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Cientistas da SBPC conversam com PCdoB sobre ciência e tecnologia

Dirigentes do PCdoB e da Fundação Maurício Grabois receberam hoje (24) dois eminentes cientistas brasileiros: Marco Antônio Raupp e José Raimundo Braga Coelho, presidente e tesoureiro da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC). O objetivo foi apresentar os documentos do 12º Congresso e discutir as linhas gerais de um novo projeto nacional de desenvolvimento. “Pela primeira vez na história do país a ciência e a tecnologia ganharam maior espaço e mais investimento”, disse Raupp.

Reunião SBPC e PCdoB - agosto 2009

Os documentos que estão sendo discutidos no processo congressual têm sido levados a intelectuais, cientistas e personalidades de diversas áreas a fim de que o PCdoB possa ouvir opiniões qualificadas que contribuam para o aperfeiçoamento das teses. Como resultado da reunião, ficou acertado entre os participantes a realização, em breve, de um seminário focado na ciência e tecnologia.

O presidente do PCdoB, Renato Rabelo abriu o bate-papo destacando que o partido “vê a ciência e a tecnologia como a alma do desenvolvimento porque sem isso, não há transformação social”. E, para ele, ainda há “uma distância grande entre as necessidades e os investimentos feitos nessa área”.

Segundo Rabelo, “nosso Estado ainda é muito amarrado a uma predominância conservadora, antidemocrática e mudar isso requer inovação em suas instituições”. E sentenciou: “ou reformamos o Estado, ou ficamos para trás”.

Hoje, ressaltou, “precisamos de recursos na ordem de 25% a 28% do PIB para que o país possa se desenvolver e não chegamos a 19%. Em Ciência e Tecnologia, o investimento é de 1%”. Para ele, um facilitador está no fato de que o Brasil “tem bases próprias de investimento – um sistema público bancário forte – sem que haja necessidade de depender dos humores do capital estrangeiro”. Além disso, lembrou, “temos o lastro do pré-sal, que pode nos dar créditos abundantes”.

De acordo com o comunista, “vivemos um momento propício para mudar o país porque estamos diante de uma fronteira que nos leva ao limiar de um novo tempo; a crise mostrou a exaustão do sistema capitalista, que não consegue incorporar 2/3 da população mundial. A desigualdade é brutal”.

Reflexo direto do sistema é a aplicação da ciência e da tecnologia que, conforme lembrou Rabelo “atingiu altos níveis de desenvolvimento, mas não está a serviço da maioria da humanidade”. No campo do trabalho, lembrou que “o uso da tecnologia possibilitaria aos trabalhadores menos horas de trabalho e, consequentemente, maior tempo para se dedicar ao estudo e ao lazer”.

No caso do meio ambiente, disse que “os países centrais do sistema depredaram a natureza e agora cobram que os países em desenvolvimento restrinjam seu crescimento. Mas os problemas ambientais são reais, estão postos e precisam ser resolvidos. E só vejo saída para isso a partir da ampliação dos investimentos em ciência e tecnologia, que nos possibilitaria um crescimento sustentável”. Um novo projeto nacional de desenvolvimento, conforme argumentou, “tem de estar situado nesse contexto, levando em consideração todos esses fatores”.

Compromisso com a C&T

Após a apresentação feita pelo presidente do PCdoB, Marco Antonio Raupp (foto) brincou: “estava aqui procurando um ponto de discordância, mas assino embaixo a visão do PCdoB sobre o projeto nacional de desenvolvimento. A minha luta tem sido no mesmo sentido, buscando a autonomia do país, o uso sustentável de seus recursos e o desenvolvimento da ciência e da tecnologia”.

Para Raupp, é preciso que se mantenha no poder central do país governos comprometidos com essa visão, “como estamos vivendo atualmente”. Investir em ciência, explicou, “é gerar novos conhecimentos e nesse sentido a educação é fundamental”. Ele elogiou o ministro da Educação, Fernando Haddad. “Está indo muito bem. Entre outras coisas, criou um plano educacional que contempla todo o ciclo e um programa de treinamento cuja primeira turma reciclou 97 mil professores”.

