Krugman: Câmbio no Brasil não faz sentido
O prêmio Nobel de Economia, Paul Krugman, professor da Princeton University nos EUA, afirmou que o atual nível de câmbio do Brasil "é um problema real e, se for mantido no atual patamar — por um prazo duradouro —, pode prejudicar a economia nacional, especialmente gerando efeitos negativos sobre as exportações e o agravamento do déficit das contas correntes".
Publicado 04/12/2009 15:34
"O patamar atual do câmbio é semelhante ao registrado no início de 2008, quando os preços das commodities estavam muito elevados. Isso não é saudável", ressaltou. Embora Krugman não tenha defendido de forma peremptória que o governo adote medidas específicas para coibir a valorização do real ante o dólar norte-americano, o intelectual afirmou que dois caminhos poderão ajudar a coibir a apreciação excessiva do câmbio.
Um deles é a adoção de impostos sobre capitais que ingressam no País, o que o governo passou a fazer recentemente com a implementação da alíquota de 2% de IOF sobre o ingresso de investimentos estrangeiros em ações e títulos de governo brasileiro.
A outra alternativa, segundo ele, é a compra de reservas cambiais, movimento que deve ser mantido pelo Banco Central (BC) no curto prazo, como manifestou seu presidente, Henrique Meirelles. Em agosto de 2008, a poupança externa atingiu US$ 205 bilhões. Atualmente, o montante está próximo a US$ 237 bilhões.
Krugman ressaltou que o atual fluxo de capitais para o país é "uma bolha", mas não manifestou se ela vai estourar nos próximos meses. Na sua avaliação, o ingresso maciço de recursos no País é fruto de uma avaliação exagerada de investidores internacionais, pois, segundo o acadêmico, "o Brasil não será superpotência amanhã, mas o mercado já precifica isso".
O acadêmico disse ainda que o otimismo excessivo dos investidores em relação ao futuro do Brasil não é tão positivo no curto prazo, pois tende a estimular o ingresso de investimentos e valorizar ainda mais o câmbio. Ele destacou, em tom de brincadeira, que talvez as autoridades do governo não deveriam dizer que a situação do país é bastante favorável, a fim de reduzir a avaliação muito favorável dos investidores sobre a economia brasileira. Krugman afirmou que uma parte de sua poupança está aplicada em títulos do Brasil, mas não soube discriminar quais eram, pois fazem parte de um fundo de investimentos.
Mantega
Krugman disse que está planejando vender alguns dos seus investimentos no Brasil. “Não é que eu antecipe uma crise, mas os investidores parecem estar a gostar demasiado” de apostar naquele país, explicou. O Bovespa, principal índice bolsista brasileiro, acumula neste ano ganhos superiores a 60%, ao mesmo tempo que o real valorizou cerca de 35% face ao dólar, segundo aquela agência de informação.
As palavras do economista não passaram despercebidas, com vários analistas a considerarem que se trata de uma advertência velada sobre o risco de o Brasil se transformar num novo palco de uma bolha especulativa. O Banco Mundial já tinha vindo a público lançar semelhante alerta. Da parte do governo brasileiro, o ministro das Finanças, Guido Mantega, disse que esta valorização bolsista é uma “exuberância racional» dos investidores, garantindo que «não há bolhas nem exageros”.
Ele lembrou que a equipe econômica está atenta à valorização cambial e não descartou a possibilidade de novas medidas para garantir a estabilidade da moeda. "Nós estamos atentos a exageros. Acreditamos ser o suficiente mexer no IOF [o Imposto sobre Operações Financeiras]. Se necessário for, tomaremos mais medidas para garantir a estabilidade da moeda."
O ministro garantiu ainda o cumprimento da meta de superavit primário de 2,5% em 2009 e de 3,3% em 2010. Ele reafirmou que a economia brasileira vai crescer 5% em 2010 e que o país será uma das poucas economias do mundo que crescerá mais de 2%. Mantega voltou a citar a expansão do mercado interno como um dos fatores que contribuiu para a recuperação do Brasil diante da crise financeira internacional.
Meirelles
O risco de bolha sobre o preço dos ativos existe, mas não afeta apenas países emergentes, e sim o mundo inteiro. A análise foi feita ontem, em Berlim, pelo presidente do Banco Central (BC), Henrique Meirelles. Segundo ele, para atenuar seus riscos, o Brasil deverá adotar já em 2010 as novas recomendações do Comitê da Basileia, que votará na próxima semana uma regulação mais rígida sobre o mercado financeiro.
Para Meirelles, o risco existe em decorrência do alto nível de liquidez da economia americana "e de outras economias", situação que "favorece a distorção na precificação dos ativos". "É útil todo alerta de que investidores devem prestar cada vez mais atenção e tomar cuidado na precificação de suas compras", analisou.
O presidente do BC disse ainda que as bolhas anteriores foram fomentadas em parte pela aceitação, pelos investidores, de níveis de preços "claramente não sustentáveis". Meirelles lembrou ainda que o sobrepreço por excesso de liquidez pode incidir sobre ativos diversos, como commodities, imóveis, bolsas de valores e taxas de câmbio. "É muito importante que esse excesso de liquidez não seja sancionado pelos países que possam ser receptáculos", ressaltou.
O Brasil, ressaltou Meirelles, está protegido por uma regulamentação prudencial forte. Ele lembrou que os limites de alavancagem são estritos e o Banco Central vem dando continuidade à política de compra de excesso de moeda. "De todos os tipos de bolha, o mais perigoso, o mais danoso à economia, quando estoura, é a bolha de crédito", advertiu. "E o Banco Central do Brasil está tomando todas as medidas prudenciais necessárias, não só mantendo as atuais, que são das mais rigorosas do mundo, mas participando intensivamente das reuniões da Basileia."
Meirelles expôs as medidas em discussões no Comitê da Basileia, abrigado pelo Banco de Compensações Internacionais (BIS), na Suíça. Na próxima semana, técnicos dos BCs e autoridades monetárias se reunião para discutir novas normas prudenciais. Entre elas estão a criação de um colchão de capitais, de caráter compulsório.
"O Brasil já tem. Nosso mínimo é de 11%, acima dos 8% previstos por Basileia, e já estimulamos o sistema financeiro a adotar o colchão", disse Meirelles. "Entramos na crise com 17% de índice de capitalização, que é mais do que o dobro do índice da Basileia." Pelo menos três outras medidas de regulação estão em estudos pelo BIS: colchão de liquidez, índice de alavancagem máximo e registro em balanço e alocação de capitais das transações financeiras.
Se forem aprovadas pelo comitê, as normas — cujo caráter é voluntário — deverão ser postas em prática pelos bancos centrais entre 2011 e 2012. No Brasil, contudo, a adoção será antecipada. "A maior parte das normas que serão recomendadas por Basileia já está sendo aplicada no Brasil", reiterou. "Mas, se não formos o primeiro país, certamente seremos um dos primeiros a aplicar qualquer nova norma de Basileia."
Com agências