Certidões de óbito de 139 vítimas da ditadura podem ser alteradas

A Comissão da Verdade de São Paulo vai pedir à Justiça que mande corrigir as certidões de óbito ou desaparecimento de mais 139 vítimas da ditadura militar (1964-1985).

A lista inclui mortos e desaparecidos que nasceram no estado ou foram vistos pela última vez em seu território.A comissão quer alterar os documentos para retirar expressões ofensivas à memória das vítimas e versões falsas para suas mortes.

A ideia é seguir precedente aberto anteontem, quando a Justiça mandou retirar da certidão de óbito do jornalista Vladimir Herzog (1937-1975) a falsa informação de que ele teria se suicidado. O documento agora atribui a morte a "lesões e maus-tratos" no extinto DOI-Codi.

"Os documentos produzidos pela ditadura ainda provocam muita indignação nas famílias das vítimas", diz o presidente da comissão, deputado Adriano Diogo (PT).

O regime usava as certidões para ocultar os motivos reais de mortes na tortura. Um exemplo é o documento entregue à família do estudante Alexandre Vannucchi Leme, também morto no DOI-Codi, que afirma que ele fora vítima de atropelamento.

Outros papéis usam a expressão "terrorista" no campo reservado a identificar a profissão da vítima. A comissão vai reunir os papéis em posse das famílias e pedirá ajuda ao Ministério Público Estadual para cobrar as correções na Justiça.

Nesta terça (25), o ex-procurador-geral da República Cláudio Fonteles, integrante da Comissão Nacional da Verdade, disse que o exemplo de Herzog pode ser usado para corrigir os documentos de outros mortos e desaparecidos. "Foi altamente positivo", disse, durante audiência pública do grupo no Rio.

Colaboração de empresários

Fonteles afirmou ainda que a comissão está levantando documentos sobre a colaboração de empresários à ditadura. Mas disse que não poderia dar detalhes sobre o que já foi descoberto.

De acordo com o ex-procurador-geral, o depoimento do legista Harry Shibata, que assinou o atestado de óbito de Herzog, foi "um zero absoluto" por não ter trazido novas informações. Ele acrescentou que os depoimentos à comissão devem se intensificar após a leitura de documentos dos órgãos repressores disponíveis no Arquivo Nacional.

O diretor-geral do Arquivo Nacional, Jaime Antunes, disse que há mais de 200 órgãos que ainda não entregaram documentos referentes ao regime. Ele citou como exemplo empresas estatais e ministérios que nem sequer conseguem localizar os papéis produzidos na época.

Fonte: Folha de S.Paulo