Paul Krugman: A magia dos estrangeiros e a austeridade fiscal
Lembram-se do debate envolvendo a privatização da Previdência Social? Durante algum tempo, toda a direita viu-se apaixonada pelo Chile – maravilhoso país dono de um sistema de aposentadoria perfeito, prova cabal de que a previdência privada era o rumo certo a ser seguido.
Paul Krugman*
Publicado 17/06/2010 17:05
Então alguns começaram a analisar a realidade chilena, descobrindo que o sistema apresentava grandes problemas (entre eles um altíssimo custo administrativo), e também que os chilenos na verdade o detestavam.
A causa do momento é a austeridade fiscal – e chegam aos nossos ouvidos repetidos exemplos de países que vivenciaram um período de prosperidade depois de promoverem um aperto em sua política fiscal, o que supostamente demonstraria que a austeridade é boa, e não má, para a criação de empregos. Primeiro falou-se no Canadá dos anos 1990, cuja verdadeira história é bem diferente da contada. Agora fala-se na Irlanda dos anos 1980.
Bem, é hora de pesquisar um pouco. Quem diria: os fatos históricos em nada condizem com a versão que chega até nós. De fato, a Irlanda passou por um período de austeridade fiscal – mas o país também foi beneficiado pela desvalorização e o boom inflacionário na Grã-Bretanha.
Ah, e os juros irlandeses apresentaram uma queda aguda, o que só foi possível porque estavam muito altos para começo de conversa; não se trata de um precedente válido para os Estados Unidos, com juros baixíssimos.
Assim sendo, é de fato possível incentivar a economia por meio da austeridade fiscal, desde que haja também uma desvalorização da moeda e uma queda acentuada nos juros; da mesma maneira, feitiços darão cabo de um rebanho de ovelhas, desde que acompanhados por uma dose suficiente de arsênico.
*Economista estadunidense, articulista do New York Times, artigo traduzido e reproduzido pelo jornal "O Estado de São Paulo"