Anatel investiga sobrecarga na telefonia móvel de Teresina
A Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) no Piauí está investigando se a rede de telefonia móvel em Teresina está sobrecarregada, ou seja, com um número de linhas de telefone celular acima do limite. Em fevereiro, a agência foi provocada pelo Procon e pela Comissão de Direitos do Consumidor da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-PI), devido às cada vez mais constantes reclamações dos usuários do sistema na capital.
Publicado 15/05/2011 06:11 | Editado 04/03/2020 17:00
A explicação é simples. A comunicação por celular é feita através de estações rádiobase, conhecidas popularmente como torres de celular. São as torres de telefonia que fazem a intermediação entre dois usuários que conversam através do celular. Quando um usuário de celular disca um número, a estação rádiobase mais próxima dele vai receber aquele sinal e direcioná-lo para a estação rádio-base mais próxima do destinatário da ligação. O problema é que esses equipamentos têm um limite na capacidade de chamadas que podem processar ao mesmo tempo. A suspeita é de que, em Teresina, o número de usuários ultrapassou a capacidade das estações rádio-base que não foram adaptadas para processar tantas ligações. Por isso as irritantes quedas no sistema.
O gerente da Anatel no Piauí, Carlos Bezerra, explica que atualmente a agência está promovendo uma fiscalização simultânea das quatro operadoras – TIM, Claro, Vivo e Oi – que prestam o serviço no Piauí.
A popularização e a proliferação de promoções que estimulam os usuários a manter até mais de uma conta de celular simultaneamente é apontado por ele como um fator que explicaria os problemas de sobrecarga na rede. "Mas é obrigação das operadoras manter a qualidade do serviço independente de qualquer coisa", admite.
Com o relatório técnico concluído, a Anatel pode abrir processo administrativo contra as operadoras que não atualizaram seus serviços, o que pode ocasionar multas no valor de até R$ 50 milhões e, em casos extremos, é possível inclusive suspender a concessão obtida pelas operadoras para prestação. Mas Carlos Bezerra acredita que uma medida como essa não seria benéfica para o sistema. "As pessoas falam em retirar a concessão das operadoras, mas acreditamos que é melhor cobrar uma melhora no sistema do que suspender a operadora e deixar o consumidor sem esse serviço", defende Carlos.
Empresas podem perder concessão
Em fevereiro deste ano, o Procon provocou as quatro operadoras a se pronunciarem sobre os problemas identificados na rede de telefonia móvel piauiense. Uma vez comprovado o problema, as operadoras serão convocadas a assinar um Termo de Ajuste de Conduta, e, em caso de descumprimento, o Procon pode aplicar multa e direcionar a questão para o judiciário, o que pode culminar na suspensão da comercialização de novas linhas pelas operadoras condenadas, de maneira similar ao que aconteceu recentemente no Rio Grande do Norte. "As operadoras têm uma concessão pública e obrigação de se adequar às normas e diretrizes estabelecidas para um melhor prestação desse serviço. Em casos extremos, é possível, sim, substituir a empresa, retirando a concessão e repassando para outra", resume Cleandro Moura, coordenador do Procon no Piauí.
Telefonia móvel está entre os serviços mais reclamados no Procon
O crescimento das vendas gera aumento nos lucros das operadoras, mas não vem sendo acompanhado por melhorias na prestação do serviço. Segundo dados do Procon estadual, a telefonia móvel se reveza com o sistema bancário e o fornecimento de energia elétrica no topo do ranking de reclamações dos consumidores piauienses. Em 2010, foram mais de 500 reclamações registradas pelo Procon, distribuídas pelas quatro operadoras com autorização para atuar no Piauí. De janeiro a 12 de maio deste ano, o número de reclamações de consumidores da telefonia móvel já era superior a 200, o que permite antever um recorde nada honroso para as operadoras de telefonia no ano de 2011.
As constantes quedas de sistema ganharam evidência desde o ano passado, mas não são o único problema enfrentado pelos consumidores de telefonia móvel de Teresina. Na verdade, no topo de reclamações contabilizadas mensalmente pela Anatel, as cobranças indevidas são as principais fontes de irritação para os usuários em todo o País. Das mais de 65 mil reclamações registradas pela Anatel durante o mês de março deste ano, 28 mil são relacionadas a problemas nas cobranças.