Raupp lembrou que ainda falta uma visão integrada que associe um projeto nacional de desenvolvimento ao incremento e à disseminação tecnológica. Porém, enfatizou que “pela primeira vez na história do país a ciência e a tecnologia ganharam maior espaço e mais investimento” porque “há uma visão correta de que sem ambas, o país não vai para frente. Isso deslanchou a partir do segundo governo Lula”.

Como exemplos, Raupp citou o PAC da Ciência e Tecnologia, com investimentos de R$ 41 bilhões em pesquisas e capacitação científica até 2010, e a Lei de Inovação Tecnológica (10973/04), que considera “revolucionária”. No entanto, ressaltou que “muitas vezes o arcabouço legal e seus operadores não entendem o papel da ciência e da tecnologia”, o que faz com que a pesquisa esbarre em “obstáculos burocráticos”.

Num breve retrospecto, Raupp lembrou que o Brasil teve um processo de industrialização dissociado do desenvolvimento tecnológico. “Os casos que fugiram disso foram aqueles em que houve demanda clara de CeT, como a parceria da Petrobras com a UFRJ para desenvolver tecnologia na área petrolífera. No caso da Embrapa, por exemplo, ela criou a tecnologia usada hoje por montadoras para motores bi-combustível, mas não ganhou um tostão por isso”, lamentou. “Ao longo da história, a ciência e a tecnologia sempre estiveram à margem do desenvolvimento, do sistema produtivo. E o que queremos é que a ciência seja reconhecida pela sociedade”.

Ele citou ainda o exemplo da China, que compreende a necessidade de ter empresas fortes disputando o mercado externo e “embora possa parecer contraditório (com o fato de ser governada por um partido comunista), a questão central é que o governo tem o controle da produção”.

Voltando ao Brasil, no caso do meio ambiente, brincou: “não queremos nem um cemitério, nem um santuário”, visão compartilhada pelo PCdoB que defende o uso sustentável dos recursos naturais sem chegar aos extremos do desmatamento nem da visão santuarista. “Como usar a riqueza da Amazônia infinitamente, por exemplo, sem destruí-la? Aplicando a ciência”, colocou Raupp.”Fizemos isso no cerrado e é balela dizer que está destruído”, criticou. “O uso inteligente de nossos recursos pode fazer do Brasil a primeira potência ambiental do mundo”.

Sociedade do equilíbrio

Experiente gestor da área de C&T que participou desde o início da construção do programa sino-brasileiro de satélites, José Raimundo Braga Coelho (foto) abriu sua fala ressaltando que o sucesso das ações chinesas nessa área deve-se “à autonomia na gestão científica que o governo permite, casada com a cobrança dos resultados. Além disso, o Estado se faz presente em todas as esferas da vida social, por meio de comitês que discutem o que o governo está fazendo”.

Ele alertou para o cuidado que se deve ter quando se pensa em desenvolvimento: “na medida em que se beneficiam as classes menos favorecidas, a demanda cresce e isso pede o correspondente aumento de oferta”. Para ele, é justamente a ciência e a tecnologia que permitem esse desenvolvimento racional e equilibrado. Em seguida, Coelho afirmou: “encaro a sociedade socialista como a sociedade do equilíbrio”.

No Brasil, tanto Raupp quanto Coelho defenderam a participação da sociedade civil – através inclusive de Organizações Não Governamentais (ONG) e das Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público (Oscip) – como forma de ampliar a participação da sociedade nas ações do governo. “O terceiro setor veio para fazer um link entre a sociedade e o governo, mitigando a distância que sempre existiu entre ambos”.

Coelho defendeu ainda a criação de um sistema de ciência e tecnologia que englobe várias áreas da administração pública, ampliando seus benefícios. “A ciência e a tecnologia, hoje, não atingem o conjunto da sociedade e o poder público tem grande responsabilidade nisso”.

O encontro de hoje aconteceu na sede do PCdoB, em São Paulo e, além do presidente do PCdoB e dos cientistas da SBPC, contou com a presença do secretário de Organização, Walter Sorrentino, do presidente da Fundação Maurício Grabois, Adalberto Monteiro, além de Fábio Palácio, assessor da Fundação Maurício Grabois, e de Luciano Rezende, ex-presidente da Associação Nacional de Pós-Graduandos.

De São Paulo,
Priscila Lobregatte

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