George Câmara: Contradições de uma gestão Macunaíma (I)
Estamos na Câmara Municipal de Natal na manhã do dia 02 de fevereiro de 2010, na primeira sessão ordinária, retomando os trabalhos legislativos do ano que se inicia. Como de praxe, é o momento reservado exclusivamente à leitura da Mensagem Anual elaborada pelo Poder Executivo, apresentando ao Parlamento Municipal e à sociedade os seus planos, projetos, programas e ações.
Publicado 04/02/2010 15:58 | Editado 04/03/2020 17:08
Por se tratar do segundo ano da administração em curso em Natal, é de se esperar não apenas a apresentação de uma carta de intenções, mas a explicitação daquilo que de concreto o poder público tem a apresentar para fazer frente aos graves problemas enfrentados pela cidade e seu povo. Precedido, evidentemente, por um rápido e objetivo balanço do que foi realizado no ano anterior, até mesmo como um balizamento para a continuidade de qualquer administração municipal.
É nesse momento que a população vai identificando o perfil da gestão pública, do ponto de vista político. Que princípios e diretrizes orientam a administração municipal, suas marcas, potencialidades e limitações. Por conseguinte, que compromissos ganham maior relevo na condução do governo. Pelo perfil da gestão vai se revelando também e, principalmente, o caráter das forças políticas que lhe dão sustentação. Se comprometidas com o interesse público ou com aquilo que beneficia apenas a alguns setores.
Sob o ponto de vista técnico, tais elementos revelam ainda o preparo e/ou o despreparo daquela gestão para enfrentar os problemas fundamentais que agravam o ordenamento da cidade e afligem a vida das pessoas. É quando o palanque eleitoral cede lugar à vida concreta e as maquiagens se curvam diante da crua realidade. Como enfrentar a crise na saúde, na educação e nos demais serviços? Como estruturar a cidade? O cidadão comum vai descobrindo que foi ludibriado por um discurso mistificador e pelos truques de mídia, a confundir multidões e enganar os mais ingênuos.
Após a Prefeita Micarla de Sousa, do Partido Verde, apresentar uma peça publicitária dividida entre um filme de 9 minutos e uma encadernação ilustrada com fotos coloridas, chega-se à apresentação do texto oficial, em forma de leitura de telejornal, com direito a impostação de voz e demais artifícios técnicos a esconder a pobreza de conteúdo.
Ao tratar da perda de receita decorrente dos efeitos da crise econômica mundial, uma manobra grosseira que enganou até alguns dos vereadores mais experientes da base governista: ao informar sobre a perda de receita na rubrica de algumas fontes da ordem de 23%, secundarizou o incremento que se deu na receita de outras fontes. Tal encontro de contas reduziu a perda para algo em torno de 5%, o que se revela apenas nas entrelinhas, para alguns.
Em plena fase de realização da etapa municipal da 4ª Conferência Nacional das Cidades, jornada que inaugura um novo tipo de gestão para as cidades e municípios de nosso país, o conteúdo da mensagem apresentada ignora por completo os desafios da gestão moderna: planejada, integrada e participativa. Nada em relação ao médio e longo prazo, negando qualquer visão estratégica de futuro. Nenhuma linha em matéria de integração. Nem entre as secretarias municipais e muito menos em relação ao grande desafio da pactuação metropolitana.
Sendo Natal uma cidade pólo, com vocação para liderança natural na desafiadora gestão integrada na Região Metropolitana, prevaleceu a mediocridade do silêncio absoluto na matéria. Infelizmente.
Como na obra de Mário de Andrade, a gestão municipal em Natal se equipara a Macunaíma, o herói desprovido de caráter. Mas a vida é implacável: com o rótulo do PV e o conteúdo do DEM, não se consegue enganar muito tempo.