Publicado 02/06/2010 08:58 | Editado 04/03/2020 16:33
Todo grande homem necessariamente foi um grande sábio. Nenhum grande homem sendo sábio deixou de expressar sua visão holística em favor de um mundo novo e de uma vida digna, ética, confortável e harmoniosa para todos na sua mais profunda simetria respeitosa com a natureza. Porque esta era a antevisão inerente aos homens que viveram além do seu tempo. Razão de serem grandes e te terem ficado para sempre na história da humanidade.
Hoje vivemos tempos conflitantes de uma civilização mergulhada no caos, ajudada por uma crise moral e ecológica em escala planetária sem nenhum precedente na história. Temos por tudo isso, que reverenciar figuras humanísticas e proféticas que de alguma maneira especial devotaram suas vidas pelo progresso e a felicidade coletiva do mundo, dentre as quais não somente do ponto de vista ambiental podemos destacar Aristóteles, São Francisco de Assis e, por que não dizer, o padre Cícero Romão Batista – o santo popular do Nordeste?
Assim como São Francisco, considerado o Santo da natureza, Padre Cícero acaba de ser aclamado com o título de Padroeiro da Natureza. O título foi dado recentemente pelos ecologistas da mundialmente conhecida ONG ambiental Greenpeace. Um belo reconhecimento pelas ações educativas de caráter ecológico praticadas pelo padre junto aos seus romeiros e devotos. Numa época em que as preocupações acerca do meio ambiente e da biodiversidade ainda não existiam sequer nos meio acadêmicos e científicos. Os chamados preceitos ecológicos do meu “padim Ciço” que hoje vão ao encontro de toda uma crise mundial por que passa os ecossistemas terrestres quando à natureza encontra-se a beira de um colapso total, em face da voracidade com que a espécie humana vez consumindo e devastando os recursos naturais em todo o mundo. Neste cenário dantesco, diríamos que os preceitos do Padre Cícero evidenciam ainda mais sua cosmovisão quase profética de um sábio.
Padre Cícero foi, no sentido lídimo do termo, um ardoroso defensor da nossa Caatinga, um bioma só existente no Nordeste do Brasil. Falando de modo simples a língua do seu povo, o padre do Juazeiro do Norte dentre outras coisas dava conselhos importantes de como conviver com a seca e, em paz e harmonia com a natureza. De uma planta endêmica da caatinga – a maniçoba – chegou inclusive a produzir e exportar a matéria-prima da borracha. Por tudo que fez, pensou e agiu, Padre Cícero: o cearense do século, foi em suma, um homem póstumo como bem dissera outro dia Nietzsche.
Com os seus preceitos ele defendia:
Não derrube o mato, nem mesmo um só pé de pau.
Não toque fogo no roçado nem na Caatinga.
Não cace e deixe os bichos viverem, eles também são filhos de Deus.
Não crie o boi nem o bode soltos, faça cercado e deixe o pasto descansar para se refazer.
Não plante serra acima, nem faça roçado em ladeira muito em pé. Deixe o mato protegendo a terra para que a água não arraste e não se perca suas riquezas.
Faça uma cisterna no oitão de sua casa para guardar a água das chuvas.
Represe os riachos de cem em cem metros, ainda que seja com pedras soltas.
Plante cada dia pelos menos um pé de algaroba, de caju, de sabiá ou outra árvore qualquer. Até que o sertão todo seja uma mata só.
Aprenda a tirar proveito das plantas da caatinga, como a maniçoba, a favela e a jurema. Elas podem ajudar você a conviver com a seca.
Se o sertanejo obedecer a estes preceitos, a seca vai aos poucos se acabando, o gado melhorando e o povo terá sempre o que comer.
Mas, se o povo não obedecer, dentro de pouco tempo o sertão todo vai virar um deserto só.
José Cícero é Professor, pesquisador e poeta
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