Entrevista com Zé Eduardo, ex-presidente da Petrobrás
Publicamos aqui, na integra, entrevista realizada pelo do Jornal da Cidade, publicada no último dia 15, com o ex-presidente da Petrobrás José Eduardo Dutra. Na entrevista ele fala sobre a polêmica do gasoduto Bolívia-Brasil, os investime
Publicado 23/05/2006 11:46 | Editado 04/03/2020 17:21
JORNAL DA CIDADE – A presença da Petrobrás na Bolívia é ilegal, como disse o presidente Evo Morales?
JOSÉ EDUARDO DUTRA – A Petrobrás atua em 19 países do mundo, em todos os continentes, e atua em absoluto respeito às leis vigentes nesses países. Portanto, não é verdade que a Petrobrás tenha tido uma ação ilegal na Bolívia. O presidente Evo Morales tem o direito de discordar da lei de hidrocarbonetos vigente na Bolívia, tem, inclusive, o direito de modificar e até de revogar a lei. Mas não tem o direito de acusar a Petrobrás de praticar qualquer ilegalidade, porque a Petrobrás sempre atuou na Bolívia em estrito cumprimento às leis vigentes naquele país.
JC – Na sua gestão na Petrobrás foram ampliados os investimentos na Bolívia? Por quê?
JED – O maior volume de investimentos da Petrobrás na Bolívia foi feito de 1998 a 2001, durante o governo FHC. Esses investimentos decorreram, principalmente, da construção do gasoduto Brasil-Bolívia. A partir do ano em que assumi a presidência da Petrobrás, em 2003, houve uma diminuição desses investimentos. Primeiro porque o gasoduto ficou pronto. Depois, já no nosso primeiro ano, em 2003, houve problemas na Bolívia. Houve quase uma revolução, o presidente Sanches de Louzada teve que renunciar. Então, aquilo foi um sinal de que nós devíamos ser mais cautelosos e por isso é que houve uma diminuição de investimentos em relação aos anos anteriores.
JC – É perigoso ampliar negócios, a exemplo da exploração do petróleo e gás, em países latinos?
JED – Olha, infelizmente, petróleo não dá na Suíça. A Suíça, que é um país estável, política e economicamente, não tem petróleo. Coincidentemente ou não, o petróleo ocorre em maiores quantidades exatamente em regiões onde há instabilidade política. Isso vale para a América Latina e vale para o Oriente Médio. Na Bolívia, nossos investimentos foram significativos, de mais de US$ 1 bilhão. Mas eu diria que a Petrobrás é mais importante para a Bolívia do que a Bolívia é para a Petrobrás.
JC – Por quê?
JED – Porque apenas 2% do faturamento da Petrobrás é obtido com negócios na Bolívia. Apenas 3% das reservas de petróleo e gás da Petrobrás estão localizadas na Bolívia. É uma situação diferente, por exemplo, da Repsol, uma empresa petrolífera espanhola, que tem 30% de suas reservas na Bolívia. Então, eu acredito que essa crise com a Bolívia será superada, até porque, desde a construção do gasoduto Brasil-Bolívia, existe uma relação de interdependência entre o Brasil e a Bolívia. O Brasil depende do gás boliviano, mas a Bolívia também depende do Brasil para vender esse gás, porque ela não teria como vender esse gás para outro país.
JC – O senhor vai mesmo disputar o Senado pelo PT? Há um consenso em torno do seu nome?
JED – Eu tenho colocado o meu nome à disposição para disputar o Senado pelo PT. Tenho colocado isso para o meu partido e para os partidos aliados. Desde o início, tenho dito também que não faço um cavalo-de-batalha em torno disso. Posso perfeitamente vir a disputar um mandato de deputado federal. Acho um mandato tão gratificante como o de senador. Agora, o PT, durante encontro estadual, decidiu, por consenso, apresentar aos partidos aliados o meu nome para o Senado e o de Marcelo Déda para governador. Então, estamos em fase de discussão de candidaturas. E o que há de concreto, definido mesmo, é o nome do candidato a governador. Estão ainda indefinidas a vaga do Senado e a vaga para vice-governador. O meu nome está à disposição para disputar o Senado, mas não coloco isso como uma coisa intransigente.
JC – Há uma predisposição do PT em abrir mão da disputa do Senado para negociar com novos aliados
JED – Também essa não é uma questão fechada. Todos os partidos que fazem parte da coligação têm nomes com legitimidade, com potencial eleitoral para disputar o Senado. O que o PT fez foi apresentar um nome para ser submetido à análise dos outros partidos. Se qualquer outro partido apresentar um nome para disputar o Senado, os partidos que compõem a aliança vão ter que sentar à mesa para encontrar a melhor solução.
JC – As pesquisas mostram a senadora Maria do Carmo Alves em melhores condições que qualquer outro candidato. O que fazer para derrotá-la?
