É possível controlar a corrida armamentista?

Sabe-se que o comércio de armas é um setor blindado às crises. Os fabricantes de armamento ganham bilhões de dólares por ano com a venda de tanques de guerra, revólveres, balas e aviões de caça. O próspero setor possui regras próprias já há centenas de anos, consolidadas durante o século 20 e as suas inúmeras guerras, principalmente as mundiais.

Nesse contexto, a negociação pró-contenção armamentista dos países-membros da ONU, que teve início nesta segunda-feira (02/07), em Nova York, parece infrutífera. O encontro objetiva definir as metas de um tratado de controle do comércio armamentista no mundo. Seus pontos mais relevantes são: suspensão de fornecimento de armas a regiões de crise ou em conflito; proibição de exportação de armas quando as mesmas forem usadas para violar os direitos humanos ou quando o fornecimento coloca em risco o combate à pobreza e o desenvolvimento econômico.

Sem dúvida, os conflitos armados que ocorrem ao redor do mundo precisam de um freio, já que são os civis, principalmente, que pagam a conta desses ataques com a própria vida e o imperialismo faz, assim, a sua escalada com essas mortes encomendadas. Sob essa ótica, o projeto é bem-vindo.

O que lhe tira o mérito é a sua justificativa míope e parcial. A ONU alega que o mercado fornece “a ditadores e seus opositores o que eles precisam para oprimir populações ou fazer guerras. Um exemplo atual é a Síria: o regime Assad só consegue continuar reprimindo seus opositores graças às importações de armas da Rússia”, enfatiza.

Tendo-se em conta que quem maneja essas armas contra os “ditadores” – na verdade, chefes de estado, segundo a população sob sua régia – são mercenários pagos por governos desenvolvidos para invadirem e assumirem o comando de países do seu interesse político ou econômico, por exemplo, os do Oriente e os da América Latina, quem se beneficiará com essas medidas de contenção serão os países imperialistas.

Sem dúvida, o tema que a ONU colocou na berlinda merece atenção, mas em uma abrangência de discussão muito mais ampla, afinal, nas situações bélicas os “mocinhos e bandidos” não são vistos do mesmo modo pelos diferentes tipos de governos. Principalmente, os conflitos recebem diferentes avaliações de correntes políticas imperialistas e antiimperialistas.

Critérios

Os cinco membros permanentes do Conselho de Segurança da ONU — EUA, Rússia, China, França e Reino Unido – são todos grandes exportadores de armas. Esses pedem que os critérios para o controle sejam “humanitários”.

A China opõe-se a decisões baseadas nos “direitos humanos", explica Simone Wisotzki, da ONU. Justificável: trata-se de critérios vagos e facilmente manipulados.
Já os EUA, segundo Wisotzki, exercem "um papel ambivalente" neste contexto, principalmente no que diz respeito à submissão do controle de munições e armas de pequeno porte às Nações Unidas.

Katharina Spiess, da Anistia Internacional, acredita que os grandes exportadores de armas têm interesse em regras internacionais para o setor. "Já temos regras de controle do comércio de armas em âmbito regional. Na União Europeia, por exemplo, há desde 2008 uma 'cláusula comum' que proíbe a transferência de armas quando há violações de direitos humanos. Os EUA também conhecem tais regras", completa Spiess.

Consenso

Os 193 países-membros da ONU estão reunidos em Nova York para negociar sobre o assunto, embora o prazo de quatro semanas seja muito curto para se chegar a um acordo, observa Simone Wisotzki. Na opinião dela, é possível que o documento fique cada vez menos consistente devido à necessidade de chegar a qualquer custo a um consenso.
Para quem observa criticamente e à distância, consenso, nesse debate, assemelha-se muito mais a um horizonte inatingível do que a real possibilidade de trilhar os primeiros passos na direção da paz possível e desejada por movimentos humanitários e sociais.

Por Christiane Marcondes, de São Paulo