A luta dos imigrantes nos EUA
Por Rosilene Lino Mendonça*
A importância da imigração e o apoio dos americanos a um sistema legal mais eficiente de imigração pode ser medida pela aderência dos norte-americanos à greve nacional
Publicado 30/05/2006 17:04
O termo “ilegal” é considerado politicamente incorreto. O imigrante clandestino, refugiado econômico, é visto pela sociedade estadunidense, antes de tudo como um trabalhador, jamais como um criminoso.
Um tiro no próprio pé
As atuais ameaças de criminalização dos imigrantes são apenas mais uma forma de atemorizar esta parte considerável da sociedade estadunidense. Manter a população sob medo constante é uma das técnicas de terror de Estado.
E é por ser tratado como um trabalhador pela sociedade, peça constitutiva da economia estadunidense, habituada com este fenômeno há séculos, que qualquer teoria de criminalização dos imigrantes será sempre rejeitada. Os imigrantes influenciam profundamente a economia e sua “expulsão” não ocorreria sem traumas. Equivaleria a um tiro no próprio pé. Quem vai fazer o trabalho pesado?
No dia-a-dia, o cidadão comum estadunidense, está sendo vítima de uma ditadura militar, e de um processo violento de alienação política, mas ainda não cedeu à propaganda xenofóbica de guerra. Os imigrantes são ainda reconhecidos como humildes trabalhadores honestos, que abriram mão de sua cidadania na busca por uma vida mais digna, negada pelas suas “economias” de origem.
Tráfico e dólares
Há muitos casos cruéis de intolerância que não devem ser omitidos, mas prevalece a cultura de ignorar/tolerar a presença do imigrante, a “invisibilidade” do filme “Bread and Roses” e “A Fronteira” do criciumense Roberto Carminatti premiado em Nova Iorque.
Pagar 10 mil dólares para arriscar a vida no México já deveria ser castigo suficiente para os que vão trabalhar sem cidadania no Império. Contraditoriamente, os juízes da fronteira estabelecem uma fiança de 20 mil dólares para liberar os detidos dentro dos Estados Unidos com uma promessa de retornar para a audiência . Existem milhares de financiadoras que emprestam dinheiro para imigrantes detidos. O tráfico de pessoas está estimado em bilhares de dólares mensalmente. Há, desde advogados até dentistas que lucram exclusivamente com comunidades lingüísticas.
Curiosamente, há distinção no tratamento de mexicanos e brasileiros. Os mexicanos alegam que raramente são presos, são apenas empurrados pela fiscalização para o outro lado da cerca. Mas, se são presos, a fiança para os mexicanos não passa de $1,500. Por que os brasileiros são multados em 20 mil dólares? Os brasileiros são “ricos”, diz o mexicano. Mas o que acontece, alegou um advogado de origem mexicana, é que os brasileiros nunca voltam para a audiência.
Os imigrantes brasileiros, em geral, não querem fixar residência definitiva nos EUA. Eles querem voltar para o Brasil, querem continuar sendo brasileiros. Sofrem, por não poderem vir ao Brasil enquanto esperam seus “papéis”.
Direitos negados
Poucos sabem que o nível de organização dos imigrantes é elevado, e encontra-se atualmente na luta aberta pelo direito a carteira de motorista, já que, internamente, imigrantes sem documentos estadunidenses estão aptos a contas bancárias, empresas, cartão de crédito, e pagar altos juros de financiamentos na aquisição de empréstimos bancários, adquirir imóveis, automóveis.
Um direito negado, especialmente aos filhos dos imigrantes, é o acesso eqüitativo à universidade. O imigrante deve pagar o dobro do que paga um nativo dos EUA. Uma das estrelas desta campanha, que foi eleita a melhor aluna dos EUA, é brasileira. Sendo a universidade o principal meio de ascensão social, vê-se que nos EUA, espera-se que os filhos dos imigrantes continuem a fazer o trabalho sem qualificação de seus pais estrangeiros. A luta por acesso ao ensino foi também uma luta dos negros.
Os imigrantes fazem, na Globalização, o trabalho que foi feito pelos escravos africanos no período colonial. Os imigrantes lutam, nos anos zero, por direitos civis que os negros conquistaram nos anos 50, mas que ainda custam a ser respeitados. (Foi através da anulação dos votos dos afro-americanos que Bush conseguiu chegar a presidência, sem ganhar a eleição.)
Espera pode levar 12 anos
Os imigrantes são parte da força de trabalho e da elite intelectual, sua presença é a característica daquela sociedade, contribuem com a constituição, o humor, a criatividade dos Estados Unidos.
A legislação imigratória é um tema tão controvertido que os presidentes são sempre evasivos ao tratar do tema. Claramente houve um acordo entre republicanos e democratas para não tratarem diretamente do tema no período eleitoral.
Um estudo mais apurado do sistema legal de imigração demonstra muitas contradições absurdas. A maior delas parece ser o “encarceramento” do imigrante que o impede de viajar enquanto espera seu cartão verde (green card), que representa o seu direito de trabalhar, estudar e residir nos EUA. Se o imigrante retirar-se a qualquer tempo dos EUA enquanto espera seus “papéis”, perde o direito que a ele se aplica, estabelece o Código de Imigração. Tal espera pode levar até 12 anos e obedece a um sistema anual de cotas. Desta forma, as empresas beneficiam-se de uma maior estabilidade, porque não podendo sair, o imigrante se vê obrigado a permanecer, na espera pela carta de alforria.
É tema belicoso, muitos estudos estão sendo incentivados a respeito. E embora muitos concordem que a “abertura dos portões”, assim como a “legalização” destes trabalhadores nas sombras, sobrecarregaria a economia estadunidense e pressionaria os índices de desemprego para o alto, muitos trabalhos já foram publicados demonstrando que os estadunidenses, e muito menos os afro-americanos, não disputam mercado de trabalho com os imigrantes. Eles querem trabalhos melhores. “Make Jobs, Not War”, grita a juventude de Boston, resistindo aos jatos de água da polícia e a decepção de ver a mídia cega, surda e muda no dia seguinte. Sua “democracia” transforma-se numa Ditadura Imperialista, facista, senil.
* Bacharel em relações internacionais Unesa/RJ, com MBA em direito e negócios internacionais FJB/UFSC; atuou no movimento de imigrantes brasileiros em Boston;
rose_lino@hotmail.com