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Apesar da crise, brasileiros continuam imigrando para a Europa

A crise econômica que atinge a Europa, em especial os países periféricos, parece não ser motivo para que os brasileiros deixem de imigrar ao Velho Mundo. A comunidade brasileira em Portugal, por exemplo, cresceu ainda mais no último ano e já representa 25% da população estrangeira do país, com 116.222 mil imigrantes legais (ante 106.961 em 2008).

Mas a situação dos brasileiros em terras lusitanas piorou em igual proporção. Se aumenta a cada dia o número de imigrantes legais, também crescem as recusas de entrada, os processos administrativos de expulsão, as expulsões efetivas, as notificações de abandono voluntário, os excessos de permanência sem visto, e a quantidade de imigrantes em situações de ilegalidade. O brasileiro é primeiro em todas essas infrações. No último ano, também, cerca de 40% das vítimas de tráfico de pessoas no país foram mulheres de nacionalidade brasileira.

O relatório anual do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF), divulgado neste mês, aponta que em 2009 foram expulsos dois estrangeiros por dia e notificados outros 15 para abandonar o país voluntariamente, muitos dos quais brasileiros.

Os brasileiros são os primeiros em quase todos os índices de imigração. Um dos mais notórios é o das recusas de entrada no país. Das 2.564 efetuadas em 2009, 1.668 foram a cidadãos brasileiros, na sua maioria por "ausência de motivos que justifiquem a entrada".

O "Relatório de Imigração, Fronteiras e Asilo 2009" (Rifa 2009) do SEF afirma que esse forte e contínuo crescimento da comunidade brasileira é um fenômeno que ocorre desde o início do século, mas que tem algumas nuanças e é contrário ao de outras nacionalidades que tradicionalmente migraram ao país, que têm decrescido em número. Em 2009, foram emitidos 61.445 títulos de residência (15% menos que em 2008), dos quais 39% foram para cidadãos brasileiros.

Entretanto, o número de brasileiros a viver irregularmente no país acompanha o crescimento. Nas ações de fiscalização executadas pelo SEF foram detectados em situação ilegal 3.309 estrangeiros, dos quais 2.035 eram brasileiros (61,5% do total). Foram abordados mais de 15 mil brasileiros, e mais de 13% estavam ilegais.

Segundo o Rifa 2009, 1.094 brasileiros (de um total de 2.476) foram alvo de processos administrativos de expulsão e foram expulsos 423 imigrantes, dos quais 350 eram de origem brasileira. Foram registradas 6.928 notificações para abandono voluntário do país, com os brasileiros respondendo por 57% delas (4.013).

Preconceito

Os números apontados pelo SEF traduzem e refletem os motivos pelos quais os brasileiros acabam sendo malvistos em Portugal. Não são raros os relatos de preconceito que eles dizem sofrer por parte dos portugueses.
E a mídia portuguesa parece reforçar as diferenças e incitar esse preconceito. Na edição de 11 de agosto da revista portuguesa "Focus", o tema de capa era: "O segredo da mulher brasileira – eles amam-na; elas odeiam-na!". A capa trazia uma foto do traseiro de uma mulher sensual vestindo um biquíni com as cores do Brasil. Segundo a revista, as mulheres brasileiras têm "dez mandamentos para seduzir os homens portugueses".

As jornalistas Manuella de Almeida Lopes e Paula Maria Simões tentam explicar por que as brasileiras são adoradas pelos homens e odiadas pelas portuguesas: "O fato é que em Portugal as brasileiras fazem sucesso e são, entre todas as estrangeiras, as que mais casam com portugueses! Qual o seu segredo?" O que se responde mais tarde: "A alegria de viver, a expressividade e o otimismo tornam a mulher brasileira realmente especial".

O número de casamentos entre imigrantes brasileiras e homens portugueses tem aumentado nos últimos anos. Só em 2009 foram 2.216. Mas também aumentou o número de imigrantes brasileiros no país. E, segundo o Rifa 2009, o sexo masculino predomina em todas as comunidades imigrantes residentes em Portugal. No caso brasileiro é o contrário – 63.966 são mulheres e 51.916, homens.

A reportagem da "Focus" descreve casos de sucesso, tenta explicar o porquê do estereótipo que a mulher brasileira tem em terras lusitanas e fala de preconceito, mas ao mesmo tempo ironiza essas mulheres em um infográfico sobre o crescimento das brasileiras intitulado "para os lados e para cima". Os dados não falam do aumento dessa fatia da população, mas, sim, fazem referência às medidas do corpo: "Os aumentos médios entre 1982 e 2006 foram: peso, 6 quilos; altura, 3 centímetros; quadril, 4 centímetros; busto, 3 centímetros; cintura, 9 centímetros".

Essa questão não é nova. Em um estudo apresentado em julho de 2007 pelo Alto Comissariado para a Imigração e Diálogo Intercultural (ACIDI), intitulado "Imigração Brasileira em Portugal", o seu coordenador, professor Jorge Malheiros, revelou que 45,3% dos 400 brasileiros entrevistados consideram ter visto "bastantes" casos de discriminação da parte dos portugueses em relação aos brasileiros.

Malheiros afirma que a mídia parece dar atenção redobrada aos casos de prostituição que envolvem brasileiras, verificando-se que as imagens do Carnaval do Rio e das novelas reproduzem o quadro das "sensuais mulheres brasileiras".

Para Malheiros, investigador do Centro de Estudos Geográficos da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, por diversos fatores, entre eles os casamentos por conveniência realizados por brasileiras para obter a residência no país ou mesmo por "movimentos sociais informais que tendem a responsabilizar as mulheres brasileiras pelas mudanças sociais que estão a ocorrer nas famílias portuguesas", acaba por existir "uma espécie de imaginário nacional que associa as mulheres brasileiras a estereótipos como "exuberante", "sensual" ou "oferecida".

O estereótipo "tem um efeito negativo sobre todas as imigrantes brasileiras, que frequentemente têm de lidar com alguma hostilidade, quer por parte das mulheres portuguesas, quer por parte de outras mulheres brasileiras", afirma Malheiros. Além disso, o comportamento dos homens portugueses perante as mulheres brasileiras é frequentemente marcado por atitudes que, explícita ou implicitamente, podem considerar-se assédio sexual".

Fonte: Fernando Moura, para o Valor, de Lisboa