Valton de Miranda – O silêncio da voz

Por *Valton de Miranda

O câncer de laringe do ex-presidente Lula faz evocar a mitológica guerra de Troia. A personagem mundial Lula está numa guerra global que tem como principal front da sua atuação política o Brasil. O Capital debate-se convulsivamente na sua crise estrutural indo dos EUA à Grécia, tentando mil remendos, entretanto sua falência parece inevitável. As insanas instituições da jogatina como Banco Mundial e FMI mostram-se falidas e buscam grotesca ajuda em países emergentes como China e Brasil. Nesta conjuntura, assoma a grandiosa personalidade política de Lula que liderou forças de centro-esquerda num movimento de transformação reconhecido mundialmente, projetando sua figura no planeta e inserindo a nação entre os Brics colocados como alternativa ao tradicional domínio Europa-EUA. Deixando o panorama desta guerra mundial não declarada e ingressando na luta política brasileira, o câncer de laringe do ex-presidente toma uma dimensão extraordinária.

Os inimigos do projeto transformador liderado por Lula, embora todos os protestos de pronta recuperação, estão exultantes porque o formidável adversário foi atingido no centro da sua potência político-comunicacional, a voz. Se me permitem uma licença argumentativa trocando o troiano Heitor, pelo grego Aquiles, diria que esse gênio da guerra comunicacional foi atingido no seu ponto fraco-forte pela certeira flecha inimiga. O câncer aparentemente obedeceu as pragas e mau olhados lançados pelos opositores da elite conservadora através da sua visceral aliança midiática, atingindo por obscuros caminhos o ponto certo.

A ascensão da esquerda no Brasil até a chegada de Lula à presidência se deu com perseguição, tortura e morte numa implacável cruzada que sistematicamente acusou este pensamento político de corrupto e antipatriótico.

Durante todo o governo Lula a maioria da imprensa brasileira atacou-o impiedosamente, utilizando a bandeira da ética e tentando juntamente com as forças de direita a sua destituição. Não lograram seu intento, pois o povo sentiu as mudanças e respondeu elegendo Dilma. A história registra como a ética foi utilizada na ascensão de Hitler e, como igualmente no Brasil, isso foi feito para colocar no planalto o bisonho Collor, o antimarajá, que a TV Globo utilizou para bloquear o caminho de Lula, derrubando-o do poder porque sua paranoia dificultava os negócios das empresas de comunicação.

Naturalmente, os anões do orçamento estavam lá, mas sabe-se que dando um tratamento jornalístico adequado, certas denúncias adquirem tal verossimilhança que o denunciado nunca mais se livra da sujeira colada ao seu corpo.

Nunca conseguiram fazer isso com Lula que, sem dúvida, triunfou sobre a mídia. Numa expressão jocosa Lula disse: “a Revista Óia vai continuar com seu trabalho denunciatório”. Mas agora já sabemos como contra-atacar de forma consequente. O objetivo da centro-direita para as eleições do próximo ano é colocar dentro da nossa cidadela o cavalo de Troia que tem na sua barriga o vírus cancerígeno desejoso de emudecer a voz da esquerda brasileira.

* Valton de Miranda Leitão é médico psicanalista 

Fonte: O Povo