JED – Eu entendo que pesquisa é importante. Mas a pesquisa é um retrato do momento. Positivamente, hoje, a senadora Maria do Carmo está em primeiro lugar nas pesquisas. Muito mais pela sua atuação enquanto secretária de Estado do que propriamente pelo seu mandato de senadora. Agora, eu, quando comecei a campanha para senador, em 1994, comecei com 3% das intenções de voto. Faltando 15 dias para a eleição, o Ibope colocava Valadares em primeiro lugar, com 42%, Zé Carlos Teixeira e Lourival Baptista empatados, em torno dos 30%, e eu em quarto lugar, com 11%. Quando apuraram as urnas, eu me elegi senador em segundo lugar. Na eleição para governador, em 2002, eu comecei com 8% das intenções de voto. Dr. João Alves tinha 60%, isso em junho de 2002. Terminei a eleição no primeiro turno com 28% dos votos. E cheguei, mesmo perdendo a eleição, ao segundo turno com 45% dos votos válidos do Estado. Portanto, eu não tenho medo de disputar eleição, mesmo estando atrás nas pesquisas. Sei que a eleição é difícil, sei que a senadora Maria do Carmo é uma candidata forte, mas não é imbatível. Como, aliás, ninguém é imbatível em eleição. Então, se eu for candidato a senador vou procurar mostrar ao eleitor o meu trabalho no Senado e pedir que ele faça uma comparação entre o meu mandato de senador durante oito anos e o mandato da senadora Maria do Carmo também de oito anos.
JC – Pelo seu nível inicial, a campanha eleitoral deste ano será agressiva? O que fazer para evitar enfrentamentos violentos?
JED – Estou começando a achar que quem avaliou como uma eleição de baixaria o segundo turno das eleições para governador de 2002, quando surgiram panfletos apócrifos atacando a minha honra, aquela campanha fascista do forasteiro, vai começar a sentir saudades das eleições daquele ano. Porque a julgar pelos primeiros movimentos que têm sido feitos pelo grupo do governo parece que eles vão querer usar de todas as armas. A nós, da oposição, cabe ter absoluta tranqüilidade e ter confiança no voto da população. Nós queremos fazer um debate de idéias, vamos fazer uma campanha de nível alto, como sempre nos propusemos a fazer. E vamos denunciar todas as ações que considerarmos baixaria.
JC – Existe alguma possibilidade de o senhor vir a ser o vice do ex-prefeito Marcelo Déda? Há alguma negociação nesse sentido?
JED – Não está em meus planos disputar a eleição para vice-governador. Aliás, essa questão nunca foi ventilada dentro do PT ou dentro da coligação. Eu tenho colocado o meu nome à disposição para disputar o Senado. Sempre tenho dito que a minha preferência é disputar o Senado, mas não coloco a minha preferência pessoal acima dos interesses partidários, daí que posso também disputar uma vaga de deputado federal. Não vejo nenhum demérito no cargo de vice-governador, fui candidato a vice na chapa do senador Valadares, em 1998. Mas não coloco o meu nome à disposição para disputar o mandato de vice-governador.
JC – O bloco das oposições quer mesmo o PSDB como aliado? Como está o processo de conversação? O que o PSDB deseja e o que os demais partidos cedem?
JED – Nós já conversamos com o PSDB há algum tempo. E essa aliança, sabemos que há dificuldades muito grandes para que ela se concretize. Primeiro porque a lei proíbe a coligação formal. Com a verticalização, PSDB e PT não podem se coligar oficialmente em nenhum Estado. Além disso, há dificuldades de natureza política. O PT no seu encontro nacional colocou restrições à aliança com o PSDB e com o PFL, embora tenha colocado também que fatos localizados poderiam ser discutidos com o diretório nacional. O mesmo vale para o PSDB. Nós temos lido nos jornais que os integrantes do PSDB de Sergipe têm tido reuniões com a cúpula nacional do partido e há restrições a que eles venham a fazer uma aliança política conosco. Mas acho que a gente deve continuar conversando. Até porque esse processo de conversa não nasceu agora. Em 2002, a maior parte do PSDB apoiou a minha candidatura a governador, no segundo turno das eleições. De lá para cá, na Assembléia Legislativa, existe um bloco formado pelo PT, pelo PSDB, um bloco de oposição ao PFL. E nas eleições de 2004 estivemos juntos com o PSDB em vários municípios. Dos cinco municípios onde o PT ganhou as eleições para prefeito em 2004, em dois o vice-prefeito era do PSDB. Então, há uma aproximação natural. Mas se vamos conseguir chegar a um acordo este ano, só o tempo dirá.
JC – Que outros partidos o PT poderá ter como aliados nas eleições deste ano? Há negociações com o PMDB? Em que fase estão às conversações com os peemedebistas?