Luis Carlos Barreto, cineasta cearense, anuncia aposentadoria

São 81 anos de vida, 47 de carreira e 85 filmes no currículo. Com a estreia de Lula, o Filho do Brasil, o cearense Luiz Carlos Barreto anuncia sua aposentadoria das produções cinematográficas. Em entrevista ao jornal O Povo, o cineasta fala da vida no Ceará, cinema, carreira, Lula e novos projetos. Leia o bate-papo na integra.

Luis Carlos Barreto

"Vim do Norte
O quengo em brasa
Fogo e sonho do sertão
E entrei na Guanabara
Com tremor e emoção
Era um mundo todo novo
Diferente meu irmão
Mas o Rio abriu meu fole
E me apertou em suas mãos"
Baião de São Sebastião, Humberto Teixeira

O telefone não para de tocar. E, cada vez que ele toca, Luiz Gonzaga canta um pedacinho do Baião de São Sebastião para Luiz Carlos Barreto. O produtor de cinema internacionalmente premiado é radicado no Rio de Janeiro, mas não esquece a origem nordestina. Cearense de Sobral, Barretão, como é chamado no meio, veio para Fortaleza com meses de idade, e foi aqui onde ele passou boa parte de sua juventude. Da Capital foi para o Rio, depois para a Europa, depois voltou para o Rio e não saiu mais. Esteve no olho do furacão do Cinema Novo, fundou sua produtora e, com sua assinatura, já tem 85 filmes no currículo.

Aos 81 anos, Barretão fez do cinema o seu lar. A esposa, Lucy, é uma parceira de toda a vida nas produções. Dos filhos, só tem do que se orgulhar. Paula é formada em Comunicação Social, interessou-se em seguir a profissão do pai e se tornou produtora. Bruno e Fábio são diretores, aprenderam em casa, com os grandes nomes do Cinema Novo. O primeiro dirigiu, entre outros sucessos de público e crítica, Dona Flor e Seus Dois Maridos (a maior bilheteria da história do Brasil) e O Que é Isso, Companheiro?, que concorreu ao Oscar de melhor filme estrangeiro. O segundo também já foi indicado ao prêmio máximo da academia americana com O Quatrilho.

Na última sexta-feira, 1º, a LC Barreto, produtora da família, estreou seu mais recente longa-metragem: Lula, o Filho do Brasil. A direção é de Fábio, que, no dia 19 de dezembro último, sofreu um grave acidente de carro e se encontra hospitalizado desde então. Mesmo com a vida pessoal sacudida, Barretão conversou com O POVO por telefone. Na entrevista, ele rememora a juventude cearense, conta um pouco sobre sua trajetória e comenta o lançamento polêmico da cinebiografia do presidente Lula, enquanto reafirma sua despedida das produções cinematográficas.

O senhor nasceu em Sobral e, ainda bebê, veio para Fortaleza. Que lembranças guarda?

Cheguei em Fortaleza com três meses. Morei inicialmente em uma chácara na Parangaba, depois fomos para o Benfica, na altura da Gentilândia. Moramos na Tristão Gonçalves, quando eu estudava no Liceu. Depois fui estudar no Colégio São Luiz, aí fomos morar na Praia de Iracema, na Rua dos Tabajaras. De Fortaleza, guardo as melhores lembranças possíveis. Fortaleza, aos meus olhos é um paraíso. Até hoje. Foram os anos 1930, 1940, 1950. Os anos da Guerra: as Pirâmides da Vitória ficavam nas ruas, e as pessoas depositavam ali as suas joias, as suas panelas, doavam metais para as Forças Armadas. Era um centro de concentração de imigrantes que vinham do sertão pra ir pro Norte, pra batalha da borracha. Isso, pro meu imaginário de criança, é muito rico.

Que lugares fizeram parte da sua juventude em Fortaleza?

Com uns 10, 11 anos, eu fundei um time de futebol, o 24 de maio. Nosso centro de operação era a Praça da Bandeira, e nos reuníamos nas escadarias da Faculdade de Direito antes e depois dos jogos. Eram dois times amadores, juvenis, mas famosos em Fortaleza: o Gentilândia e o 24, que eram rivais tipo Flamengo e Vasco. Tenho lembranças do estádio Presidente Vargas O campo era de barro, e os bombeiros o aguavam antes do jogo, pra não fazer poeira. O Parque da Cidade, ou Cidade da Criança, era uma coisa muito bonita. A Praça do Ferreira, onde, ao meio-dia, convergiam todos os bondes dos diferentes bairros, e os estudantes se encontravam. A gente encontrava as meninas do colégio Imaculada Conceição, que eram as mais bonitas. Mas tinha a rivalidade dos estudantes contra os cadetes do exército que chegavam do Sul e roubavam nossas namoradas. Era uma cidade muito romântica, ensolarada. A gente tomava banho nu na Praia do Futuro, quando não existia nada.

