Celular, um eletrônico condenado à extinção: não preserve!
O indiano Sugata Mitra — professor de Tecnologia educacional na Escola de Educação, Comunicação e Ciências de Linguagem da Universidade de Newcastle, no Reino Unido — acredita que o celular desaparecerá em cinco anos. Para a maioria dos brasileiros, clientes de operadoras campeãs de queixas no Procon, o mundo sem o celular traz a perspectiva de mais tempo dedicado a atividades úteis em vez de horas perdidas com menus ineficientes de atendimento terceirizados.
Por Christiane Marcondes
Publicado 13/02/2012 22:13

“Só mais um minuto, senhora” foi uma frase que ouvi literalmente centenas de vezes desde o dia 09 de janeiro, quando recebi via torpedo uma mensagem da operadora Claro dizendo que a minha próxima conta do celular teria o valor de dois mil e trezentos reais. A partir daí iniciei uma jornada kafkiana, igual a muitas que todos já viveram nesses tempos modernos, tempos em que o “processo” não está em toneladas de papéis, mas em arquivos digitais. É pior: cada vez que ligo para a central, tenho que repetir o histórico, além do número do meu celular e nome. (Se eles não sabem qual é o meu número de celular como podem saber qual é o valor da minha conta?).
Um atendimento em tempo real
Vê-se que a evolução do meio papel para o meio eletrônico não significa evolução em termos de eficiência. A velha burocracia segue cada vez mais incompetente em função de um fenômeno que também não é moderno: a terceirização.
Nesta terça (13), às 21h18, justamente para fazer esta reportagem, volto a ligar para a Claro. Atendeu-me uma jovem, perguntei se ela era terceirizada, disse que sim, mas que atendia em nome da Claro. Perguntei se, caso eu quisesse falar com financeiro, ela me passaria para alguém da mesma empresa em que trabalhava, ela disse que não e que não sabia qual empresa me atenderia, porque há terceirizadas Claro em todo o país.
Pedi então para falar com o supervisor e questionei se ele era da mesma empresa que ela. Respondeu-me (estou aguardando o retorno) que só poderia encaminhar meu caso a um supervisor quando soubesse do que se tratava (já narrei meu problema com detalhes a dezenas de atendentes de dezenas de terceirizadas, em vão).
Disse para ela consultar o protocolo desta manhã, gerado por uma ligação na qual fiquei quase uma hora esperando o supervisor como se espera Godot: nada! Ele não apareceu e eu desliguei porque tenho uma vida fora do celular.
O carma dos terceiros
Continuo aguardando a atendente; do outro lado da linha, o silêncio dos terceirizados, nem musiquinha. Enquanto espero, detalhes desta comédia digital de erros voltam-me à lembrança: esta moça me perguntou qual o número do protocolo da minha reclamação, senão não poderia localizar meu caso. Tiver que rir: “pode pegar qualquer protocolo, todos desde o dia 9 de janeiro são de reclamação, desta mesma reclamação”.
Já solicitei há uma semana (disseram-me que eu receberia em 10 dias) todas as ligações gravadas para provar que nunca liguei para a Central nem fui a loja alguma mudar meu plano e, assim, caracterizando a tal multa contratual pela qual me cobram dois mil reais.
A pobre terceirizada que me atende é como um espectador que assiste à novela só no último capítulo, ela não entende nada, não sabe o que dizer, ganha mal e chega em casa esgotada e humilhada de tanto ouvir reclamações e xingamentos.
A Claro é recordista em reclamações, mas todas as operadoras, apesar da elevada concorrência de mercado, parecem treinadas para deixar o cliente insatisfeito.
Final infeliz
Já estou há 34 minutos no celular. Ouvi agora que a atendente vai emitir novo protocolo de reclamação e receberei retorno em 48 horas. Digo que já ouvi isso e que quero falar com alguém que decida. Ela disse que estou sendo atendida em nível 1, não tenho portanto o direito de falar com o nível 2, imagino que tenha alguém mais poderoso nesse patamar.
Para passar o tempo, porque resolvo esperar o supervisor – não há nenhum à vista, garantiu-me a atendente, tentando me desanimar – vou explicar como é o atendimento Claro, há pelo menos três áreas que posso acessar via central, relacionamento, cobrança e promoções. Cada um vende um peixe e não se conhecem, concorrem.
Elas estão no contexto de uma empresa de telecomunicações e não se comunicam porque são empresas diferentes. Já consegui falar com as três em uma mesma ligação, que durou o tempo de um jogo de futebol com direito à prorrogação.
A atendente reapareceu e disse que a supervisora Maiara me atenderia. Atendeu, mas pediu meu número de celular. Questionei: “você não sabe?”. Disse que não, daí me pediu um minuto (ficou brava?) e ligou a conhecida musiquinha Claro. Sei que deste mato não sairá coelho.
Encerro a matéria na esperança de que os celulares desapareçam, sim, e pedindo a Deus para o Google não domine nossas cabeças. Esta é outra previsão do indiano Sugata Mitra na Campus Party Brasil 2012.
De acordo com o especialista, toda a tecnologia embarcada no dispositivo, assim como o acesso ao Google, pode ser transferida para o cérebro humano, causando uma revolução total na forma como a tecnologia é consumida e como o ambiente educacional é formatado.
Será que um dia vão terceirizar nossas funções cerebrais assim como os serviços de uma operadora? A propósito, depois da musiquinha, a ligação que iniciei para fazer esta reportagem convenientemente caiu. Hora do óbito: 22h03. É muita agonia, não é?