Capistrano: A Cruzada da Esperança, uma miscelânea ideológica
Foi uma verdadeira miscelânea ideológica a coligação partidária que compôs a Cruzada da Esperança. Não foi fácil juntar partidos antagônicos dentro de uma mesma coligação, claro que tinha figuras de grande habilidade política interessadas na união de diversas tendências até aquele momento inimigas, mas, naquela eleição tinham objetivos comuns mais importantes do que o embate ideológico.
Publicado 22/02/2010 13:35 | Editado 04/03/2020 17:08
No caso das forças de esquerda, a campanha de Lott e Jango e a eleição para prefeito da capital do deputado Djalma Maranhão e do seu vice Luiz Gonzaga, era mais importante do que qualquer outra coisa. Para os aluizistas, a eleição de Aluízio Alves para o governo do estado era o objetivo maior.
Moacir de Góes, no livro, 2 livros de Djalma Maranhão no exílio, página 24, escreve: “A aproximação de Aluízio Alves-Djalma Maranhão se faz com dificuldades. Mesmo com o apoio da aliança PSD-PTB ao nome de AA, em plano nacional, ele e Maranhão ocupam posições antagônicas: o candidato a governador é udenista ortodoxo que, mesmo aproximado de Magalhães Pinto, assume o discurso lacerdista de Jânio e é figura de proa da Tribuna da Imprensa, que prega o golpe; Maranhão integra a Frente Parlamentar Nacionalista, ponta de lança da esquerda brasileira e identifica-se com um discurso radical de mudanças políticas. As dificuldades estão no passado dos dois políticos: o discurso modernizante de Aluízio incorpora o stablishment, desde que ele seja renovado pelo desenvolvimento; o discurso de Maranhão prega um governo democrático e popular, anti-imperialista e anti-latifúndio. O deslocamento de Maranhão para a Cruzada da Esperança se faz lento e num processo de engenharia política que não perde de vista as questões nacionais e internacionais. Neste processo, Maranhão não perde sua identidade política”.
Foi dentro desse prisma que foi costurado a ampla aliança que ficou conhecida como Cruzada da Esperança. O interessante nisso tudo é que, até aquele momento, os comunistas e cafeístas (seguidores de Café Filho) tinham afinidades com a UDN de Dinarte, consequencia da luta dessas forças contra a ditadura Vargas. Ditadura que durou de 1937 a 1945. Aqui no estado os arquiinimigos dos comunistas e dos cafeístas eram as lideranças do PSD, PTB e PRP. Theodorico e Monsenhor Walfredo do PSD, Joca Mota, Clovis Mota e Álvaro Mota do PTB e Dr. Travassos Sarinho (integralista) do PRP, que faziam as suas campanhas políticas com um discurso anticomunista.
A UDN era essencialmente anti-Getúlio, não era anticomunista, havia uma boa convivência entre as esquerdas e Dinarte, uma prova disso é a nomeação, em 1956, de Maranhão prefeito de Natal (até aquela data o prefeito da capital era nomeado pelo governador) motivo de alguns nomes da esquerda ter ficado com Dinarte, embora defendendo a candidatura de Maranhão para prefeito, não aceitava os nomes de Aluízio e de Lott, preferiram ficar com Djalma Marinho e Jânio. O próprio Luiz Maranhão relutou em aceitar a chapa da Cruzada da Esperança. O jornalista Leonardo Bezerra, importante nome do PCB, foi um dos que divergiu da posição do Partido, preferindo apoiar os candidatos de Dinarte para governo do estado e para Presidência da República.
Alguns comunistas argumentavam que apesar de Lott ser nacionalista, era anticomunista, não admitia reatar relações diplomáticas com a URSS, enquanto Jânio Quadros elogiava a Revolução Cubana e tinha um discurso terceiro-mundista, bandeira das esquerdas e dos países subdesenvolvidos, da época, além de apontar para o reatamento diplomático com a URSS e com a China. Atitude que Lott não tinha.
Foi preciso muita habilidade de Aluízio, interessado na formação de uma ampla aliança visando o apoio de setores progressistas ao seu nome. Não foi fácil juntar forças politicamente antagônicas. Mas juntou a dissidência da UDN, o PCB, o PTB, o PRP, o PSD, o PST na aliança denominada de Cruzada da Esperança.
Aluízio Alves, um udenista histórico, respeitado no diretório nacional, foi secretário-geral da legenda, articulador da candidatura de Jânio Quadros, era aliado de Carlos Lacerda – um inimigo de Jango e do getulismo. A soma disso tudo dificultava a formatização da aliança, mas o interesse maior prevaleceu. A Cruzada da Esperança foi concretizada com os nomes de Aluízio/Walfredo para governador e vice-governador; Djalma Maranhão/Luiz Gonzaga para prefeito e vice-prefeito de Natal.
A professora Maria da Conceição Pinto de Góes, descreve no seu livro, “A aposta de Luiz Ignácio Maranhão Filho: cristãos e comunistas na construção da utopia”, editora Revan, esse fato, dizendo: “O rompimento político entre Aluízio e Dinarte não tinha divergências ideológicas de fundo. Houvera a pretensão do primeiro de ser candidato ao governo estadual na sucessão de Dinarte Mariz, rejeitado por este, que preferiu apoiar o deputado federal Djalma Marinho. Aluízio Alves cavou então uma dissidência na UDN, conseguindo eleger-se graças a uma aliança com partidos progressistas e opositores de Dinarte, em uma frente chamada Cruzada da Esperança”.
Foi uma aliança contextual, mas naquele momento muito importante para o Rio Grande do Norte e para as forças de esquerda.
Portanto, concretizada a aliança, que ia da esquerda à direita, dos comunistas aos integralistas, a campanha ganhou as ruas de Natal e das cidades de todo o Rio Grande do Norte. Foi uma longa e inovadora campanha. Aluízio Alves empolgava com os seus discursos e com uma modernizadora plataforma de governo. Djalma Maranhão firmava a sua liderança na capital do estado com a criação dos Comitês Nacionalistas e um programa de governo progressista, voltado para as populações mais carentes da capital.
Eu, jovem militante comunista, acompanhei de perto todo o desenrolar dessa campanha, empolgado com os acontecimentos e com a possibilidade de vitória.
Bibliografia consultada:
– O que não esqueci.
Aluízio Alves – Editora Leo Christiano
– A aposta de Luiz Ignácio Maranhão Filho: cristãos e comunistas na construção da utopia.
Maria da Conceição Pinto de Góes – Editora Revan
– 2 Livros de Djalma Maranhão no exílio.
Moacir de Góes – Editora Artprint
– Aluízio Alves: Populismo e Modernização no Rio Grande do Norte.
Sérgio Luiz Bezerra Trindade – Ed. Sebo Vermelho.