O cinema fez parte dessa sua juventude cearense?

Eu ia muito ao Majestic. Era um cinema lindo, onde depois construíram o São Luiz, que também é lindo. O Majestic era um cinema que tinha quatro, cinco andares, com plateia embaixo, camarotes, uma torrinha. Lá passavam os filmes da época de Hollywood, e ia a estudantada toda. O que hoje chamam de interação já existia nos anos 1950: as pessoas assistiam ao filme fazendo piada, avisando coisas pros atores, “Cuidado, ele tá armado!“. Era uma sessão interativa, linda, com o cinema sempre cheio. Às sextas-feiras, tinha a Sessão Colosso, que você podia ver dois filmes pagando só uma entrada. Depois criaram o Diogo, que foi um cinemão de luxo, e aí eu já era mais adolescente. Ia pra namorar.

Foi difícil sair daqui para morar no Rio de Janeiro?

Foi dolorido sair desse ambiente. A adaptação foi muito penosa. Ia jogar pelada na praia, em frente à rua que eu morava, em Copacabana. Quando um cara fazia alguma coisa errada, eu chamava o cara de baitola, e ninguém sabia o que era. Aí começaram a me chamar de baitola. Eu ganhei esse apelido.

No Rio de Janeiro, entrou para a revista O Cruzeiro e fez carreira de fotógrafo. Como foi a experiência?

Eu me tornei repórter do jornal Democrata, que pertencia ao senador Olavo Oliveira e depois foi comprado pelo Partido Comunista. Eu continuei lá e acabei me filiando ao partido. Fiquei na Juventude Comunista e tive grandes mestres, como Aníbal Bonavides, Audálio Dantas, Raimundo Girão, que era do O POVO. Minha escola de jornalismo foi no Ceará. Tudo isso porque eu era um aluno razoável, muito bom em português, história, geografia e péssimo em todo o resto. No Rio, meu irmão tinha um amigo que era o José Medeiros, fotógrafo da O Cruzeiro. Eu fiz um curso pra escrever pra revista Cigarra, uma sucursal da O Cruzeiro, e fui contratado como repórter. No curso das coisas, o Luciano Carneiro veio pro Rio, e ele fotografava e escrevia. Aí eu também aprendi a fotografar e me tornei repórter e fotógrafo.

Como fotógrafo, o senhor foi correspondente na Europa.

Fui pra Europa em 1954. A Lucy, minha mulher, eu tava namorando desde 1951, e ela foi pra Paris estudar no conservatório. Passou o primeiro ano lá, a bolsa foi estendida. Aí eu arranjei pra ser correspondente na Europa. Aproveitei e fui fazer um curso de cinema, mas achei muito teórico. Aí parti pra prática: como repórter, tinha acesso aos cinemas, aos estúdios, via filmagens. Voltei pro Brasil já com mais credenciais e continuei na O Cruzeiro. Eu viajava muito com o Assis Chateaubriand, era um dos três fotógrafos preferidos dele, e isso também foi outra escola profissional muito importante pra mim. O Cruzeiro era uma espécie de TV Globo em papel.

E como foi que o senhor acabou enveredando para o cinema?

Eu já tinha conhecido o Glauber (Rocha) na Bahia. Quando ele veio pro Rio, ficou na minha casa e foi fazendo a minha sedução. Ele sabia que eu tava saindo do jornalismo e me indicou ao Roberto Farias pra O Assalto ao Trem Pagador. Fiz o roteiro, e, quando ele tava pronto, o Roberto foi atrás de procurar o dinheiro pra financiar o filme. O Otto Lara Rezende disse que tinha um amigo que gostava muito de cinema e que ajudaria. Diante dessas coisas, entrei no negócio do cinema. Depois o Glauber me convidou pra direção de fotografia de Terra em Transe. Aí pronto. No cinema é assim: você bota o braço, e vai o corpo todinho.

Vocês tinham noção de que estavam fazendo um cinema diferente, quando deram o pontapé inicial no Cinema Novo?

