Palestina tenta reconhecimento histórico da ONU nesta quinta
O presidente da Autoridade Nacional Palestina (ANP), Mahmoud Abbas, apresentará na noite desta quinta (29) o pedido de reconhecimento da Palestina como Estado observador das Nações Unidas, em sessão da Assembleia Geral da entidade. A data coincide com os 65 anos da primeira resolução da ONU sobre a partilha da região em dois Estados. Uma vitória diplomática das ANP teria um simbolismo importante para a luta dos palestinos.
Publicado 29/11/2012 11:09
A resolução proposta pelas autoridades reafirma o direito de autodeterminação e independência do Estado da Palestina baseada nas fronteiras de 1967 e tem como objetivo elevar o status palestino na ONU para “observador não membro”, classificação na qual também se encontra atualmente o Vaticano. O título daria aos palestinos acesso a outras organizações internacionais, mas não direito a voto na Assembleia ou de propor resoluções nem postular-se a cargos na ONU.
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Apesar disso, o governo palestino não deixou de expressar “a esperança” de que o Conselho de Segurança aprove sua admissão como membro pleno da entidade nacional. O texto, que ainda pode sofrer modificações, reitera também a necessidade de acelerar o processo de paz e defende a solução de dois Estados para o conflito.
De acordo com a BBC, a iniciativa da ANP deve ser aprovada, já que necessita apenas da maioria simples dos votos entre os 193 Estados-membros. Se isso de fato acontecer, as autoridades palestinas terão o direito de pedir ao Tribunal Penal Internacional para investigar acusações de crimes de guerra contra Israel durante as últimas décadas, além de também integrar pactos e organismos internacionais.
Na quarta-feira, Hanan Ashrawi, uma das porta-vozes da Autoridade Palestina, disse que a tentativa de conseguir o reconhecimento da ONU para um Estado palestino é o último esforço para resgatar o problemático processo de paz do Oriente Médio, rejeitando as acusações de Israel de que a medida representa uma forma de passar por cima das negociações.
Ela também pediu que os EUA retirem sua objeção à iniciativa, caracterizando a posição de Washington como "patética" e prejudicial aos interesses norte-americanos na região. Abbas afirmou que o reconhecimento da ONU não tem o objetivo de substituir o diálogo com Israel, mas de aprimorar a posição palestina e assegurar que as fronteiras anteriores ao conflito de 1967 sejam a base para as negociações para a formação de um futuro Estado palestino – ideia que o primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, rejeita.
Abbas disse que não voltará à mesa de negociações enquanto Israel continuar expandindo assentamentos na terra conquistada durante o conflito. Atualmente, 500 mil israelenses vivem na Cisjordânia e Jerusalém Oriental, borrando as divisas de 67. Além de uma suspensão parcial de dez meses que terminou em setembro de 2010 e fracassou em possibilitar negociações de paz sustentáveis, Netanyahu recusou-se a congelar a construção dos assentamentos.
Nesta manhã, manifestações ao redor do mundo apoiando o pedido palestino anteciparam a reunião. Na Cidade de Gaza, manifestantes foram às ruas com cartazes de Abbas. Refugiados no Líbano fizeram um ato em frente à sede da ONU em Beirute.
Apoio
Muitos governos já declararam o seu apoio à proposta de Abbas, que foi fortalecida com a operação militar israelense na Faixa de Gaza. Vários países europeus (entre eles França, Espanha, Suíça, Irlanda, Dinamarca, Áustria e Noruega) devem votar a favor da resolução, em parte, por conta da preocupação de que se a iniciativa fracassar, Abbas e seu grupo político, o Fatah, sairão enfraquecidos em relação ao grupo islâmico Hamas, que não conta com a simpatia de parte da comunidade internacional por não reconhecer o Estado de Israel.
Potências regionais, como Brasil, Egito, China, África do Sul, Índia e Arábia Saudita, também anunciaram posição favorável ao pedido palestino. A proposta também deverá contar com apoio da totalidade de países árabes e islâmicos, além da Rússia e de maioria significativa na África e América Latina.
“Estamos encantados de ver uma clara maioria que presta apoio ao caminho da justiça”, indicou em comunicado o dirigente palestino, Mohammed Shtayyeh. De acordo com as estimativas, o texto conta com o apoio de 140 dos 193 países-membros da Assembleia Geral.
Garantias
O Reino Unido, que havia indicado que se absteria da votação, sugeriu nesta quarta-feira (28) que poderia mudar o seu posicionamento desde que a ANP realizasse modificações no texto proposto. A Alemanha manterá sua posição de abstenção.
