O que está por trás do encontro Obama-dalai lama?
A despeito da firme e repetida oposição da China, o presidente dos Estados Unidos Barack Obama encontrou-se nesta quinta-feira (18) com o dalai lama.
Publicado 18/02/2010 20:22
Obama prometeu construir uma "relação positiva, cooperativa e abrangente com a China no século 21", durante sua visita ao país asiático em novembro, mas essa promessa evaporou apenas três meses depois.
Analistas internacionais sustentam que, durante o encontro, Obama marcou posição em relação a seus objetivos, seja internos ou externos, enquanto o dalai lama procurava dar sequencia à sua ilusória luta separatista disfarçada de questão religiosa.
Mas, quais foram os motivos reais do encontro entre as duas personalidades nesta quinta-feira?
Em 1991, o presidente dos Estados Unidos George H. W. Bush tornou-se o primeiro presidente a reunir-se com o dalai lama. Aconteceram desde então 11 encontros entre presidentes americanos e o dalai lama até Obama ser empossado.
Obama prometeu fazer grandes mudanças nos Estados Unidos durante sua campanha, mas isso não ocorre em relação a reunir-se com o dalai lama. Por que?
A revista mensal japonesa Choice foi direto ao ponto quando disse em um artigo que o assunto Tibete era uma carta na manga de Obama, na tentativa de afastar a atenção da mídia dos problemas econômicos de sua administração, tanto na política interna quanto na externa.
Analistas também avaliam o encontro como uma "trégua" para Obama, já que o assunto desviou a atenção dos problemas que a administração enfrentará com o recrudescimento da crise econômica e uma difícil campanha eleitoral que Obama terá pela frente, na eleição legislativa de metade do mandato.
"Dentre outras questões, Obama está sob considerável pressão, inclusive de correligionários, em relação a questões que vão desde a crise econômica ao Tibete", diz Ted Carpenter, vice-presidente de Estudos de Política Externa do Cato Institute, uma instituição neoliberal de Washington. "Esse encontro serviu para Obama retomar o apoio daqueles que valorizam o dalai lama e criticam a China", agregou.
Para Martin Jacques, da Escola de Economia de Londres, Obama demonstrou preocupação com o declínio da influência americana no exterior e com a cada vez maior presença chinesa na arena internacional.
"A crise financeira mudou o equilíbrio de poder. Enquanto a força dos EUA está em declínio, a da China está em crescimento", apontou.
Já Pierre Picquart, sinólogo da Universidade de Paris, explica que encontrar figuras políticas como o dalai lama faz com que os Estados Unidos levantem uma barreira simbólica ao desenvolvimento chinês, ao mesmo tempo que procura assegurar a dominação global que exerce sobre o planeta.
Em todos os momentos da história recente o dalai lama procurou reunir-se com líderes politicos ocidentais, principalmente presidentes americanos. Para tentar adiar o fim de sua carreira política, acabou usando o disfarce da religião, para tentar conquistar corações e mentes no Ocidente.
Para Ted Carpenter, "a campanha do dalai lama no Ocidente parece destinada a gerar pressão diplomática internacional para conquistar, no mínimo, uma autonomia política do Tibete maior que a já existente, ou até mesmo uma arbitrária separação da China".
Pierre Picquart considera que os ocidentais parecem às vezes tão cativados pelos discursos de "paz e liberdade" do dalai lama, que não percebem as reais intenções que esse discurso omite.
"Empurrados pela pressa em agradar os eleitores, os líderes ocidentais cometem, cada vez mais, decisões erradas ao promoverem encontros com o dalai lama", afirma Picquart.
Esperto, o dalai lama fez vários discursos politicos ao encontrar dirigentes ocidentais, ao mesmo tempo que dizia ser apenas uma figura religiosa.
Em 1992, por exemplo, enviou uma carta a Bill Clinton, recém empossado presidente dos EUA, tentando forçá-lo abertamente a aderir à causa dos que defendiam "a independência do Tibete".
Desde os atentados terroristas de 14 de março de 2008 em Lhasa, o dalai lama procurou visitar o maior número possível de países, para conquistar o apoio de mais políticos ocidentais à causa separatista.
Ingo Nentwig, renomado etnologista alemão, nota que a chamada comunidade internacional está se tornando cada vez mais cética em relação às intenções políticas do dalai lama, ao mesmo tempo que as pessoas começaram a conhecer melhor a verdade sobre as questões relacionadas com o Tibete.
"Isso é como uma propaganda de um produto ruim. O marketing consegue aumentar as vendas do produto por uns tempos, mas os consumidores acabam descobrindo que compraram um produto ruim e viram as costas para ele", exemplifica.
Obama não é o primeiro presidente a encontrar o dalai lama. Três outros já se reuniram com o separatista chinês desde 1991.
Isso acontece porque a questão do Tibete é ainda uma carta na manga de Washington, cujos líderes ainda sofrem a influência da mentalidade da Guerra Fria quando tratam qualquer questão com a China. Os EUA também reservam ainda outras cartas na manga a esse respeito.
Observadores internacionais afirmam que enquanto essa mentalidade de Guerra Fria permanecer intocada, os líderes dos Estados Unidos se sentirão livres para usar essas cartas quantas vezes quiserem e desejarem.
"Esses personagens, como o dalai lama, não teriam sido conhecidos ou bem recebidos no Ocidente caso a mídia não tivesse incensado essas figuras como 'mártires' ou 'vítimas' ", acredita Ingo Nentwig.
"Algumas forças políticas no Ocidente tendem a ver a China sob a ótica colonialista, e relutam para encarar a realidade da China como um estado soberano, que não aceita ser conduzido pelo Ocidente em nenhuma questão", agrega Nentwig.
Prometer a mudança angariou um massivo apoio a Obama durante sua campanha eleitoral. Obama tem agora a oportunidade de fazer uma mudança que trará benefícios não só a si e a seu partido, mas também à China, aos Estados Unidos e ao resto do mundo, que é descartar a mentalidade de Guerra Fria e adotar uma nova e construtiva forma de pensar as relações entre os Estados Unidos e a China.
A partir do momento que os dois países desenharam as linhas mestres de cooperação e parceria na Declaração Conjunta de Pequim, o que o presidente Obama precisa fazer hoje é preencher essas linhas mestres com ações concretas.
Fonte: China Daily