Senhor Diretas: morte de Ulysses completa 20 anos

Há exatos 20 anos, uma tragédia aérea vitimava o deputado federal Ulysses Guimarães, que esteve no centro dos principais acontecimentos do Brasil na segunda metade do século XX. O "Senhor Diretas", como ficou conhecido, desapareceu quando o helicóptero em que estava caiu no mar do Rio de Janeiro, na viagem entre Angra dos Reis (RJ) e São Paulo.

Com ele estavam sua mulher, dona Mora, o casal Marieta e Severo Gomes, além do comandante da aeronave, Jorge Comeratto. Não houve sobreviventes na queda. O corpo do parlamentar nunca foi encontrado.

Amigo de Ulysses desde 1963, o senador Pedro Simon (PMDB-RS) lembra bem de quando recebeu a informação sobre a morte do antigo companheiro de partido, naquele feriado de 12 de outubro de 1992. Simon acompanhava uma irmã, internada em um hospital de Porto Alegre, quando viu a notícia pela TV. "Foi um baque muito grande", recorda.

Vinte anos após o acidente, Simon exalta o papel do "doutor Ulysses" no processo para a retomada da democracia no País, nas décadas de 1970 e 1980. O senador rememora que deputado percorreu o Brasil lutando pela volta das eleições diretas. "Tive a oportunidade de ver a bravura e a competência com que ele conduziu a política brasileira em seu momento mais dramático", diz.

Para Simon, Ulysses se "apaixonou" pela causa da redemocratização. "Diante disso, tudo mais era supérfluo para ele", diz. Na primeira metade dos anos 1980, a campanha oposicionista cresceu em todo o País e, em 1984, o movimento Diretas Já tomou conta das ruas. Apelidado pela imprensa como "Senhor Diretas", Ulysses participou ativamente de comícios por todo o território nacional.
Simon ressalta a resistência que Ulysses mostrou diante de seus adversários. O gaúcho lembra que nem mesmo a violência do regime militar abalou a crença do deputado na democracia. "Ele conseguiu, com a palavra, derrubar uma ditadura de cinco generais", afirmou.

Tesoureiro do antigo MDB por 17 anos, enquanto Ulysses era presidente do partido, o deputado federal Mauro Benevides (PMDB-CE) também destaca o "espírito de luta" do colega falecido. "Ulysses foi um homem extremamente corajoso. Ele sempre teve a hombridade de resistir a todos os impactos daqueles que detinham o poder", diz.

Depois de lutar pela volta das eleições diretas, Ulysses ainda teve papel fundamental na elaboração da Constituição de 1988 – considerada um marco da redemocratização do País. Presidente da Assembleia Nacional Constituinte, ele participou ativamente na elaboração da nova Carta Magna do País. Para o cientista político e professor da Universidade de Brasília (UnB) Ricardo Caldas, a atual Constituição reflete muitos dos ideais que Ulysses tinha. "É mérito dele ter consagrado os valores relacionados aos direitos do cidadão", afirmou.

Num discurso histórico, Ulysses promulgou a nova Constituição brasileira na tarde de 5 de outubro de 1988, exatamente às 15h54. "Declaro promulgado o documento da liberdade, da democracia e da justiça social do Brasil", disse.

Em um momento em que políticos são julgados e condenados por atos de corrupção, os antigos companheiros enaltecem a honestidade de Ulysses. "Homens como Ulysses, Tancredo (Neves), Teotônio (Vilela) e Mario Covas fazem uma falta enorme. A falta de homens como eles levou o País a um vexame como o mensalão", afirmou Simon.

Para Benevides, Ulysses merece ter sua memória sempre reverenciada pelo País. "Ele foi um grande patriota sempre foi um homem de uma postura correta, um homem incorruptível", declarou.
Biografia

Primeiro dos cinco filhos da professora Amélia Correa Fontes e do coletor de impostos Ataliba Guimarães, Ulysses Silveira Guimarães nasceu em Rio Claro, no interior paulista, em 6 de outubro de 1916. Formado em direito, foi vice-presidente da União Nacional dos Estudantes (UNE).
Entrou para a política em 1945, quando ingressou no Partido Social Democrático (PSD). Dois anos depois, foi eleito deputado estadual de São Paulo. Ficou no cargo até 1950, quando conquistou vaga na Câmara dos Deputados – onde permaneceu até a sua morte. No total, foram 11 mandatos consecutivos. "Quem não se interessa pela política, não se interessa pela vida", costumava dizer.

Ao longo da carreira, foi candidato à presidência da República em duas ocasiões. Em 1973, foi lançado "anticandidato" na disputa no Colégio Eleitoral e, com essa atitude, tornou-se símbolo da resistência ao regime militar. Já nas eleições de 1989, mesmo dispondo de 22 minutos no programa eleitoral, obteve menos de 5% dos votos na disputa – vencida por Fernando Collor.

No último ano de vida, apoiou o impeachment de Collor. Ulysses, no entanto, morreu sem ver a renúncia e a cassação do presidente, o que ocorreria em dezembro de 1992.

Fonte: Terra