Ativistas em Israel denunciam violência da ocupação à Palestina 

Crescem as organizações israelenses dedicadas à causa palestina. Em 2008, a jovem Omer Goldman tornou-se notícia em alguns meios de comunicação mais humanos por recusar a se alistar no exército israelense, e associações como Quebrando o Silêncio publicam relatos de ex-soldados sobre as práticas das Forças Armadas de Israel.

Por Moara Crivelente, da Redação do Vermelho 

Quebrando o Silêncio - Breaking the Silence

Omer tornou-se o rosto de um grupo que cresce rapidamente, formado por jovens israelenses que se recusam a alistar-se no Exército israelense. Ela e muitos outros, como mostrado em vários vídeos na internet, declaram que o que viram as Forças Armadas de Israel (FDI) fazerem ao povo palestino é imoral, contra a ética, ilegal e simplesmente contra os seus valores.

O caso de Omer é muito interessante. Ela diz: “eu cresci com o exército. Meu pai era um chefe da Mossad [Centro de Inteligência e Operações Especiais] e eu vi minha irmã, que é oito anos mais velha que eu, prestar seu serviço militar. Enquanto garota, eu queria ser soldado. O exército era parte tão importante da minha vida que eu nunca o questionei.”

Foi uma viagem a uma vila chamada Shufa, na Cisjordânia, que chocou completamente a Omer. A visita foi organizada por um grupo chamado Combatentes pela Paz (Combatants for Peace), formado por antigos soldados israelenses e palestinos, que se juntaram para manifestar-se contra a injustiça do conflito que ainda persiste.

Durante a viagem, o grupo chegou a um posto de controle em que crianças palestinas eram impedidas de chegar à escola. Enquanto o grupo se manifestava, os israelenses que vigiavam o posto abriram fogo. A percepção de Omer sobre a vida militar que a esperava e que esperava todos os que se formavam no ensino médio mudou.

Omer recusou o alistamento continuamente, e serviu várias sentenças na prisão como consequência. Mesmo assim, sobre os amigos, disse ter sido atacada até pessoalmente, enquanto o que fazia era opor-se ao uso da violência contra os palestinos, pois “estamos ocupando um povo inteiro”, afirmou Omer. Quanto ao pai, disse: “se eu pude superar o fato de que ele é um militar, ele pode superar o fato de que sou [objetora de consciência].”

Em 2012, a Palestina recebeu, pela primeira vez, por parte da ONU, o reconhecimento como Estado observador não-membro. Tanto o Hamas quanto os israelenses comprometeram-se recentemente com um cessar-fogo em Gaza, ainda que os compromissos israelenses tenham pouca credibilidade, e o Hamas e o Fatah, partido que governa a Autoridade Palestina, deram passos importantes para a melhoria da sua relação, o que dá alguma esperança aos ativistas dedicados à questão.

Nas palavras de Omer: "Eu recuso o alistamento nas FDI. Eu não serei parte de um exército que implementa, desnecessariamente, uma política violenta e viola os direitos humanos mais básicos diariamente. Como muitos de meus semelhantes, nunca ousei questionar a ética do exército israelense. Mas quando visitei os Territórios Ocupados, me dei conta de que via uma realidade completamente diferente, violenta, opressiva, uma realidade extrema que precisa ser finalizada.”

Omer afirma que é precisamente por acreditar no serviço à comunidade de que faz parte que se recusa a “tomar parte nos crimes de guerra cometidos pelo meu país.” A jovem completa: “não cometerei violência, seja qual for a consequência disso.”

Quebrando o Silêncio

A associação Quebrando o Silêncio (Breaking the Silence) tornou-se conhecida pelas informações detalhadas, imagens e relatos pessoais de ex-soldados israelenses, alguns dos quais jovens que nunca tinham questionado o exército, como Omer.

Foi formada em 2004, por ex-soldados que serviram em Hebron, na Cisjordânia (onde há vários assentamentos israelenses guardados por postos de controle). Depois também foi integrada, por exemplo, por soldados que serviram nas FDI, durante a operação militar Chumbo Derretido (entre dezembro de 2008 e janeiro de 2009, contra a Faixa de Gaza), em que crimes de guerra foram cometidos, segundo relatório da Comissão de Direitos Humanos da ONU.

