''Alckmin é retrocesso'', diz Ariano Suassuna
Perto de completar 80 anos, Ariano Suassuna continua incansável. Autor de obras memoráveis da literatura brasileira, como O Auto da Compadecida e A Pedra do Reino, o escritor paraibano, filiado ao PSB — foi suplente do candidato derro
Publicado 06/10/2006 15:30
Em Brasília desde terça-feira (3), onde participa, no Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB), do Projeto Armorial, sobre o movimento cultural que ajudou a criar na década de 1970, o escritor concedeu entrevista ao Correio. Ele falou sobre o governo Lula, a crise que assola o país, defendeu o programa Bolsa Família e comparou o candidato à reeleição ao populista Getúlio Vargas.
“Vi Getúlio apavorado e amargurado quando descobriu que pessoas próximas a ele estavam cometendo atos desonestos. Mas que ninguém espere isso de Lula não, porque ele tem a paciência e sabedoria do povo brasileiro”, defende.
Ariano gosta de citar que o escritor Machado de Assis falava de um “Brasil oficial” e outro “real”. O primeiro caricato e burlesco. O segundo bom e revelador dos melhores instintos. Diz ainda que o grande significado de Lula foi ele ter sido o primeiro filho do povo do “Brasil real” a chegar à Presidência da República.
Cabo eleitoral
GOVERNO LULA
“Achei a eleição de Lula um fato histórico. Em 500 anos de história foi a primeira vez que um homem saído do povo do ‘Brasil real’ chegou à Presidência da República. O que aconteceu, ao meu ver, graças às invulgares qualidades pessoais deles. Conheço Lula pessoalmente, gosto muito dele, acho que ele fez um governo excepcional. Algumas pessoas atacam, por exemplo, o programa Bolsa Família dizendo que é um programa assistencialista. Não concordo com isso não. Quer dizer, é assistencialista, o ideal seria que nós não precisássemos ter esse tipo de programa, mas num país onde existe essa desigualdade social dilaceradora e onde existe pessoas passando fome, um programa como o Bolsa Família é indispensável. Acho que o programa tem que ser ampliado e aprofundado. De maneira que votei em Lula já cinco vezes e vou votar agora pela sexta vez com muito orgulho. Estou com ele.''
ESCÂNDALOS
“Acompanho os escândalos no noticiário com muita amargura e acredito que o mesmo acontece com todos os brasileiros. Mas talvez por ser velho, menos perplexo. Não é a primeira vez que vejo isso não. Eu já vi isso com um presidente chamado Getúlio Vargas, que tinha um projeto de desenvolvimento para o Brasil a partir do capital brasileiro e que tinha uma preocupação social muito evidente. Do ponto de vista do
programa social, se olharmos o Brasil de Getúlio Vargas e depois para o de Fernando Henrique Cardoso, houve uma decadência muito grande. Muitos direitos que Getúlio Vargas tinha dado à população pobre foram cortados. A instabilidade de emprego, o salário mínimo, as consolidações das leis de trabalho, enfim, todas essas medidas foram destruídas pelo capitalismo neoliberal que hoje está imperando no Brasil. E outra coisa, Getúlio Vargas tinha muitos defeitos, mas ele foi deposto não pelos defeitos e sim pelas qualidades que ele tinha. Então, eu vi Getúlio, de repente, além da crise política que o cercava, apavorado e amargurado quando descobriu que pessoas próximas a ele estavam cometendo atos desonestos. E ele ficou tão amargurado que deu um tiro no peito. Mas que ninguém espere isso de Lula não, porque ele tem a paciência e sabedoria do povo brasileiro.”
ALCKMIN
“Uma possível eleição de (Geraldo) Alckmin vai ser um retrocesso, porque ele representa para mim uma volta do pensamento que considero altamente nefasto, que é o capitalismo neoliberal. Ele está cercado pelo Fernando Henrique Cardoso, por todo este grupo que entregou a Companhia Siderúrgica Nacional (CSN), entregou a Companhia Vale do Rio Doce e não entregou a Petrobras, o Banco do Brasil e a base de foguete de Alcântara (MA), porque o Lula não deixou. Lula estancou as privatizações, que ao meu ver foi uma coisa extraordinária, ele procurou integrar e está procurando integrar o Brasil com a Rússia, com a África do Sul, com a Índia e com a China e está procurando fazer um coisa com a qual eu sonhava desde de 1971. No meu entender, Alckmin vai acabar com tudo isso e realinhar o Brasil a uma política de subserviência à Alca e aos Estados Unidos. Coisa que para mim é altamente perniciosa ao Brasil.”
APOIO NORDESTINO
“O Nordeste e o Norte, as regiões onde Lula ganhou, são os lugares do Brasil onde o povo passa mais dificuldade. Então eles sentiram na pele os benefícios do governo Lula. No Sul e Sudeste a situação econômica da população é melhor, então eles podem ser dar ao luxo de dizer que o Bolsa Família é apenas um programa assistencialista, resultado de um populismo de Lula. Mas a família que passa necessidade e recebe o Bolsa Família sabe da importância disso.”
ACM E COLLOR
“A derrota de Antonio Carlos Magalhães na Bahia me parece causada por uma exaustão. Chegou o momento em que a figura dele, que tem uma influência enorme no estado, com o próprio decorrer do tempo exauriu aquele modelo de política na Bahia. Por outro lado, tem fatos que podem causar espanto no primeiro momento. A volta de Collor é realmente um retrocesso, mas que faz parte do próprio jogo democrático. Acho que a eleição de Collor não tem significado político importante não. Agora, mas do que isso, me preocupou, em São Paulo, a eleição dos três deputados mais votados. O Clodovil (Hernandez, eleito deputado federal por São Paulo pelo PTC), por exemplo, achei uma coisa absurda. Não tenho preconceito nenhum não, mas pelo o que ouvi dele acho que é uma pessoa totalmente despreparada. Perguntaram para ele, eu vi na televisão, quais eram os projetos políticos dele e a resposta foi: ‘Eu não sei não querido, eu não sei dizer nada’. Acho que as pessoas têm que ter bom senso.”
Fonte: Correio Braziliense