Nós tínhamos vontade de fazer filmes que contribuíssem pra mudanças na questão social e política brasileira. Depois da ditadura, isso ganhou mais corpo. Nós queríamos produzir filmes que contribuíssem pra enfraquecer a ideia do estado autoritário. A gente tinha uma consciência, mas todo mundo era muito jovem, achava que podia fazer a revolução com o cinema. Aos poucos, vimos que tem que ser pragmático pra se fazer cinema.

A turma toda do Cinema Novo se reunia na sua casa, na rua 19 de Fevereiro, em Botafogo. Como era a relação entre vocês?

A minha casa era uma espécie do sede do Cinema Novo. Eu e o Nelson (Pereira dos Santos) éramos os mais idosos da turma, tínhamos pouco mais de 30 anos. Os outros, Glauber (Rocha), Cacá (Diegues) eram pós-adolescentes, de 22, 23 anos. Como toda relação na fase jovem, a nossa era muito fraternal, grupal, amalgamada. Com a idade, as relações permanecem, mas você não tem mais aquela energia toda. Cada um atingiu mais ou menos – ou não – os seus objetivos, ou ainda estão perseguindo. A gente começou como a turma do Cinema novo, passou para grupo do Cinema Novo, até chegar a geração do Cinema Novo.

Com a sua casa sendo o quartel general do Cinema Novo, como era o cotidiano da família?

Nós morávamos numa casa antiga, em Botafogo, com árvores. Tinha uma casa principal e uma nos fundos. Na dos fundos, tinha instalada uma moviola, uma mesa de montagem de cinema. O Glauber, o Nelson Pereira dos Santos, o Ruy Guerra, o Cacá, o Jabor montavam os filmes no quintal. Os meninos, na hora que chegavam do colégio, iam pra lá, ficavam mexendo, perguntando. O veneno do cinema foi entrando ali em casa, e, evidentemente, eles foram se interessando pelo assunto. O Glauber levava muito o Bruno ao cinema, o Fábio. O vírus foi entrando, e eles foram pegando minhas máquinas fotográficas, minhas leicas, minhas rolleiflex e saíam fotografando. Depois dei uma filmadora, e eles passaram a fazer filmes de 8 mm e 16 mm. Tiveram uma formação na prática, indo às filmagens que eu produzi.

O regionalismo é uma característica bem presente nessa escola cinematográfica. Foi importante mostrar um Nordeste sem caricatura para o resto do País?

Nós mostramos, a partir de determinados filmes, o Nordeste sem enfeite, sem querer folclorizar. O Nordeste é uma matriz cultural muito forte. Agora mesmo, no Lula, O Filho do Brasil, toda a parte do Nordeste é mostrada com toda a verdade, de maneira quase documental. O Nordeste, além de ser uma matriz cultural, é uma coisa de cinema! Hoje o Nordeste não é igual ao dos anos 1950, 1960, 1970. No Nordeste dos anos 2000, as pessoas têm rádio, televisão, internet. Hoje o poder aquisitivo do povo mudou, o nível de vida mudou. Não é ainda o ideal, mas já é diferente. Antigamente você chegava no Rio, São Paulo, vindo de uma cidade de interior, era como se fosse um bicho de outro planeta. Hoje, as pessoas já andam de motocicleta, não de jumento.

Essa sua militância em prol do Nordeste fez com que, em 1989, trouxesse o FestRio, festival de cinema de porte internacional, para Fortaleza. Nessa época, a ideia de criar um polo industrial de cinema começou a se insinuar.

A Violeta Arraes e o Tasso Jereissati eram entusiasmados com a ideia, mas a coisas ficaram no meio do caminho. O Nordeste poderia ser uma Califórnia. O cinema é uma mola do desenvolvimento político, cultural e social. Eu vou lançar um filme como Lula, o Filho do Brasil, e só tem cinema em Fortaleza e em Juazeiro. Não tem no Crato, em Quixadá, em Camocim, não tem cinema em lugar nenhum. Em Pernambuco, a mesma coisa. Caruaru, uma capital do sertão, não tem cinema. Eu me entristeço muito. O Lula até criticou isso. Um País como o Brasil, com quase 200 milhões de habitantes, só tem dois mil cinemas.

O projeto pode não ter sido executado, mas a vinda do FestRio deu um impulso no audiovisual por aqui.

