Ricardo Kotscho: não há sinais de campanha nas ruas
Em 2002, a esta altura do campeonato, meados de maio, faltando pouco mais de um mês para o início da Copa do Mundo, disputada naquele ano na Ásia, a campanha eleitoral já estava pegando fogo nas ruas, com caminhadas, comícios e tudo, comitês e
Publicado 16/05/2006 21:54
Nas minhas andanças pelas ruas do Brasil não vi até agora nenhum sinal de campanha eleitoral. De repente, me dou conta de que faltam apenas quatro meses e meio para as eleições gerais que vão decidir o futuro do país para os próximos quatro anos. Até hoje, não encontrei um único adesivo em automóvel, bandeira de candidato ou partido, muro pintado, faixa ou cartaz nos postes, um mísero jingle que seja, nada.
Não vale o batido argumento de que este ano tem Copa do Mundo e, por isso, ninguém quer saber de eleição antes do último jogo na Alemanha. Afinal, as eleições para escolher o presidente, governadores, senadores e deputados estaduais e federais coincidem sempre com as disputas do mundial de futebol de quatro em quatro anos. Também não dá para colocar a culpa nas restrições e nos prazos da legislação eleitoral – até porque elas sempre existiram e nem por isso se deixou de fazer campanha ao longo de todo o ano.
Em 2002, a esta altura do campeonato, meados de maio, faltando pouco mais de um mês para o início da Copa do Mundo, disputada naquele ano na Ásia, a campanha eleitoral já estava pegando fogo nas ruas, com caminhadas, comícios e tudo, comitês eleitorais montados e equipados, e os candidatos correndo o país em busca de votos, subindo e descendo nas pesquisas.
Agora, nem os candidatos estão definidos. Até os sapos que habitam os jardins do Palácio da Alvorada sabem que o presidente Lula será o candidato do PT à reeleição, mas oficialmente ele não é. O PMDB ainda vai decidir neste domingo se terá ou não candidato e, só mais tarde, se for o caso, quem será ele. O PSDB já indicou o ex-governador Alckmin, mas tem muito tucano bem informado e colunista desconfiado, sem muita certeza de que será ele mesmo, enquanto o eterno aliado PFL reluta em indicar o nome do vice.
Se não há candidatos definidos, nem alianças fechadas, como fazer campanha? Os mais céticos atribuem este clima de marasmo pré-eleitoral ao fechamento das torneiras do “caixa dois” após o tsunami de denúncias que varreu o país no último ano. Simplesmente, faltam recursos, dizem eles. De fato, para todos os candidatos parece mais difícil hoje achar quem queira ser tesoureiro do que encontrar um vice que agregue votos.
Como os índices nas pesquisas se mantêm congelados há meses, quem está atrás joga todas as suas fichas no horário eleitoral gratuito que começa depois da Copa do Mundo. Antes disso, argumenta-se, todo mundo só quer saber de futebol. Será assim mesmo? Desde a redemocratização do país, com a volta das eleições diretas para presidente da República, em 1989, a realidade nos mostra que não é bem assim. Sem exceção, os candidatos que lideravam as pesquisas antes do horário eleitoral no rádio e na televisão acabaram ganhando as eleições presidenciais.
O anti-clima das eleições este ano lembra muito a campanha de 1998, a primeira em que era permitida a reeleição do presidente. Houve apenas um momento, justamente no mês de maio, em que o presidente FHC e o candidato Lula ficaram tecnicamente empatados na faixa dos 30 pontos. Com raros comícios e nenhum debate entre os dois primeiros colocados, e o noticiário negativo (aumento do desemprego, saques provocados pelo flagelo da seca no Nordeste, pressões sobre o câmbio mantido artificialmente) desaparecendo misteriosamente da imprensa, a reeleição consumou-se sem atropelos já no primeiro turno.
Posições ideológicas, personalidades e propostas de governo à parte, as pessoas se faziam uma pergunta muito simples: a minha vida melhorou ou piorou nos últimos quatro anos? Ainda surfando nas boas ondas do Plano Real, não foi difícil para o então presidente FHC conquistar mais quatro anos de mandato mostrando ao eleitorado que era melhor não arriscar.
E agora? Diante da folgada vantagem que o presidente Lula vem mantendo nas pesquisas, parece que só restou à oposição transferir a campanha eleitoral das ruas para os estúdios televisivos das CPIs sem fim e as capas das revistas, substituindo por denúncias e ameaças de impeachment as discussões sobre propostas de governo e os rumos do país, na esperança de que o Judiciário decida o resultado no tapetão, de preferência dando-lhe a vitória por WO.
Sua excelência, o eleitor, não parece muito interessado neste jogo, o que talvez explique a ausência de sinais de campanha nas ruas. Tive um bom exemplo disso outro dia numa pequena cidade do interior do Ceará, quando pedi ao dono do restaurante para sintonizar a televisão no telejornal.
A seleta clientela, que tomava cerveja vendo o último DVD de Reginaldo Rossi, não gostou nem um pouco. Teve gente que até foi embora. No horário nobre das notícias, o “Roberto Carlos do nordeste” está dando mais ibope do que a última sessão da CPI ou a nova denúncia contra o governo.
Nem é preciso ir tão longe. Antes de começar a escrever esta coluna dei uma olhada no noticiário do dia na internet para entender melhor o que está acontecendo. Em nota postada às 11h12, a “FolhaOnline” registrava em manchete: “Nível de emprego da indústria paulista cresce 1,48% em abril, diz Ciesp”, o que representa a criação de 30.980 postos de trabalho em São Paulo no mês passado.
Com renda e emprego aumentando, inflação e juros caindo, salário mínimo que dá para comprar mais cestas básicas e sacos de cimento do que há quatro anos, cisternas se multiplicando no semi-árido e menos gente passando fome, os analistas políticos constatam que falta um discurso para a oposição. Mais ou menos como aconteceu com Lula na disputa com FHC em 1998. Só alguns colunistas ainda se espantam, inconformados, com a teimosia das pesquisas.
Fonte: NoMínimo