Lula democratizará os meios de comunicação?
Por Bernardo Joffily
Um trecho do programa de governo da candidatura Lula começou a dar o que falar antes mesmo de ser lançado: é o que garante “a democratização dos meios de comunicação”. O senador César Borges (PFL-BA) subiu à tribuna nesta terça-fei
Publicado 30/08/2006 14:33
Expoente do Carlismo baiano (grupo político do senador Antonio Carlos Magalhães), César Borges acusa o programa presidencial de querer “criar controles para a grande imprensa, onde reside uma resistência a todos esses males que ocorrem no país”. “Ele deseja criar comitês populares”, indigna-se o orador, acusando Lula de “vocação autoritária”.
Lamúrias do PSDB-PFL
O senador Romeu Tuma (PFL-SP), último delegado titular do Dops paulista durante a ditadura militar, solidarizou-se com seu correligionário, lamentando ver César Borges “triste”. O baiano agradeceu. Confessou-se de fato “angustiado”, ao constatar que “a população está anestesiada”, pois o governo Lula “nivelou por baixo” — numa referência às pesquisas que indicam a reeleição desde o primeiro turno. E vituperou a UNE, a CUT e o MST, assim como a presença de sindicalistas no governo. “Estou com medo do futuro”, resumiu.
Outro aparte veio de Flexa Ribeiro (PSDB-PA), líder patronal da CNI guindado ao Senado como suplente de Duciomar Costa (PTB). Este acusou os “laboratórios de idiotia instalados no Palácio do Planalto” pela infeliz idéia de democratizar a comunicação. “Nós caminhamos para o modelo sensacionalista de Hugo Chávez, de Fidel Castro, de Evo Morales”, vaticinou.
O que diz o programa de Lula
O programa de governo de Lula para 2007-2010 não se estende sobre o tema. Limita-se a afirmar que “Será garantida a democratização dos meios de comunicação, permitindo a todos o mais amplo acesso à informação, que deve ser entendida como um direito cidadão”. E especifica:
• “Construir um novo modelo institucional para as comunicações, com caráter democratizante e voltado ao processo de convergência tecnológica.
• Incentivar a criação de sistemas democráticos de comunicação, favorecendo a democratização
da produção, da circulação e do acesso aos conteúdos pela população.
• Fortalecer a radiodifusão pública e comunitária, a inclusão digital, as produções regional e independente e a competição no setor.”
O jornal Folha de S. Paulo, na segunda-feira, noticiou em tom cáustico que o grupo temático encarregado desse ponto na campanha Lula propõe ainda outras medidas “vigorosas” nas comunicações. Entre elas, “mudanças na legislação para assegurar mais 'equilíbrio e proporção' na cobertura de mídia eletrônica, incentivos econômicos para a formação de jornais e revistas independentes e a criação de conselhos populares que teriam poder sobre as atuais e futuras concessões de rádio e TV”.
Fenômeno que espanta os forasteiros
Pode ser, pelo menos, um bom começo. Um modestíssimo primeiro passo, para fazer frente a um fenômeno que espanta os forasteiros que tratam contato com a realidade brasileira: um país onde o presidente está, ao que dizem as pesquisas, para ser reeleito no primeiro turno, depois de apanhar durante mais de um ano da unanimidade da mídia grande.
Os senadores tucano-pefelistas insurgem-se contra a idéia de democratizar a mídia. Horripilam-se com a menção aos supostos “comitês populares”. Vêem “vocação autoritária” em tudo que sugira controle externo sobre a mídia grande.
Para eles, o status quo existente é perfeito e imexível: meia dúzia de famílias que detêm o monopólio dos meios de comunicação, e transmitem-no de pai para filho, e neto, e bisneto, mesmo quando o talento jornalístico vai rareando à medida que as gerações se sucedem, num processo que parece desafiar a teoria da evolução das espécies.
Linha editorial única
Estas se unem, numa linha editorial única, para bombardear o governo Lula com uma chuva de denúncias que vão das verdadeiras às manipuladas, até as simplesmente inventadas. E enxergam o fim do mundo quando os brasileiros não se deixam convencer de que este é o pior dos governos, e se dispõem a reelegê-lo, ainda por cima, credo, com a proposta de garantir a democratização dos meios de comunicação.
No primeiro mandato de Lula, pode-se dizer que o governo apanhou de zero nessa área. Suas duas tentativas de reforma — a Ancinav (Agência Nacional do Audiovisual), para regular a produção de cinema e vídeo, e o Conselho Federal de Jornalismo, que exerceria controle externo sobre as atividades jornalísticas — sucumbiram rapidamente diante do fogo cerrado da mídia grande. E esse resultado não esteve alheio ao comportamento prepotente da mídia na crise política de 2005. O futuro dirá se o propósito democratizante do programa de governo significa de fato que o presidente e as forças que o apóiam aprenderam a lição.
A íntegra do programa de governo de Lula está em http://www.lulapresidente.org.br/download/PlanoGoverno.zip
Com agências