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Antonio Neto, presidente da CGTB: dogma "jurássico"

Nem bem o Brasil começou a se recuperar da convalescência causada pelos reflexos da crise econômica mundial, apresentando índices positivos de crescimento e geração de empregos para que os profetas do apocalipse inflacionário começassem a tocar as trombetas do aumento dos juros.

Antonio Neto (*)

No vale tudo financista, qualquer número, qualquer tendência – por mais absurda que seja -, qualquer projeção ou movimentação dos “mercados” são utilizados para justificar e convencer a sociedade de que não há outro caminho para garantir um desenvolvimento “sustentável” que não o elevar a taxa Selic.

Contudo, ao mesmo tempo em que temos consciência de que existe outro caminho para a política monetária, sabemos que muitos indicadores econômicos são apresentados de forma esfacelada, distantes de suas reais causas e com seus efeitos potencializados para sustentar uma tese que é refutada por qualquer integrante do setor produtivo, seja ele laboral ou empresarial, mas que garante uma rentabilidade astronômica para os elementos que se locupletam com o resultado do esforço da sociedade brasileira.

O índice inflacionário, por exemplo, é o principal deles. Projeta-se uma situação sazonal ou atípica que provocou a elevação do índice para aterrorizar a sociedade. Poucos economistas lembram que grande parte da inflação registrada no último período teve origem nas chuvas que assolaram o país no início do ano, fato que causou o aumento de alguns produtos alimentícios. O reajuste das mensalidades escolares, o aumento das passagens de ônibus em São Paulo, o aumento absurdo do minério de ferro praticado pela Vale do Rio Doce ou a elevação dos commodities no mercado internacional são ignorados de forma abominável e incorporados ascendentemente nas projeções inflacionárias.

A mais recente celeuma criada para justificar o aumento dos juros foi o crescimento do PIB no primeiro trimestre deste ano. Excepcionais 9% de ampliação sobre o mesmo período de 2009. Vejam que até um resultado que deveria ser motivo de comemoração por todos nós passa a ser tratado pelos absolutistas do mercado financeiro como um problema sério para o país. “Crescimento em patamares asiáticos”, dizem alguns. “O Brasil não está preparado para isso, dizem outros”. A solução é obviamente resumida no aumento dos juros.

No entanto, muitos fazem vista grossa para o fato de que o crescimento obtido no primeiro trimestre se deu sobre um crescimento negativo de 2,1% em igual período do ano passado, algo que não minimiza o fator positivo desta recuperação, como já destacamos, pelo contrário. Mas, impressionantemente, até mesmo a capacidade de recuperação do país e o sucesso das políticas adotadas pelo conjunto do governo são usados para amedrontar a sociedade, estabelecendo um dogma que o Brasil é incapaz de crescer.

Precisamos quebrar paradigmas, romper com as amarras de uma ideologia mercadológica que já ruiu e mostrou seus efeitos negativos. Ora, por que o Brasil não pode crescer a 6, 7 ou 9% ao ano? Somos menos capazes que os asiáticos? Não existe outro caminho para sustentar este crescimento? É preciso abortar o nosso desenvolvimento? Temos que manter este impacto deletério sobre a economia denominado juro alto?

Estou convencido que não. É possível crescer, gerar empregos e ter inflação baixa com juros republicanos. Para tanto, é preciso desmistificar algumas coisas, ou melhor, analisar os dados com base na realidade. Além da questão inflacionária sazonal e do crescimento não expansivo, existem outros fatores que precisam ser expostos com franqueza.

Um deles diz respeito ao desaquecimento que alguns setores irão sofrer naturalmente com o corte dos incentivos fiscais mantidos até pouco tempo. O maior exemplo disso é o setor automotivo, que já deu sinais claros de que voltará a taxas de crescimento não anabolizadas. Temos ainda a crise que esta sendo gerada na Europa e que naturalmente causará um baque nos mercados internacionais.

Outro ponto importante neste jogo de números é a capacidade de ampliação dos investimentos. A teoria dos juros altos está concentrada na necessidade unilateral de diminuir a demanda tão logo se identifique qualquer susto inflacionário. Contudo, o esforço deve ser no sentido inverso, ou seja, aumentar a oferta. E isso só será feito com o aumento da capacidade produtiva do país, que, por sua vez, só é alcançado com aumento dos investimentos.

Aumentar os juros representa a mitigação da capacidade do país aumentar a Formação Bruta de Capital Fixo com relação ao PIB, que, embora crescente, ainda está muito abaixo do necessário para garantir o desenvolvimento sustentável. Não foram poucos os economistas que apontaram a necessidade do país alcançar o índice de 25% do PIB neste quesito. Conseguimos ampliá-lo de 16 para 18%. Mas isso é insuficiente.

Nós já conseguimos, nos últimos anos, quebrar uma série de paradigmas que limitam o crescimento do país. Diziam que o aumento do salário mínimo quebraria a Previdência e as prefeituras, que os bancos públicos eram ineficientes, que o Estado não era capaz de impulsionar o crescimento, entre tantos outros. Agora, precisamos romper com as amarras do monetarismo, enterrar os dogmas que tentam dizer que não podemos ter juro real menor que 4%, que a meta de inflação deve ser engessada ou que o país não pode crescer de forma plena, sem medo de ser feliz.

(*) Presidente da Central Geral dos Trabalhadores do Brasil (CGTB) e do SINDPD-SP.