Poderia ter dado muito mais. O Ceará tem pessoas de alto talento: o Rosemberg Cariry, o Wolney (Oliveira) e outros mais. Pernambuco também, Bahia, Rio Grande do Norte. O cinema nordestino poderia ser potente, ter projetos de cinemas volantes, para chegar a cidades menores, fazendas. O Nordeste poderia ser um produto de exportação, por causa da originalidade da cultura. O Rosemberg tenta montar uma estrutura técnica de equipamento, mas tá aí, isolado. É muito triste, me irrita essa atitude. Tem de ser criado um sistema de financiamento, pra que possa gerar emprego, renda. Essa visão o Tasso teve, mas ficou no meio do caminho. Parece que ele vai ser candidato de novo, né? Então vamos ver.

Depois de assinar o filme nacional com maior bilheteria, Dona Flor e seus dois Maridos, o senhor agora entra para a história como produtor do filme mais caro. Qual a importância de Lula, o Filho do Brasil, para a sua carreira?

É um filme simples. Ele foi produzido pela Paula Barreto com o Rômulo Marinho, que construíram o filme junto com o Fábio, que dirigiu e é o autor intelectual. Eu e a Lucy fomos apenas consultores. A Paula, o Fábio e o Bruno que tão agora pegando a empresa pra dar um salto nela a partir do ano 2010, planificar uma empresam mais ampla, dinâmica, menos familiar, com gestão profissional. Toda uma revolução que vai ser feita. Pra mim, como produtor, eu considero um filme simples, que fala da profundidade do homem brasileiro. Não tem política nem tem nada a ver com a imagem pessoal do Lula. É a reprodução de muitos brasileiros. O Lula, o Filho do Brasil fala da capacidade de superação do ser humano. Não é um filme eleitoreiro. Eu me sinto até insultado quando falam dessa questão de ser um filme de propaganda eleitoral, porque eu jamais fiz de ninguém. Nunca fui nem um grande eleitor do Lula, votei nele duas vezes. Votei em Fernando Henrique (Cardoso), (José) Serra, mas admiro o Lula profundamente como um brasileiro verdadeiro, um grande representante do nosso povo.
Em algum momento você pensou em dirigir o filme?

Não, não. Não sou diretor. Só dirigi o Isto é Pelé porque é minha praia, o futebol. Quem dirige meus filmes são meus diretores, o Fábio, o Bruno, o Moacyr Góes, todos livremente.

Com tanto investimento em Lula, o Filho do Brasil, e o histórico de indicações a prêmios internacionais da LC Barreto, o senhor espera uma grande repercussão no exterior?

Por enquanto, estamos pensando em ter uma grande audiência de público. Queremos que o filme seja visto pelo maior número de espectadores possível. Acreditamos que seja um filme que atinja seus três, quatro, cinco, seis milhões de espectadores. O resto vem depois.

Recentemente, o teórico de cinema Jean-Claude Bernadet viu Lula, o Filho do Brasil, e o definiu como “um desastre para a esquerda“, sem deixar de pontuar a magnitude da obra. O senhor concorda com essa afirmação?

Isso só prova que nós não fizemos um filme ideológico, fizemos um filme humanista. Ele é uma pessoa que eu respeito muito e, quanto a isso, até nos deixa certos de que não fizemos um filme chapa-branca. O filme tem um tratamento humanístico que não quer convencer ninguém de ideia nenhuma. Isso tudo foi determinado pela própria trajetória do Lula, que nunca foi uma pessoa ideológica. Ele é pragmático e humanista, e a energia dele se concentra em benefício do homem. Daí a originalidade dele. Se o filme não agradar a esquerda, não vai agradar também a direita. Pode ser que isso finalmente comprove a isenção do filme. 

Lula é o homem da década?

Eu acho que sim. Ele vem sendo o homem do Brasil há muitas décadas. Evidentemente que ele é fruto de um pensamento quase coletivo, a expressão quase de uma vontade coletiva. Ele teve a grande abertura para assimilar e conviver com tantos pensadores, gente como Fernando Henrique, Serra, Antonio Cândido, que têm níveis intelectuais muito superiores à dele. Mas ele soube e sabe conviver em pé de igualdade. Não se amesquinha, não se diminui diante de saberes maiores. O Fernando Henrique, uma vez, disse pra mim que não conheceu nenhuma pessoa com tanta capacidade de apreensão dos fenômenos e das coisas como o Lula, que ele é dono de uma inteligência aguda, aplicada pras qualidades dele. Não é um pré-destinado, não age como tal. O filme é baseado num livro documental, dele próprio, da família. As ações dele sempre foram concretas no sentido de resolver os problemas que impediram o melhoramento da família dele. Acho o filme, de uma certa maneira, até didático pra grande massa do povo brasileiro. Milhares de famílias aqui sofrem problemas de desemprego, falta de assistência médica, de oportunidade pra se educar e não sabe como sair disso. O Lula trabalha todo o conceito social dele em cima disso, porque ele viveu. O crédito popular é uma decorrência de experiência dele, que teve muito problema. Uma vez, e essa história tem até no filme, ele precisava viajar até outra cidade pra pegar um dinheiro pra mãe com um familiar. Mas o dinheiro que ele tinha só dava pra ir até a metade do trajeto. O chofer do ônibus dá o crédito pra ele, que, quando pega o dinheiro, volta pra pagar a passagem. E tão aí as estatísticas de que o crédito popular é o que tem o menor índice de inadimplência. Pobre não gosta de passar calote. Quem passa calote é rico.