Londres quer garantias de que Abbas não vai entrar com pedidos no Tribunal Penal Internacional de Haia e outras instituições contra Israel e pediu o compromisso das autoridades palestinas de negociarem com Israel sem condições prévias. Para voltar aos diálogos, os palestinos exigem o fim da expansão de assentamentos israelenses no território que deveria formar seu futuro Estado.
A iniciativa encontra forte oposição dos Estados Unidos e de Israel, apesar de ambos reconhecerem que um eventual fracasso da ANP pode deixar o caminho livre para o Hamas. Os EUA, aliados históricos dos israelenses, afirmaram que o pedido significará um "passo atrás" para os palestinos. "Creio que é um erro, essa votação não aproximará os palestinos de um Estado próprio", afirma Victoria Nuland, porta-voz do Departamento de Estado norte-americano. O Congresso dos EUA poderá votar sanções econômicas e políticas contra as entidades palestinas.
O premiê israelense Benjamin Netanyahu afirmou nesta quinta (29) que não haverá um Estado palestino "sem o reconhecimento de Israel como um Estado judeu". "A votação na ONU não mudará nada. Ela não vai antecipar a criação de um Estado palestino, pelo contrário, ela anfraquecerá [essa demanda]", afirmou.
Dos 193 membros da entidade, 132 reconhecem o Estado palestino, e os dois países já indicaram estar resignados com a derrota. O Canadá e alguns países insulares aliados dos Estados Unidos, como Ilhas Marshall, Nauru e Micronésia, também deverão votar contra a oposição.
O que pensam os palestinos
Pesquisas indicam que os palestinos estão desiludidos com as perspectivas de conseguir um Estado por meio de negociações. Duas décadas de diálogo fracassaram em produzir resultados, manchadas por intransigência e repetidas crises de violência.
Entre as organizações palestinas, existem muitas divergências quanto à votação que será apresentada nesta quinta (29). Enquanto todos apontam a importância de uma vitória simbólica da luta palestina, muitos apresentam críticas à estratégia da ANP e dizem que nada vai mudar com a possível modificação do status.
O Opera Mundi, que participa da cobertura do FSMPL (Fórum Social Mundial Palestina Livre), em Porto Alegre, conversou com representantes de diferentes delegações palestinas e encontrou um amplo espectro de opiniões e análises.
Fatah, Hamas e as ponderações
Demonstrando muito otimismo, Arafat Khalaf, prefeito de Betunia (município próximo a Ramallah), elogiou a iniciativa de Abbas e explicou que este é o primeiro passo da luta palestina por sua libertação. O político, que possui filiação ao Fatah, discordou das críticas que sugerem “que os palestinos deveriam tomar outras ações antes dessa” (como a retomada das negociações) e reiterou seu apoio ao presidente da ANP. “Abbas tem o poder para nos representar”, afirmou.
Já Yasser Amouri, professor de direito internacional na Universidade de Birzeit, em Jerusalém, explica que é favorável à proposta “porque nos dá a possibilidade de assinar e participar de pactos, tratados e organizações internacionais”.
Amouri também lembrou que, “com esse novo status, a Palestina poderá processar Israel por crimes de guerra no Tribunal Penal Internacional”. Porém, ressalta que as autoridades palestinas já podem se utilizar de mecanismos jurídicos do sistema internacional para combater as violações de direitos humanos creditadas ao vizinho. Amouri se refere à possibilidade de governos amigos, que integram a ONU e outros organismos internacionais, processarem autoridades israelenses em seu próprio território.
Outros ativistas foram pessimistas em relação ao pedido da ANP na ONU, por considerarem que não resolverá os problemas do povo palestino. “A Palestina como Estado não membro da ONU vai excluir, em suas negociações, os refugiados de 1948 e vai transformar em problema de fronteiras uma questão cujo tema central é a colonização por parte de Israel”, afirmou Wassim Ghantous, ativista palestino que integra delegação da juventude no FSMPL. “É preciso reconhecer isso: estamos presenciando um Estado com políticas segregacionistas”.
Na segunda-feira, o Hamas disse que apoiava a tentativa de Abbas de ganhar mais poder para os palestinos na ONU, no mais recente sinal de uma reaproximação entre os rivais políticos. O anúncio do Hamas foi inesperado. O grupo não reconhece o direito de existência de Israel e rejeitou as tentativas anteriores de Abbas de promover a causa palestina no palco diplomático.
Com agências