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Japão é o maior comprador da dívida externa corporativa do Brasil

"O Japão é um dos suspeitos óbvios." Foi com essa frase que a chinesa Anita Fung, responsável pela área de atacado do HSBC na Ásia/Pacífico, respondeu à pergunta sobre qual seria o país de origem da maior parte dos interessados em ações e títulos de renda fixa brasileiros na ampla região sob sua responsabilidade.

Os números da gestora de recursos do HSBC e do Banco Central comprovam o que ela diz. De janeiro a julho, dos US$ 12,666 bilhões em papéis de dívida de médio e longo prazo colocados por empresas e bancos brasileiros no exterior, US$ 6,51 bilhões, ou 51,4%, foram adquiridos por investidores no Japão. É um aumento de quase 450% em relação ao mesmo período de 2009.

Neste ano, os japoneses passaram os investidores dos Estados Unidos como os principais compradores de dívida corporativa brasileira de mais longo prazo. Os americanos compraram um total de US$ 2,311 bilhões, ou 18,2%, e os investidores das Ilhas Cayman, US$ 2,737 bilhões, ou 21,6%. Em 2009 inteiro, os americanos haviam liderado as compras, abocanhando 39,4% dos US$ 8,432 bilhões em papéis emitidos, seguidos já pelos japoneses, com fatia de 22,9%.

Ligação cultural

Considerando-se só a gestora do HSBC no Japão, o total de títulos de renda fixa brasileiros em poder dos japoneses cresceu 238% de dezembro de 2009 até agosto, para US$ 2,911 bilhões, incluídos também papéis do governo. No fim de 2008, a asset do banco tinha somente US$ 32 milhões de papéis do Brasil.

Mas não é só na compra de títulos de renda fixa externa que os japoneses têm se destacado. "No ano passado, nós tivemos uma venda recorde de títulos e também de ações brasileiras para clientes japoneses por meio de nossa gestora de recursos de terceiros", comenta Anita Fung. De acordo com ela, os ativos brasileiros, inclusive papéis do governo brasileiro em reais, foram os que mais tiveram crescimento de demanda no ano passado entre todos os vendidos pelo banco no mercado japonês.

Segundo ela, "a ligação cultural entre os dois países é óbvia, pois o Brasil tem a maior população japonesa fora do Japão". Além disso, diz ela, os japoneses estão confiantes na qualidade de crédito do Brasil e de suas empresas e nas perspectivas de crescimento econômico no país. "Comparando os juros absolutos em reais com o risco de depreciação do câmbio você logo percebe que os ativos em reais são de muito boa qualidade para o longo prazo", comenta.

Transição será suave

Para Anita Fung, o Brasil conseguiu "se vender bem nesse período de um ou dois últimos anos". Além disso, há boas notícias, como a Copa do Mundo e as Olimpíadas. "As pessoas acreditam que o atual presidente fez coisas boas ao país e que a transição de governo será suave", afirma, para completar: "Eu não vejo as asiáticos sequer hesitarem em investir no Brasil por causa das eleições presidenciais".

Ela lembra que para os investidores comprarem títulos de dívida ou ações em reais eles têm de ter certeza de que a flutuação da moeda será bem compensada pelo rendimento dos papéis ou pelo retorno provável das ações. Juntamos juros em recordes de baixa nos países desenvolvidos e o resultado é uma grande liquidez vinda da Ásia para o Brasil.
"Ninguém pode desprezar o acúmulo de riqueza e de capital na Ásia, particularmente nos últimos cinco anos", afirma.

"Hoje eu posso dizer que se você quiser vender uma emissão de bônus brasileiro somente na Ásia, você pode, sem precisar ir para a América ou Europa", completa Gerardo Mato, CEO da área de global banking do HSBC para América Latina.

Fundos familiares

Em ações, a importância do Japão também não é desprezível. Somente o asset do HSBC cresceu suas posições de US$ 531 milhões no final de 2008 para nada menos do que US$ 3,152 bilhões no final de 2009. Em agosto deste ano, caiu para US$ 2,827 bilhões.

Os principais compradores de papéis e ações em reais, segundo Anita Fung, são as pessoas físicas por meio de gestoras de recursos, da área de private banking dos bancos, que reúnem os clientes mais ricos, e também os "family trust funds", os fundos familiares ou os chamados "family offices". "As pessoas físicas não precisam prestar contas para acionistas e podem ficar com os papéis por muito tempo", diz. Os gestores de fundos de hedge, menos avessos ao risco, também podem assumir essas posições.

Bancos na Ásia e no Pacífico e seguradoras são compradores de produtos de renda fixa ou variável da América Latina, mas principalmente em dólares americanos ou euro. "É difícil para esses investidores comprarem ativos nas moedas domésticas, como em reais, por exemplo, pois você teria de ir ao mercado internacional de swap, há complicações de contabilidade, de marcação a mercado obrigatória desses derivativos", explica Anita Fung.

Fonte: Valor