimento sustentável, inclusivo e democrático”, reafirmou o presidente da Contag.
Modelo explorador
Alberto Broch avalia que o atual modelo empregado no Brasil está baseado no agronegócio, e se converte em um caminho excludente e ambientalmente insustentável para o setor. “O Movimento Sindical dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais (MSTTR) entende que é preciso enfrentar este cenário e cobrar do Estado os compromissos assumidos com a categoria. É preciso enfrentar o agronegócio e pôr fim ao pacto político que prima pelo fortalecimento do modelo agroexportador, que gera violência e violação de direitos”.
O dirigente acrescenta que é chegada a hora de barrar essa prática da concepção ideológica, que é controlada pelos grandes grupos econômicos e transnacionais. Como exemplo, ele explica que “o agronegócio investe na mercantilização das matérias-primas, tornando-as mercadorias que entram na disputa de mercado como bens comercializáveis com valor vinculado à competitividade. Nesse processo, o trabalhador é visto não como vetor principal, mas sim, como mais uma engrenagem para atingir os objetivos do capital agroexportador”.
Congresso defenderá o PADRSS
David Wylkerson, vice-presidente da Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB), informou que uma das bandeiras que serão defendidas no Congresso pela Contag é a implementação de um Projeto Alternativo de Desenvolvimento Rural Sustentável e Solidário (PADRSS). Segundo ele, o projeto tem como objetivo se contrapor ao atual modelo de desenvolvimento agrícola praticado no país.
“O MSTTR entende que o desenvolvimento brasileiro deve incluir crescimento econômico, justiça, participação social e preservação ambiental. Este desenvolvimento deve privilegiar o ser humano na sua integralidade, possibilitando a construção da cidadania. Essa é a proposta do PADRRSS. Além disso, entendemos que o desenvolvimento deve está atrelado às questões sociais, culturais, políticas, ambientais e às relações sociais de gênero, geração, raça e etnia”, enumera Wylkerson, que também é secretário-geral da Contag.
Desafios do movimento
Para a Contag um dos elementos fundamentais para atacar as causas dos problemas estruturais, como a pobreza e desigualdade social, é o Estado exigir o cumprimento da função socioambiental da terra, regulando as relações trabalhistas, ambientais, fiscais, previdenciárias e a produtividade. Além disso, a Confederação defende que se torne central o processo de democratização da terra e do território.
David Wylkerson acrescenta que “um dos principais desafios na disputa pela consolidação do PADRSS é o fortalecimento e a ampliação de articulações, alianças e parcerias estratégicas com movimentos sociais do campo e da cidade, ação que ganha o apoio estratégico da Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB) e das outras centrais. Esse movimento visa somar forças na contraposição ao modelo do agronegócio”.
Assim, “a consolidação do PADRSS passa pela implantação de um modelo de produção e de organização dos trabalhadores e trabalhadoras, que responda aos desafios do desenvolvimento rural sustentável e solidário. De forma a garantir soberania alimentar e territorial, renda, qualidade de vida e emancipação dos sujeitos políticos. Com essa concepção o PADRSS se articula a um projeto de desenvolvimento de sociedade que busque assegurar os direitos e o pleno exercício da cidadania”, finaliza Broch.
Realidade no campo
De acordo com a última pesquisa do Censo Agropecuário, realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em 2006, cerca de 1% das propriedades existentes no país representa 46% das terras, algo em torno de 147 milhões de hectares.
Por outro lado, o IBGE apurou que as pequenas propriedades, com área de até 10 hectares, que são 48% das propriedades existentes no país, representam apenas 2,4% das terras. Tal cenário indica o avanço do capitalismo no campo e remete a um pensamento antigo que ainda está presente: “terra continua sendo sinônimo de poder no Brasil”.
O Instituto também aponta que, atualmente, são os pequenos agricultores os responsáveis pela grande maioria da produção de alimentos e pela geração de empregos no campo. Ou seja, dos cerca de 400 milhões de hectares titulados como propriedade privada, a pesquisa mostra que apenas 60 milhões de hectares são utilizados como lavoura. O restante das terras estão ociosas ou subutilizadas.
De acordo com pesquisa realizada pelo Instituto de Colonização e Reforma Agrária (Incra), atualmente existem 100 milhões de hectares de terras ociosas. Na contramão, o Incra verificou que há no país cerca de 4,8 milhões de famílias sem-terra. Ainda conforme o Incra, entre 1992 e 1998, a área ocupada pelos imóveis maiores de dois mil hectares foi ampliada em 56 milhões de hectares, quase quatro vezes mais do que os 14,3 milhões de hectares desapropriados em sete anos de governo Fernando Henrique Cardoso.
Sauer acrescenta que o atual governo precisa redesenhar a atual conjuntura, de forma a iniciar uma radical mudança no modelo agrário e agropecuário. “Do ponto de vista estritamente econômico, em longo prazo, o custo será elevado para o conjunto da sociedade brasileira, pois não é possível imaginar um crescimento sustentado baseado apenas na exportação de matérias primas, ou seja, basear a economia na exportação de recursos naturais, sem agregação de valor, sem processos consistentes de industrialização.”
Violência contra trabalhadores rurais
A Contag também informou que começa nesta segunda-feira (4), em Brasília, no Centro de Convenção Ulysses Guimarães, o Seminário Internacional sobre a Violência no Campo – Cenários Vítimas e Agressores. A entidade explica que o evento terá como objetivo debater os altos índices de violência no campo.
O seminário marca a retomada da Campanha Mundial contra a Violência no Campo e a construção de uma agenda conjunta entre os países e organizações sociais. Neste seminário estarão em pauta as diversas formas de violência contra os assalariados e assalariadas rurais e seus direitos; trabalho escravo e precarização das relações de trabalho; e a violência no campo relacionada à disputa pela terra e o território.
Direito à Verdade e à Memória Camponesa
Em entrevista, Alessandra Lunas, vice-presidente e secretária de Relações Internacionais da Contag, informou que entre os objetivos do seminário está a criação de uma Comissão do Direito à Verdade e à Memória Camponesa. Segundo ela, o Brasil chama atenção nesse momento para estas questões apresentadas.
“Estamos instalando a Comissão do Direito à Verdade e à Memória Camponesa, pois ainda lutamos por crimes do tempo da ditadura. Hoje, o cenário não é diferente, estamos vivendo momentos tão violentos quanto os que nós vivemos no tempo da ditadura, com expulsões de famílias no campo e assassinatos de lideranças. Isso é muito forte em nossos estados e é por isso que precisamos chamar a atenção para este debate e discutir estratégias conjuntas sobre o tema,” pontua.