O estudante Igor Prado poderia estar nessa estatística. Durante anos, ele pagou R$ 200 por um pacote que incluía internet, celular e telefonia fixa. Mas, em abril, chegaram as cobranças de duas contas que, totalizadas, somavam o valor de R$ 500. "O serviço de telefonia móvel em Teresina é ruim, instável, caro e sempre dificultado quando o assunto é a solução de pequenos problemas. Especialmente no pós pago, que era o meu caso. Pós decepção. Passo a sentir profundamente que a falta de informação que as empresas nos passam não é só mal entendido, mas chega a parecer mal intencionado", reclama.
Presidente da Comissão de Direitos do Consumidor da OAB-PI, Astrogildo Assunção defende que cada consumidor que se considere lesado por uma empresa de telefonia móvel ingresse individualmente no juizado especial. "Se cada um entrar com uma ação, elas terão maior agilidade na resposta a esses problemas", acredita Astrogildo.
Através dos Juizados Especiais, é possível ingressar com ações que não ultrapassem o valor de 20 salários mínimos. O advogado esclarece que cabe à operadora o ônus de comprovar a correta prestação do serviço de telefonia para aquele consumidor. "O consumidor só precisa apresentar a reclamação. Até uma notícia de pane nos jornais ou a conta de telefone podem servir como prova. Mas a obrigação de comprovar a correta prestação do serviço é da operadora", afirma Astrogildo.
Sinal de "rede ocupada" é constante, dizem usuários
No ano passado, o estudante universitário Iago Tavares se viu diante de um problema inesperado. O sinal do seu celular começou a falhar dentro da sua residência. Em alguns pontos da casa, localizada no bairro Aeroporto, zona Norte de Teresina, ele conseguia usar o telefone, mas caso se deslocasse para outro cômodo a ligação caía e o celular ficava fora de área. "Durante a ocorrência da pane, enfrentei problemas de cunho profissional e pessoal. Não conseguia me comunicar com alguns clientes e colegas de trabalho, o que acarretava gastos com novas tentativas de ligações", afirma ele.
No caso da arquiteta Ana Luísa Cronemberger, o problema persiste até hoje. Ela mora em São Paulo, e adquiriu uma linha promocional para se comunicar com os familiares que ficaram em Teresina. O plano possibilita ligações DDD ilimitadas, a um custo único, sem contagem de minutos, para celulares da mesma operadora. Parecia um ótimo negócio, mas Ana Luísa anda tendo dificuldades nessa comunicação.
"Teoricamente, por conta do preço cobrado aos clientes da promoção, seria mais simples falar com as pessoas de Teresina que também são clientes da mesma operadora, mas na prática nem sempre é assim. É muito comum eu tentar ligar pra algum número TIM de Teresina e aparecer 'rede ocupada' ou entrar na caixa-postal sem que o telefone esteja realmente desligado. Além disso, eu já perdi a conta de quantas vezes já aconteceu da ligação ficar caindo e eu precisar ficar ligando novamente para conseguir terminar de falar o que eu precisava", afirma Ana Luísa.
As reclamações de Ana Luísa e Iago se juntam a de vários consumidores em todo o Brasil que andam insatisfeitos com o serviço de telefonia móvel oferecido pelas operadoras, que recebem uma concessão pública para essa prestação. Neste ano, foi ultrapassada a barreira de 210 milhões de chips de celular no Brasil, consolidando o fato de que há mais linhas de telefonia móvel do que habitantes no País. Mas as constantes panes e reclamações dos consumidores mostram que o sistema talvez não esteja preparado para atender toda essa demanda.
O Piauí fechou o último mês de março com aproximadamente 2,7 milhões de linhas de celular, correspondendo a 1,31% do mercado nacional. Em um ano, foram adquiridos quase 800 mil novas linhas de celulares pela população do Estado, um crescimento de 40% contabilizado desde março de 2010. As promoções que visam à fidelização, garantindo gratuidade e vantagens para ligações entre clientes que utilizam a mesma operadora, têm estimulado cada vez mais pessoas a manter duas linhas de celular simultaneamente, o que de certa forma justifica o crescimento. É o caso de Thelma Tiemi, que mantém um celular da TIM e outro da Oi. "Mantenho os dois celulares por causa da promoções. Com a TIM eu ligo mais barato para celulares da mesma operadora. Já com a Oi, não preciso pagar deslocamento em viagens quando recebo ligações", explica.
Fonte: Jornal O Dia