Presidente Lula assina Projeto de Lei de Incentivo ao Esporte
Atualizada às 0h35
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva assinou, nesta quinta-feira (4), durante a abertura da 2ª Conferência Nacional do Esporte, o Projeto de Lei de Incentivo ao Esporte. O PL será encaminhado no
Publicado 04/05/2006 00:42
A Lei cria a possibilidade de incentivo ao esporte por meio de doações e patrocínios de pessoas físicas e jurídicas que poderão ser deduzidos do Imposto de Renda. As empresas que apoiarem o esporte poderão abater até 4% e no caso de pessoas físicas, a dedução pode chegar a 6%. Os projetos serão avaliados por comissão específica do Ministério do Esporte e deverão atender áreas como o desporto educacional, de rendimento ou de participação.
Para o presidente do Comitê Olímpico Brasileiro (COB), Carlos Arthur Nuzman, o encaminhamento do PL é a realização de um sonho de décadas. "Desde 1983, luto para que uma lei de incentivo seja construída no Brasil. Sua aprovação irá mexer muito com o cenário do esporte brasileiro", afirmou.
Antes e depois
O ministro do Esporte, Orlando Silva Júnior, ressaltou a importância do projeto, que era aguardado por toda a comunidade esportiva do Brasil. "O esporte brasileiro é um antes da Lei e será outro depois da sua aprovação", afirmou. Conforme ele, alcançar esta e outras conquistas no setor seria impossível sem o empenho do presidente Lula.
Segundo o presidente Lula, o envio ao Congresso do PL de Incentivo Fiscal é mais uma forma de atacar as carências do esporte no país e, juntamente com a aprovação da Timemania, dar novos rumos ao financiamento no setor. "É fácil um atleta de alto nível conseguir patrocínio. Mas quem pode ajudar os que estão começando?", questionou. "Com essa Lei, daremos uma oportunidade para que todos os atletas tenham a mesma chance", completou.
O presidente cobrou dos parlamentares empenho para que o Projeto de Lei de Incentivo ao Esporte seja aprovado o mais breve possível "para o bem do esporte amador do Brasil".
A 2ª Conferência Nacional do Esporte acontece até a tarde de domingo, no espaço Marina Hall, em Brasília. A proposta do evento é construir, por meio da participação popular, o Sistema Nacional de Esporte e Lazer.
Confira abaixo a íntegra do pronunciamento do presidente Lula na cerimônia de abertura da 2ª Conferência Nacional de Esporte:
Meu querido companheiro Orlando Silva, o “cantor das multidões”, como era conhecido na outra geração, nosso querido ministro do Esporte.
Nós temos um pequeno problema que é o seguinte: o pessoal que está sentado está pedindo para os que estão em pé saírem da frente. Obviamente que a imprensa, sobretudo os câmeras, têm que fazer o seu trabalho e eles não podem ficar lá atrás. Eu só queria que houvesse aí uma parceria, para que os câmeras pudessem trabalhar corretamente e as pessoas pudessem assistir.
Mas, como eu estava falando, tem gente que acha que pouca coisa mudou no Brasil. E eu poderia dizer para vocês: é só olhar na cara do Ministro do Esporte que vocês vão perceber que há pouco tempo esse menino era presidente da UNE. Acho que nem se formou ainda e já é ministro do Esporte.
Queria dizer, meu caro Nuzman, meu caro Vital, meu caro Agnelo, na verdade, o mérito desse projeto não é meu, o mérito desse projeto é do Vital, é do Nuzman e é, sobretudo, do nosso companheiro Agnelo Queiroz. Eu digo isso porque nesses 40 meses de governo, pelo menos durante 30 meses, o Agnelo brigou por esse projeto. E eu acho que o fato de estarmos apresentando ele aqui, hoje – e eu quero deixar vocês tranqüilos, porque não vou ler o meu discurso, que é muito longo, e mesmo tendo atletas aqui eu sei que tem dirigentes e os dirigentes não agüentam, não têm o mesmo fôlego dos atletas, apesar que às vezes falam mais. Eu vou ser curto, aqui, porém não grosso, vou ser curto e fino aqui, no trato dessa questão.
