Obama viajará a Israel: uma mera visita não é o suficiente
A confirmação da Casa Branca sobre a visita que o presidente Barack Obama planeja fazer a Israel e à Autoridade Palestina (AP) veio no momento certo para o primeiro ministro israelense Benjamin Netanyahu, que tem enfrentado algumas dificuldades para construir sua nova coalizão.
Por Noam Sheizaf*
Publicado 07/02/2013 09:56
Assim como há quatro anos, Netanyahu quer o governo mais amplo possível, mas os partidos do centro estão exigindo uma renovação de “negociações significativas” com a AP e uma reforma do serviço militar. As coisas serão facilitadas agora que só a visita do presidente Obama vai gerar a sensação de que as conversações de paz estão realmente a caminho. Assim, a entrada de Tzipi Livni e Yair Lapid’s [representantes de partidos de centro] na coalizão será muito mais fácil.
Naturalmente, a mera presença de Lapid e/ou Livni no governo não garante qualquer coisa em relação ao processo diplomático propriamente dito, e ainda acho que mesmo que haja um desejo real de acabar com a ocupação por parte de Israel, o atual Knesset [parlamento israelense] não apresenta uma base política trabalhável para isso, especialmente devido às mudanças dentro do partido Likud, de Netanyahu. Vale lembrar que Naftali Bennett e os assentados não têm problemas em juntar-se ao governo que renovaria negociações com os palestinos. Eles acreditam que nada concreto sairá das conversações, certamente não a evacuação dos assentamentos, dadas as circunstâncias políticas atuais. Como já escrevi no passado, o comportamento político dos colonos é teste crucial para medir a seriedade do lado israelense.
A visita planejada também confirma, ao menos na imagem pública de Israel, a afirmação da direita de que a abordagem confrontadora de Netanyahu não afetou os interesses israelenses, e que talvez tenha até ajudado. Por outro lado, é claro que o presidente Obama esperou pelo momento certo, quando está forte e Netanyahu está mais fraco, antes de fazer a visita. A mídia israelense estimou, na terça-feira (05), que além do desejo de preservar os interesses norte-americanos na região e de renovar o processo de paz, a visita também tem a ver com a dívida política com os membros da elite judia, que apoiou o presidente nas eleições.
Netanyahu e o processo diplomático
Ainda, as circunstâncias políticas em Israel são menos importantes que os objetivos da visita em relação à questão palestina, supondo que existam tais objetivos, e que o propósito da visita não seja somente a coordenação das posições sobre a Síria e o Irã.
Fazer os palestinos e os israelenses conversarem é a parte mais fácil, Obama já conseguiu fazer com que Netanyahu e o presidente palestino Mahmoud Abbas se encontrassem antes; mas a questão real tem a ver com a natureza do processo. As negociações poderiam ser significativas se fossem preparadas corretamente. Apenas forçar as duas partes a encontrarem-se pode acabar produzindo nada (como foi o caso, há três anos), ou pior, pode acabar num rápido colapso no terreno, como o que aconteceu logo após a cimeira fracassada de Camp David em 2000.
Aqui estão alguns dos temas importantes a serem considerados:
1. O primeiro ministro Netanyahu se afastou das posições tomadas pelos negociadores israelenses desde o começo da déada passada. Ele a) se recusa a reconhecer as fronteiras de 1967 como objetivos do processo, com as trocas de territórios acordadas e algumas modificações nas fronteiras; e b) se reusa a comprometer-se no caso de Jerusalém. Esta é uma questão crucial que não recebeu atenção suficiente no debate público.
2. O governo israelense continua a construir assentamentos na Cisjordânia de forma a criar enorme frustração e ressentimento entre a população palestina; eles tomam terras e recursos necessários para a criação de qualquer possibilidade de estado Palestino e contribui para o problema que o mesmo governo enfrentaria caso estivesse disposto a assinar um acordo. É importante notar as posições contraditórias que o governo israelense vem defendendo nessa questão, insistindo que os assentamentos “não são um problema” e poderiam ser evacuados dentro de um acordo final, e ao mesmo tempo exigindo que qualquer acordo teria que reconhecer as “mudanças no terreno” desde 1967, ou seja, os assentamentos.
3. O primeiro ministro Netanyahu introduziu novas exigências que nunca foram mencionadas pelos negociadores israelenses antes, como o reconhecimento, por parte dos palestinos, de questões culturais e do regime do estado de Israel. Exige da liderança palestina que não só reconheça Israel, algo que não fez antes, mas que o reconheça como um Estado judeu. Esta é, talvez, a ação mais cínica de Netanyahu, porque também serve a um propósito interno, legitimar e isolar os israelenses, os judeus e os árabes que acreditem no modelo de estado democrático “para todos os seus cidadãos.”
4. Finalmente, em seus dois turnos anteriores, Netanyahu se recusou a preparar o público israelense para concessões e, ao contrário, antecipou um fracasso inevitável. Não se pode subestimar o poder de um líder em formatar o cenário cultural e político, e ao contrário do ex-primeiro ministro Yitzak Rabin, de Ehud Barak e de Ehud Olmert, de certa forma, o primeiro ministro Netanyahu não leva transmite qualquer urgência em acabar com a ocupação. Inversamente, ele demoniza os palestinos e joga para o debate público mais e mais termos e questões em que Israel “não pode se comprometer”. Em outras palavras, Netanyahu está impossibilitando a noção completa de um acordo ao falar constantemente dos “custos do lado israelense”. O resultado é uma crescente descrença entre o público israelense na capacidade de acabar-se com a ocupação, o que é refletido em todo o sistema político.
Diferente dos pontos anteriores, esta não é uma questão em que a administração possa influenciar diretamente, é mais uma questão a ser observada enquanto o esforço diplomático é retomado. A menos que estas questões, e especialmente os dois primeiros pontos, sejam abordados, acho que será impossível alcançar qualquer avanço a curto-prazo. Isso requer o investimento de muito capital político por parte dos norte-americanos, algo em que a Casa Branca foi relutante no passado.
Há também problemas em relação à legitimidade da Autoridade Palestina, mas acredito que o desejo palestino de acabar com a ocupação é tão grande que se houvesse mesmo um parceiro israelense que evacuasse os assentamentos e movesse as forças armadas para fora da Cisjordânia, qualquer liderança palestina que lidasse com ele poderia ganhar de volta o apoio nas ruas, mesmo atualmente.
Apesar disso, também se deve dizer: Os EUA e Israel podem até forçar qualquer liderança palestina às conversações, e talvez até a assinar um acordo que não faça mais do que modificar ligeiramente o status quo e apresentá-lo como “paz”. Mas, sem abordar as necessidades reais do povo palestino, tal passo, mais do que nada que aconteça agora, na ausência de um processo diplomático real, seria o melhor jeito de garantir mais derramamento de sangue e sofrimento dos dois lados.
Noam Sheizaf é um jornalista israelense independente e colunista na revista eletrônica +972mag.
Fonte: +972mag
Tradução: Moara Crivelente, da Redação do Vermelho