Em debate com formato ruim, Alckmin perde sua última chance
O comando da campanha tucana admite internamente a derrota, mas aposta que Alckmin ainda pode diminuir a diferença para o presidente Lula após o debate da TV Globo. Por outro lado, aliados de Lula dizem, reservadamente, que o petista não deve ganhar
Publicado 28/10/2006 02:21
Se houve um perdedor no debate de ontem da TV Globo, certamente foi a própria emissora que, depois de tanto planejamento e marketing do evento, executou um debate com um formato –copiado de modelos americanos– desastroso e constrangedor, com tempos insuficientes para respostas, réplicas e tréplicas e erros básicos no enquadramentos das câmeras. Foram raras as vezes que os candidatos conseguiram concluir a argumentação dentro do tempo, controlado de forma rude pelo mediador Willian Bonner.
Nem no último bloco, quando o debate ocorreu no formato convencional, o telespectador pôde acompanhar de fato o debate de idéias com raciocínios completos por parte dos candidatos.
Lula estava visivelmente mais nervoso. Alckmin foi mais controlado, porém com seu tradicional tom monocórdico e burocrático não conseguiu empolgar.
Conteúdo sem novidades
Apesar da inovação (fracassada) do formato, no conteúdo o debate de ontem não revelou nenhuma diferença significativa em relação aos debates anteriores realizados pela TV Bandeirantes, SBT e Rede Record. Alckmin continuou com os mesmos argumentos e até as mesmas frases usadas nos debates anteriores. Lula continuou com suas boas ironias e com as mesmas respostas que deu nos debates que antecederam ao da Globo. E o mais importante: o “diferencial”, a “bomba”, a “faísca” que a boataria nos meios políticos insinuavam que poderia vir com o debate para garantir a tão sonhada e cada vez mais impossível virada de Alckmin, simplesmente passou longe do Projac, não aconteceu.
O único mérito do novo formato escolhido é que nenhum dos candidatos pôde pautar o debate com seus temas “preferidos”. Assim, Alckmin perdeu a chance de questionar Lula sobre questões éticas e Lula também não pôde enfatizar os benefícios do bolsa família e dos demais programas sociais do governo.
De novidade mesmo, apareceram a leviana denúncia de Alckmin de que Lula teria aberto caminho para a privatização da Amazônia ao assinar a Lei 11.284, assunto que a propaganda tucana já vinha explorando desde quarta-feira e que não teve repercussão na imprensa. E da parte de Lula, a pergunta, carregada de ironia, sobre “de onde vem o dinheiro para o que você diz que vai fazer na Segurança?” e emendou a pergunta à informação de que uma dirigente do PSDB de Minas ajudou a montar uma farsa sobre o uso de laranjas no caso do dossiê.
As perguntas formuladas pelos eleitores “indecisos” escolhidos pelo Ibope versaram, na maioria das 12 perguntas feitas, sobre temas que já haviam sido abordados em debates anteriores e que costumam pautar qualquer campanha presidencial. Perguntou-se sobre habitação, transporte, previdência, saúde, educação, combate às enchentes, impostos, segurança, corrupção, direitos trabalhistas, meio ambiente e emprego.
Em diversos momentos, Lula foi incisivo com Alckmin. Olhou no olho do adversário e por pouco não ergueu o dedo em riste para o tucano. Surpreso com a atitude enfática do petista, o tucano apenas recuava. “O estilo de Lula é esse mesmo, como um orador popular. E o Alckmin voltou a ser o Alckmin de antes, menos agressivo”, afirmou o presidente da Câmara, Aldo Rebelo (PCdoB-SP).”
Considerações finais
Nas considerações finais, Alckmin teve seu melhor momento. Conseguiu passar sua mensagem sem novidades. Concluiu o raciocínio no tempo determinado. Pediu voto, falou de sua trajetória política, deu algumas alfinetadas no atual governo, prometeu mudanças e ficou nisso. Burocrático, mas eficiente.
Lula, por sua vez, levou vantagem ao ser o último a falar. Começou bem, agradecendo a todos os participantes do debate, mas não soube controlar o tempo e, com isso, a mensagem final foi interrompida antes do fim. Além disso, Lula retrocedeu em relação ao debate da Record, quando conseguiu tecer suas considerações finais mesclando razão e emoção. Desta vez fez promessas concretas para um novo mandato que ele prometeu ser ainda melhor que o primeiro, mas quando chegou na hora de tocar o coração do eleitor, já não dava mais tempo.
Mas para a psicóloga da USP, Leila Salomão Tardivo, convidada pelo portal da Globo para comentar o desempenho dos candidatos, isso não atrapalhou o tom emotivo do discurso de Lula.
“Em seu discurso final, o Alckmin mostrou muita segurança, tranquilidade, confiança. Esse tipo de atitude fica mais no nível da razão”, avaliou a psicóloga. “O tom do discurso do Lula pega mais pela emoção. No discurso final, a voz do Lula tremeu um pouco. Ele vai mais para a emoção e isso comove as pessoas.”, avalia Leila.
Os convidados de Lula aplaudiram alto depois das declarações finais do petista. Ouviram-se até gritos de empolgação da bancada petista. Ministros, governadores eleitos e outros convidados do presidente Lula também cantaram “parabéns” logo depois do encerramento do debate. “Viva Lula”, gritaram em coro para festejar o aniversário do presidente.
Razão x emoção
A maioria dos analistas convidados a opinar sobre o confronto final entre os presidenciáveis, julgou que Alckmin teve um discurso mais organizado e racional. Lula, por sua vez, foi mais emotivo e espontâneo. O objetivo de ambos, nesta reta final, é tentar conquistar os 3 a 4% de eleitores indecisos e influenciar os 12% de eleitores que, segundo o Ibope, já têm candidato definido mas podem mudar de opinião até domingo.
Todos os institutos de pesquisa mostram Lula com mais de 20 pontos de vantagem sobre Alckmin. Assim, o tucano teria que conquistar 100% dos indecisos e e mais da metade dos eleitores vacilantes para empatar com Lula. Uma missão quase imposspivel.
Desse modo, o debate foi favorável a Lula pois, ao não trazer novidades, favorece a manutenção do atual ânimo do eleitorado, disposto a dar um novo mandato ao presidente.
Da redação,
Cláudio Gonzalez