Salim Lamrani: A turnê mundial de Yoani Sánchez

Depois de cinco anos de espera, Yoani Sánchez conseguiu, por fim, a autorização para viajar ao exterior. Depois da reforma migratória vigente desde 14 de janeiro de 2013, que permite a todos os cubanos deixar o país sem outra formalidade além da obtenção de um passaporte e um visto, a mais famosa opositora do governo de Havana inicia no Brasil uma turnê mundial que a levará a vários continentes.

Por Salim Lamrani, no Opera Mundi

O cineasta Dado Galvão a receberá em Recife, onde participará da apresentação do documentário Conexão Cuba Honduras (1).

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Sua turnê se parece com a de um chefe de Estado ou a de uma estrela da música, e os recursos dedicados a ela são impressionantes. De fato, "uma programação muito intensa” espera a jovem opositora de 37 anos (2). Tem conferências previstas no México, onde será a convidada de honra da SIP (Sociedade Interamericana de Imprensa), que terá sua reunião semestral em Puebla; nos Estados Unidos, com encontros em Nova York, onde será recebida na redação do New York Times; Washington e Miami, Argentina, Canadá, Peru, Espanha, Itália, Alemanha, República Checa, Países Baixos e Suíça (3).

Como viajar é um direito universal reconhecido pela Declaração das Nações Unidas de 1948, só podemos nos alegrar pelo fato de a principal figura da oposição cubana poder expressar suas convicções pelo mundo. No entanto, é inevitável destacar certos aspectos obscuros da personalidade e da vida de Yoani Sánchez, que são objeto de controvérsia e que esta monumental turnê parece confirmar.

Yoani Sánchez não é uma opositora comum. Após viver dois anos na Suíça, decidiu voltar a Cuba e integrar o universo da dissidência. Em 1997, criou o blog Generación Y – traduzido para, pelo menos, 18 idiomas! –, no qual fustiga de modo virulento o sistema e o governo cubanos. Sua nova atividade tem sido coroada com êxito. No período de alguns anos, Sánchez recebeu diversas distinções, todas financeiramente remuneradas. No total, a blogueira recebeu uma remuneração de 250 mil euros, isto é, um montante equivalente a mais de 20 anos de salário mínimo em um país como a França, quinta potência mundial, e a 1.488 anos de salário mínimo em Cuba (4).

A isso se soma o salário mensal de US$ 6 mil concedido pela Sociedade Interamericana de Imprensa, que agrupa os grandes conglomerados midiáticos privados do continente, e que decidiu nomeá-la vice-presidente regional por Cuba de sua Comissão de Liberdade de Imprensa e Informação (5). O jornal espanhol El País também decidiu nomeá-la correspondente em Havana, e lhe paga um bom salário (6).

O governo dos EUA, cujo objetivo abertamente expresso é uma mudança do regime em Cuba por meio do financiamento de uma oposição interna, fez de Yoani Sánchez sua prioridade. Considera, em documentos confidenciais publicados pelo Wikileaks, que "Yoani Sánchez pode desempenhar um papel a longo prazo em uma Cuba pós-Castro” (7). De fato, a opositora cubana está em estreita relação com a diplomacia norte-americana em Cuba, como é assinalado em um telegrama classificado como "secreto” por seu conteúdo sensível. A administração Obama valoriza muito a blogueira cubana, como demonstra a reunião secreta ocorrida no apartamento da opositora com a subsecretária de Estado norte-americana Bisa Williams durante sua visita a Cuba, entre 16 e 22 de setembro de 2010 (8).

Michael Parmly, antigo chefe da diplomacia norte-americana em Havana, que se reunia regularmente com Yoani Sánchez em sua residência pessoal, como indicam documentos confidenciais da Sina, manifestou sua preocupação a respeito da publicação dos telegramas diplomáticos dos EUA pelo Wikileaks: "Me incomodaria muito se as inúmeras conversas que tive com Yoani Sánchez fossem publicadas. Ela poderia pagar pelas consequências por toda a vida” (9). A pergunta que imediatamente vem à mente é a seguinte: "Quais são as razões pelas quais Yoani Sánchez estaria em perigo se sua atuação, como ela afirma, respeita o marco da legalidade?”

Desde então, Yoani Sánchez não é uma simples dissidente. Seria interessante que a principal figura da oposição cubana aproveitasse sua turnê mundial para esclarecer algumas zonas obscuras de sua trajetória pessoal e revelasse quais são os poderosos interesses que se escondem por trás de sua pessoa.

Notas:

1. Voz de América, "Yoani Sánchez viaja ao Brasil em 17 de fevereiro", 6 de fevereiro de 2013.
2. Yoani Sánchez, 17 de fevereiro, https://twitter.com/yoanisanchez
3. EFE, "A blogueira cubana falará no Brasil sobre liberdade e direitos", 17 de fevereiro de 2013.
4. Yoani Sánchez, "Prêmios", Generación Y.
5. El Nuevo Herald, "Yoani é nomeada para comissão da SIP", 9 de novembro de 2012.
6. El País, "Artigos escritos por Yoani Sánchez", http://elpais.com/autor/yoani_sanchez/a/ (site acessado em 17 de fevereiro de 2013).
7. Jonathan D. Farrar, "Os Estados Unidos e o papel da oposição em Cuba", United States Interests Section, 9 de abril de 2009, telegrama 09HAVANA221. http://213.251.145.96/cable/2009/04/09HAVANA221.html (site acessado em 18 de dezembro de 2010).
8. Joaquin F. Monserrate, "GOC sinaliza 'prontidão para ir em frente", United States Interests Section, 25 de setembro de 2009, telegrama 09HAVANA592, http://213.251.145.96/cable/2009/09/09HAVANA592.html (site acessado em 18 de dezembro de 2010)
9. Michael Parmly, "Consenso On Line: Um fórum imparcial em Cuba", United States Interests Section, 28 de junho de 2007, telegrama 07HAVANA622, http://wikileaks.org/cable/2007/06/07HAVANA622.html (site acessado em 15 de setembro de 2011); Stéphane Bussard, "Meu reencontro com o autor dos telegramas sobre Cuba", Le Temps, 30 de dezembro de 2010.

*Salim Lamrani é doutor em Estudos Ibéricos e Latino-americanos da Universidad Paris Sorbonne-Paris IV. Professor nas Universidades Paris-Sorbonne-Paris IV e Paris-Est Marne-la-Vallée. Jornalista, especialista sobre relações entre Cuba e Estados Unidos.

Fonte: Opera Mundi