Luis Nassif: A crise fiscal da União Europeia
A crise da União Europeia demonstra um dos problemas sérios da constituições de blocos econômicos, com países heterogêneos. A incorporação dos países do Leste Europeu acentuou as diferenças. A crise mundial ajudou a expor essas dificuldades.
Por Luis Nassif, no Último Segundo
Publicado 09/02/2010 13:08
Na sua constituição, a União Europeia definiu um conjunto de princípios a serem aplicados a todos os países. O primeiro, o do equilíbrio fiscal homogêneo, com todos os países sujeitando-se a limites máximos de déficit fiscal.
O segundo, o apoio às regiões menos desenvolvidas, visando criar um cenário homogêneo para investimentos. Caso contrário, a própria concentração do desenvolvimento acentuaria as desigualdades, criando desequilíbrios posteriores entre os países.
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A heterogeneidade gerou dois movimentos conflitantes.
Na fase da abundância de capitais, houve um aporte maciço nos novos emergentes europeus, especialmente em setores ligados às novas classes sociais, como habitação.
Faz parte da lógica do capital privilegiar mercados em crescimento. E, por definição, países em desenvolvimento se desenvolvem mais do que países avançados e com crescimento já estabilizado.
Esse mesmo movimento se deu também no financiamento dos governos nacionais. Por definição, os emergentes não tinham estrutura forte de financiamento interno. As regras fiscais da União Europeia – obrigando todos os países membros a convergirem para metas idênticas de déficit público – criou uma falsa ideia de segurança nos grandes bancos internacionais. Seguiu-se uma enorme onda de empréstimos a governos nacionais.
Ao mesmo tempo, a integração à Comunidade Europeia obrigou os países a abdicarem de suas próprias políticas cambiais. Todos ficaram debaixo do euro.
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Nesse quadro, todo o crescimento nacional acabou depositado no consumo das famílias, sustentado por oferta abundante de crédito. Ora, a crise global explodiu justamente no mercado de crédito. Interrompidas as torneiras, essas economias estancaram subitamente.
Se tivessem flexibilidade cambial, providenciariam uma desvalorização de suas moedas e iriam buscar no mercado externo o dinamismo perdido no mercado interno. Mas não tinham.
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O resultado foi uma queda substancial no crescimento desses países e a consequente queda da arrecadação fiscal. Caíram em recessão profunda e em déficits fiscais crescentes.
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O resultado é esse. A dívida pública da Grécia deve atingir 113,4% do PIB em 2010 e 120,8% em 2011. Foi colocada sob supervisão do Banco Central Europeu. Com a crise, os títulos gregos passaram a pagar mais 3% de juros ao ano a mais do que os alemães.
Em Portugal, o déficit público deve bater em 9,3% do PIB em 2009 e sua dívida chegará a 78% do PIB, depois de uma queda de 13,2% nas receitas públicas. Em Janeiro, a Moody’s, agência de risco, alertou para o risco de “morte lenta” da economia portuguesa.
Considerado país desenvolvido, a Espanha não escapou do naufrágio. Sua dívida pública saiu de 36,2% do PIB em 2008 para 60% em 2010. O déficit público está estimado em 11,4% em 2009. E o PIB vem caindo há sete trimestres consecutivos.
Enfim, depois do dólar, chegou a hora do euro ser colocado à prova.