Para o senhor, qual o grande legado cultural desses oito anos de Lula?

O grande salto qualitativo do governo Lula foi o Ponto de Cultura. Foram espalhados mais de 2.500 pontos de cultura por comunidades que já tinham suas atividades, mas agora têm somas pra poder incrementar e aumentar sua produção cultural e intercambiarem essa produção. Pelo Brasil afora, no Cariri, você vai encontrar pontos de cultura importantes. Faltam algumas coisas, claro. Ainda falta um aperfeiçoamento na política cinematográfica.

Ano passado, quando o senhor fez 80 anos, disse para O POVO que não tinha planos de se aposentar. O filme sobre Lula, no entanto, vem sendo anunciado como a sua despedida do cinema. O que te fez mudar de ideia?

Não vou me despedir do cinema. Simplesmente, vou trabalhar mais no campo político. Nós vamos nos dedicar à implementação do Vale Cultura. Também queremos que viabilizar a construção de cinemas populares. Vou fazer uma mudança de foco na minha carreira. Quanto à produtora, a Paula, o Fábio e o Bruno vão se concentrar na produção de longas, documentários, minisséries para TV e vão dar um upgrade na empresa. Eu e a Lucy vamos trabalhar no campo político, mas ela ainda tem projetos pra lançar: Madame Lynch, Flores Raras… Eu não tenho mais nenhum projeto a realizar na produção, então vou me dedicar realmente a ver se torno realidade essa questão do vale cultura e pra que cada município no Brasil com população acima de 60 mil habitantes tenha seu cinema.

Perfil

Luiz Carlos Barreto nasceu em 20 de maio de 1928, na cidade de Sobral. Radicado no Rio de Janeiro desde 1947, ele foi repórter e fotógrafo da revista O Cruzeiro. Depois de ser mal tratado por militares enquanto trabalhava, decidiu deixar o jornalismo e apostou no audiovisual como meio de vida. Começou escrevendo o roteiro de O Assalto ao Trem Pagador, filme de Roberto Farias. Depois fotografou Terra em Transe, de Glauber Rocha. Quando viu, estava no centro do Cinema Novo, que, a exemplo da Nouvelle Vague francesa e do Neorrealismo italiano, buscava o tom documental em filmes de ficção, fazendo do “cinema verdade“ seu maior objetivo. Em 1962, abriu a LC Barreto, sua produtora de cinema. Aos 81 anos, Barretão é o responsável por várias das maiores produções nacionais: as indicadas ao Oscar O Quatrilho (1995) e O Que é Isso, Companheiro? (1997), Bella Donna (1998), O Homem que Desafiou o Diabo (2007) e Lula, o Filho do Brasil (2010).

Muito abalada com o acidente sofrido por Fábio Barreto, toda a família tem se revesado diariamente no Hospital Copa D-Or. Parte da entrevista ao O POVO, realizada na última quarta-feira, 30, foi interrompida para que Barretão tivesse notícias do filho.

Barretão assumiu a linha de frente da divulgação e circuito de estreia do longa-metragem de Lula, o Filho do Brasil. Aos 81 anos, o veterano tem afirmado que encerra assim sua atividade cinematográfica, passando aos filhos a continuidade.

Luiz Carlos Barreto diz não ter pensado Lula, o Filho do Brasil como um filme ideológico e confessa não ter votado no presidente Lula, embora admire suas realizações.

Terra em Transe (1967) é um dos filmes mais comentados da obra de Glauber Rocha (1939-1981). O longa enfrentou problemas com a censura pelas críticas ao autoritarismo.

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Fonte: Jornal O Povo