"Vitória da Argentina na Copa de 78 foi acordo de ditaduras"
Uma das maiores polêmicas de todas as Copas do Mundo ganhou um novo capítulo nesta segunda-feira (06). A goleada de 6 a 0 que classificou a Argentina e eliminou o Brasil do mundial de 1978 foi fruto de um acordo feito entre as ditaduras militares dos dois países.
Publicado 08/02/2012 16:47
A afirmação é do ex-senador peruano Genaro Ledesma Izquieta, segundo quem o regime do general Jorge Videla aceitou receber ilegalmente um grupo de opositores da ditadura peruana em troca da vitória na partida que garantiu a seleção da casa nas semifinais do mundial.
“Videla nos aceitou como prisioneiros de guerra, com a condição de que o Peru permitisse o triunfo da Argentina no campeonato mundial de futebol, porque isso tinha importância para Videla: precisavam deste triunfo para limpar a má imagem da Argentina no mundo”, disse Ledesma, em depoimento à Justiça argentina. A informação foi publicada pelo jornal Tiempo Argentino.
Ledesma foi um dos 13 peruanos presos sem ordem judicial e levados ilegalmente em avião à Argentina, naquele ano, para serem jogados ao mar do alto de aviões, nos chamados “voos da morte”.
As declarações do sobrevivente, que por duas vezes foi candidato à presidência do Peru, foram feitas em depoimento ao juiz argentino Norberto Oyarbide, que investiga as acusações de privação ilegal de liberdade e tortura do grupo, formado por sindicalistas, dirigentes políticos, membros das Forças Armadas e um jornalista. Na semana passada, o magistrado ordenou a captura internacional e extradição do ex-ditador peruano Francisco Morales Bermúdez.
A investigação indica a participação da ditadura peruana na Operação Condor, até então descartada. A operação consistia na colaboração entre os regimes militares dos países do Cone Sul – principalmente Brasil, Argentina, Chile, Paraguai, Bolívia e Uruguai – para o extermínio de opositores entre 1970 e 1980.
Ao se interar do pedido de prisão e extradição à Interpol, por meio da chancelaria argentina, Bermúdez negou as acusações, afirmando que o caso se tratou da deportação de um grupo de políticos que alterava a ordem pública em um período de “preparação para uma transição democrática”. “Querem enquadrar o Peru e o governo que presidi, à força, na Operação Condor, na qual o Peru nunca entrou”, alegou.
Além de Ledesma, os peruanos Ricardo Napuri Schapiro, José Bravo, Justiniano Aspaza Ordoñez, Alfonso Baella Tuesta, Hugo Galdos, Humberto Larrain, Ricardo Díaz Chávez, Javier Canseco Cisneros, Ricardo Letts Colmenares, Valentín Pacho Quispe, José Arce Larco e Guillermo Faura Gay eram opositores ao regime de Bermúdez e foram acusados de “atividades subversivas”.
Presos ilegalmente durante uma greve geral em 1978, os 13 peruanos foram levados, acorrentados, em um Hércules, do Peru à Argentina, onde passaram por diferentes centros clandestinos de prisão e foram forçados a assinar um documento de solicitação de asilo político no país, para melhorar a imagem internacional da Argentina. Ante a recusa e a pressão dos familiares por sua liberação, o grupo acabou sendo expulso para outros países.
As denúncias de que a vitória da Argentina na Copa do Mundo de 1978 foi “combinada” não são novas. Em um livro chamado “Fuimos Campeones” (Fomos Campeões, em espanhol), o jornalista argentino Ricardo Gotta reconstrói a vitória da seleção de seu país por seis gols sobre o Peru, com base no contexto político e social argentino, incluindo a prisão e translado ilegais de esquerdistas peruanos à Argentina, a presença do filho de Bermúdez no país durante os jogos e a visita do ditador argentino Jorge Videla e do ex-secretário de Estado dos EUA, Henry Kissinger, ao vestiário do Peru, para uma possível intimidação, antes da partida.
Na obra jornalística, publicada em 2008 pela editora catalã Edhasa, Gotta revela evidências de uma relação amistosa e estreita entre as ditaduras de ambos os países antes mesmo do início da goleada na final da Copa do Mundo, que classifica como “polêmica”, e da participação do Peru na Operação Condor, com repressão conjunta de militantes opositores aos regimes militares deste país e da Argentina.
Fonte: Opera Mundi