Quebrando o Silêncio publica relatórios sobre a conduta instruída aos soldados e a que observaram de seus superiores, denunciando graves e diárias violações de direitos humanos e a falta de preocupação deliberada com o bem-estar dos palestinos afetados diariamente pelas incursões militares, postos de controle, prisões arbitrárias, entre outras funções desempenhadas por eles a mando das FDI.

Os testemunhos dos soldados são catalogados, e a organização preocupa-se rigorosamente com a transparência, a verificação das suas informações e a checagem de dados, para que não seja deslegitimada pelo governo israelense.

O livro Nossa dura lógica: Testemunhos de soldados israelenses nos Territórios Ocupados, 2008-2010 (Our Harsh Logic: Irsaeli Soldiers’ Testimonies from the Occupied Territories, 2008-2010), publicado em 2010, faz uma compilação ampla de declarações detalhadas, mas a página da organização também é alimentada diariamente com outros testemunhos e notícias.

Conhecendo a ocupação

Outra organização israelense, Ir-Amin, faz visitas guiadas frequentes aos territórios palestinos ocupados, e dá especial atenção a Jerusalém. Segundo a ONG, a cidade é um ponto crucial em todo o conflito, dada a sua importância religiosa para as maiores confissões do mundo.

Os guias fazem visitas a ocupações na Cisjordânia e na parte oriental de Jerusalém, parte dos territórios palestinos já reconhecida através de várias resoluções da ONU, embora sejam verificáveis as condições extremas de opressão, por parte das FDI, em que os palestinos vivem.

Em um tour especial para turistas e judeus recém-chegados a Israel, a ONG mostra Jerusalém Oriental em seus mínimos detalhes, fornecendo contexto histórico, dados estatísticos, perspectivas socioeconômicas e informações sobre os impactos gerais da ocupação israelense, para além das óbvias violações de direitos humanos e do direito internacional humanitário.

Ainda, em sua página de internet, Ir-Amin publica mapas estratégicos para a compreensão da evolução do conflito israelense-palestino, demonstrando os efeitos das políticas opressivas de Israel no Estado Palestino, nas vidas dos ocupados e também na dos ocupantes.

Perspectiva palestina

Há também várias organizações palestinas locais que trabalham com as israelenses para a troca de informações e perspectivas, para não falar da vasta rede internacional também dedicada à tarefa.

O objetivo de muitos israelenses é usar sua representatividade e o simbolismo da sua cidadania para projetar as reivindicações palestinas, a opressão que seu governo sionista exerce sobre a população, a desinformação com que os israelenses atuam (ou alienam-se) com relação ao conflito e a forte propaganda militarista e nacionalista com que essa política consegue se estabelecer.

Ainda assim, movimentos internacionais como o Boicote, Sanções e Desinvestimento (BDS) ganham cada vez mais espaço ao proporem que todas as instituições, produtos e negócios israelenses sofram as consequências pelas políticas do governo sionista enquanto ele ocupar e impedir a Palestina de estabelecer-se como um Estado soberano e independente.

Importante agora é que a sociedade internacional, já suficientemente ciente sobre o conflito, tome ações mais concretas. Enquanto isso, a sociedade israelense precisa acordar; um antigo oficial, no documentário também intitulado Quebrando o Silêncio, sobre a associação homônima, de 2009, diz: “você não pode pensar muito sobre o que está acontecendo à sua volta quando é um soldado, porque essa é a única forma de sobreviver. Não pode pensar nos palestinos como seres-humanos iguais a você.” E outro completa: “a apatia escala, a brutalidade escala, a violência escala, escalam o tempo todo.”

Interessa notar, por exemplo, que organizações como essa recebem financiamento de muitos membros da União Europeia e de organizações sediadas nos EUA, dois atores fundamentais para a pressão contra Israel pelo fim da ocupação, assim como pelo abastecimento de armas às FDI e pelo financiamento do governo sionista. Contradições à parte, ainda é possível chegar a uma determinação coerente no seio da ONU, criada justamente para evitar esse tipo de violência, para proteger a dignidade humana.

Com informações de Your Middle East e Breaking the Silence