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Dr. Rosinha: Gaza, a viagem que não fiz

O cerco de Israel contra a Faixa de Gaza impede a chegada de provimentos e também a solidariedade humana internacional

Por Dr. Rosinha*, em Congresso em Foco

"É com profundo pesar e alguma preocupação pela rápida deterioração da situação de segurança causada pelo forte aumento da artilharia e dos ataques aéreos israelenses sobre Gaza, que o Council for European Palestinian Relations (CEPR) sente que não há alternativa senão a de cancelar a próxima delegação internacional a Gaza.

Entendemos que esse é um grave inconveniente para o senhor, mas a segurança dos nossos parlamentares deve ser a nossa primeira prioridade.

Por favor, aceite nossas sinceras desculpas, mas sob as atuais circunstâncias – uma nova guerra de Israel contra Gaza – não é possível prosseguir com a visita.

Continuaremos a trabalhar para acabar com o cerco ilegal do território e o manteremos informado da situação desumana e desesperada em que se encontram os moradores de Gaza. Nossos pensamentos estão com o povo palestino e, como eles, enfrentaremos mais uma rodada de agressão israelense. Temos que esperar que retorne uma situação mais tranquila e, assim que possível, retornaremos o contato.

Nada pode ser mais necessário e urgente do que encontrar uma solução justa e duradoura para a população civil de 1,5 milhão de pessoas que enfrentam o aumento da agressão militar”.

 

Recebi esta mensagem no último dia 7 de abril, quando me preparava, junto com outros deputados federais do Brasil, para uma viagem à Faixa de Gaza. Íamos numa comitiva de aproximadamente cem parlamentares de diferentes regiões do mundo para uma visita de solidariedade ao povo palestino.
 
Há mais de dois meses venho trocando correspondência e informações com a ONG Council for European Palestinian Relations [Conselho para Relações Europeias-Palestinas] e, junto com eles, organizando a viagem de uma delegação de deputados de diferentes países. Na justificativa para a visita, o CEPR elencou algumas razões.

Há mais de três anos e meio, Israel impõe um bloqueio à Faixa de Gaza, com o agravante de que há dois anos ocorreu a operação “Chumbo derretido”, internacionalmente condenada.

Israel continua desafiando e desrespeitando todas as leis internacionais, e impõe aos palestinos uma punição coletiva. Oito em cada dez pessoas da Faixa de Gaza dependem da ajuda internacional, e 39% está desempregada.

A Agência das Nações Unidas para Refugiados (Acnur), que fornece educação básica e saúde, tem também a responsabilidade de reconstruir as casas, cujo déficit é calculado em 86 mil moradias. Apenas 7% dos projetos de construção da agência são aprovados por Israel. Assim mesmo, por obstrução israelense, nem os projetos aprovados são executados.

Os projetos da Acnur são de reconstrução da infraestrutura básica destruída durante os ataques da Operação Chumbo Derretido, cometida por Israel contra os moradores palestinos da Faixa de Gaza, entre o fim de 2008 e o começo de 2009. Israel também não permite o fornecimento de combustível, o que resulta em escassez de energia elétrica.

Muitas das passagens em Gaza continuam fechadas, apesar das promessas de Israel de reabrir os pontos de passagem. Inclusive nenhum tipo de produto para exportação é autorizado a deixar Gaza – 85% de suas águas territoriais permanecem inacessíveis para os civis que ali vivem.

 

“[…] Por isso, gostaria de vos convidar a participar de uma grande delegação de parlamentares de várias partes do mundo, para testemunhar em primeira mão o sofrimento contínuo da população de Gaza, e pressionar as autoridades de Israel para acabar com o bloqueio ilegal da Faixa de Gaza e com as punições coletivas feitas por Israel contra a população desse território. A delegação será realizada entre os dias 15 e 20 de abril de 2011.

A situação em Gaza é uma afronta a todos os povos civilizados e deve ser combatida. Espero, portanto, que o senhor possa se juntar a nós nessa importante delegação e acrescentar a sua voz ao coro dos que se opõem a essa calamidade contínua.

Bruxelas, 11 de fevereiro de 2011”
 

O nome da operação (Chumbo derretido) não nega a violência a qual foi submetido o povo palestino que vive na Faixa de Gaza. Segundo a Anistia Internacional, durante os 22 dias da operação, 1,4 mil palestinos morreram, entre eles 300 crianças, mais de 115 mulheres e 85 homens com mais de 50 anos de idade.
 
Muitos foram mortos em ataques de armas de alta precisão, que permite aos que efetuam ou dirigem os ataques ver o alvo em detalhes.

Ao longo desses 22 dias, além do número de mortos, muitos bens palestinos foram destruídos, muito além do que em qualquer outra ofensiva israelense anterior. A Anistia Internacional visitou Gaza e encontrou indícios de que a destruição foi realizada de forma leviana e deliberada.

Denuncia a Anistia Internacional que as forças israelenses atacaram ambulâncias e equipes médicas, matando vários trabalhadores da área de saúde que tentavam socorrer as pessoas feridas ou recolher os cadáveres.

Acrescento que os bombardeios e o cerco de Israel contra a Faixa de Gaza continuam e impedem não somente a chegada de provimentos e material de infraestrutura. Impedem também a chegada da solidariedade humana internacional. Por isso não viajamos.

Este é o relato da viagem que não fiz.

*Dr. Rosinha é Médico. Exerce o quarto mandato na Câmara dos Deputados, pelo PT do Paraná.