EUA: memorando secreto explica os "assassinatos seletivos"
A rede Al-Jazeera publicou nesta quarta-feira (6) comentários sobre um memorando secreto do governo dos EUA, divulgado pela rede televisiva estadunidense NBC na terça-feira (5). O documento de 16 páginas dá um raciocínio jurídico para o uso de ataques de aviões não tripulados (drones) pela administração dos EUA contra suspeitos da Al-Qaeda.
Por Moara Crivelente, da Redação do Vermelho
Publicado 06/02/2013 11:50
As diretrizes internas do governo dos EUA para os “assassinatos diretos” ou "seletivos" de suspeitos da Al-Qaeda permitem ataques contra cidadãos estadunidenses no exterior, desde que sejam suspeitos de terem papel de liderança no grupo e de ainda estarem engajados em operações, segundo o memorando do Departamento de Justiça, que vazou para a imprensa.
O memorando alega ser “juridicamente legal” que os EUA tenham como alvo cidadãos estadunidenses ligados a Al-Qaeda, se eles representarem uma “ameaça iminente” de ataques violentos contra outros cidadãos norte-americanos, e que atrasar qualquer atitude contra essas pessoas criaria um “alto risco inaceitável.”
Porém, essas circunstâncias podem precisar que o conceito de “ameaça iminente” seja expandido, segundo o documento. “A ameaça apresentada pela Al-Qaeda e suas forças aliadas requerem um conceito mais amplo de iminência para julgar-se quando uma pessoa que planeje constantemente ataques terroristas apresentam uma ameaça iminente,” diz o memorando. Grupos de direitos humanos e outros atores políticos vêm manifestando a sua preocupação constantemente sobre a expansão gradual das interpretações legais feitas pelos EUA e outras potências, para justificar ou legitimar o uso de métodos controversos e inaceitáveis, como a tortura, as prisões administrativas e o ataque aéreo com drones.
“Ameaça iminente específica”
O memorando afirma que autoridades não terão de possuir informações sobre um ataque iminente específico contra os EUA. Não requer que a captura de suspeitos de terrorismo seja primeiro julgada impraticável, e que uma operação letal dos EUA contra uma pessoa cumpra com princípios fundamentais do direito de guerra. O documento dá uma série de exemplos para o que o governo dos EUA considera que justifica o uso de métodos de combate que, segundo juristas, violam o Direito Internacional Humanitário, que deveria pautar a conduta das partes em guerra para a proteção de civis, prisioneiros e outros envolvidos.
"Um tomador de decisão que determine se um líder operacional da Al-Qaeda apresenta uma ameaça iminente de realizar um ataque violento contra os Estados Unidos precisa levar em consideração que certos membros da Al-Qaeda (…) estão continuamente conspirando para atacar os EUA” e que “a Al-Qaeda se dedicaria a tais ataques tão regularmente quanto pudesse”, diz o memorando.
O documento também afirma que o responsável pela decisão precisa levar em consideração que “o governo dos Estados Unidos pode não estar ciente de planos da Al-Qaeda enquanto eles se desenvolvem e, por isso, não podem estar seguros de que nenhum esteja a ponto de se concretizar”, numa justificativa de que “a nação pode ter uma janela de oportunidade limitada para atacar” de uma forma que tenha altas probabilidades de sucesso e diminuta probabilidade de baixas estadunidenses.
O documento deixa clara, assim, a interpretação dos EUA do que chama de direito da guerra sobre a “defesa da nação”, numa posição permissiva que pretende justificar os assassinatos diretos de indivíduos, mesmo que ainda apenas suspeitos de participação em atos terroristas, sem confirmação.
Direito Internacional
A União Americana pelas Liberdades Civis (ACLU, em inglês) disse que o documento é “profundamente perturbador”, segundo a Al-Jazeera. “De acordo com o documento, o governo tem autoridade para realizar assassinatos diretos contra cidadãos estadunidenses sem apresentar evidências a um juiz, antes ou depois do fato, e realmente sem informar aos tribunais ou ao público que essa autoridade foi exercida”, disse Jameel Jaffer, diretor legal adjunto, na página da ACLU.
Ele disse ainda que os limites colocados pelo memorando são tão vagos e elásticos que serão facilmente manipulados. O documento afirma que o uso de força letal não violaria a Quarta Emenda da Constituição dos EUA, dedicada às liberdades e direitos civis, quando uma pessoa que for alvo é suspeita de ser um líder operacional de uma “força inimiga” e que os tribunais não têm qualquer papel a desempenhar na questão, por serem “intimamente relacionadas à política externa e segurança nacional.”
O documento estabelece em palavras as evidências de que o governo, ou as instituições responsáveis por questões de “segurança” nos EUA têm a sua própria e conveniente interpretação do Direito Internacional Humanitário, como já evidenciado pelas ações unilaterais de agressão em intervenções militares, para justificar suas medidas coercitivas e violadoras dos direitos humanos.
Com Al-Jazeera