A ameaça da água engarrafada
A privatização dos recursos hídricos vem avançando nos últimos anos e está agravando o estabelecimento de políticas que priorizem interesses maiores para a sociedade como a saúde pública, em especial nas regiões mais periféricas e carentes. É o que alertam especialistas ouvidos pelo Vermelho. O assunto vem à tona nesta semana, por conta do Dia Mundial da Água (22 de março), determinado pela Organização das Nações Unidas (ONU) na Rio 92.
Publicado 22/03/2012 20:35
“O sistema capitalista está avançando no processo de privatização dos recursos naturais, inclusive a água. E isso tem levado empresas ao controle, como a Pepsi e Coca-cola, que atualmente são grandes detentoras e revendedoras de água engarrafada. Tem várias empresas que detêm o controle da distribuição de água, em grandes centros urbanos importantes”, adverte Aldo Arantes, secretário de Meio Ambiente do PCdoB.
Em sua avaliação, a questão se agravou ainda mais com o surgimento do neoliberalismo, que reduziu em muitos países o papel do Estado, fragilizando instrumentos essenciais de contenção dos processos de exploração dos recursos naturais.
“É preciso ter consciência da importância e da gravidade da crise da água. O consumo em nível mundial está crescendo de forma vertiginosa, o que reduz a oferta de água potável. Isso decorre porque o sistema capitalista predatório não leva em conta os interesses maiores da sociedade. Utiliza de maneira indiscriminada agrotóxicos, não preserva as áreas de proteção e recursos hídricos, nas cidades há muitos detritos nos leitos dos rios”, acrescenta Aldo Arantes.
O tema eleito para este ano é “A água e a segurança alimentar”. O organismo faz um alerta: é preciso usá-la de maneira mais racional na agricultura, atividade que mais consome recursos hídricos.
Aldo Arantes acrescenta que, além da agricultura, a pecuária é outra atividade que está entre as que mais consomem o recurso natural. Para se produzir um quilo de trigo, são necessários 1.500 litros de água. Já para produzir um quilo de carne é necessária 10 vezes a mesma quantidade de água.
Centros Urbanos
Com relação ao consumo e à qualidade da água nas grandes cidades, o professor José Luiz Negrão Mucci, do departamento de Saúde Ambiental, da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo (USP), é otimista. Para ele, as novas gerações já estão dando sinais de uma mudança cultural no comportamento. No entanto, ele ressalta que é preciso continuar insistindo em campanhas e na educação ambiental.
“A gente percebe que há uma mudança nas novas gerações. Os pequenos já pensam diferente de seus pais. Mas ainda não causou um grande impacto no comportamento social. Estou há 20 anos ensinando os mesmos conteúdos aos futuros professores. Pouco se avançou na inclusão da temática nas salas de aula e, consequentemente, nossos rios e reservatórios permanecem poluídos. Claro que o poder público também deixa de fazer o seu papel”, declarou José Luiz Negrão Mucci. Um exemplo citado por ele é o do Rio Tietê, que há anos o governo do estado vem anunciando sua despoluição, mas nada acontece. Há alguns projetos, mas que visam somente a prevenção de enchentes, com o rebaixamento da calha.
“A propaganda que incentiva práticas individuais tem o seu significado. Mas a questão de fundo é a política pública. É o estabelecimento de regras e o controle do poder público. Daí a importância do papel do estado nesse processo. Isso não exclui a atitude individual. Mas colocá-la como algo que vá resolver o problema é despolitizar a questão”, conclui Arantes.
De São Paulo
Deborah Moreira