Vocês sabem que no Brasil nós sempre tivemos dificuldades de fazer coisas que são inovações no cotidiano da nossa política. No Brasil, nós estávamos acostumados a dar incentivos fiscais para qualquer coisa, para plantação de eucalipto, para construção de empresas, para perfuração de poços, para construção de barcos, mas não estávamos acostumados a dar incentivos fiscais para a cultura, que veio com a Lei Rouanet, não estávamos, muito menos, preparados para dar incentivos, com a lei fiscal adequada, para o esporte. Afinal de contas, nós não tínhamos e, possivelmente, muita gente não tenha ainda, a dimensão do significado do esporte na formação cívica do nosso povo, na saúde do nosso povo e no que representa para a economia brasileira a prática do esporte nas suas mais variadas vertentes.
Estamos atacando em duas frentes. Primeiro, a Lei que mandamos para o Congresso Nacional, que falta apenas pequenas coisas. O Agnelo já voltou para o Congresso há 30 dias, ainda não conseguiu, porque no Congresso as coisas não são tão fáceis assim. E nós temos pressa, porque a partir de junho este país estará em campanha eleitoral e o Congresso terá muito mais dificuldade de votar alguma coisa.
Eu estou vendo o Márcio Braga aí, nosso presidente do Flamengo, é preciso que a gente dedique um tempo especial para aprovar o “Timemania”. O Timemania é uma Lei que visa salvar os times de futebol neste país. Eu não concordo, não aceito a idéia daqueles que dizem que os times que não tiverem condições que morram, que os times têm que ser apenas uma empresa, e que não se estabelece quem não tem competência, não se estabelece. Isso é muito fácil de dizer, mas é preciso a gente reconhecer que alguns times no Brasil não são mais times de futebol, são, na verdade, centros de atividades culturais, e uma parcela da população não conseguiria imaginar o Brasil sem algumas das suas equipes de futebol.
E eu digo sempre o seguinte: o que seria do Brasil sem o Flamengo, o que seria do Brasil sem o Palmeiras, sem o Botafogo, sem o Vasco, sem o Fluminense, sem o Corinthians, sem o São Paulo, sem o Santos, sem o Cruzeiro, sem o Atlético Mineiro, sem o Grêmio, sem o Internacional, sem o Bahia, sem o Vitória. Ou seja, alguns viraram referência, onde milhares e milhares de pessoas em cada cidade, em cada estado, esperam o domingo à tarde para irem ao estádio de futebol para verem o seu time ganhar ou perder, chorar com o seu time, carregar a sua bandeira, cantar o seu hino. Isso não é mais uma prática simples do futebol, isso é uma manifestação cultural que está enraizada na célula de cada um de nós brasileiros.
Pois bem, esses times devem ao fisco – Ipatinga –, aliás, o Ipatinga está bom, está melhor do que o Íbis de Pernambuco. Mas vejam, esses clubes de futebol, eu citei apenas alguns, poderia citar três ou quatro em cada estado, poderíamos pegar estados menores e ver o que significa o Paysandu e o Remo, no estado do Pará, ver o que significa o Ceará, o Fortaleza, no estado do Ceará, o que significa o Náutico, o Sport, o Santa Cruz, lá, em Pernambuco. Poderíamos citar outras dezenas de estados. O América de Natal, poderíamos citar.
Gente, para eu não ficar citando todos, eu queria dizer para vocês qual era o argumento que se utilizava? O argumento era o seguinte: “bom, os times são mal administrados, nem todos têm dirigentes sérios e, portanto, o time que se arrebente”. Quem é dirigente aqui sabe que era esse o discurso feito neste país, porque, de vez em quando, predomina não a racionalidade, mas a hipocrisia no discurso político. Ora, se esses times atrasaram um ano, a culpa é do time; se atrasaram dois anos, a culpa continua sendo do time; mas se atrasaram três anos, a culpa já passa a ser do governo, porque não teve a coragem de cobrar no primeiro ano que ele atrasou. E quem atrasa um ano e não pode pagar, muito menos vai conseguir pagar 10 anos de atraso, 15 anos de atraso, 20 anos de atraso. Então, fica aquela coisa: o governo finge que cobra, os times fingem que paga, todo mundo engana todo mundo, e a dívida vai crescendo e os times vão se afundando. A Lei do Time Mania é uma chance, é um novo marco em que os times vão poder se organizar, uma parcela primeira vai pagar a dívida e outra parcela vai poder recuperar os clubes.
Eu espero, meu querido Agnelo e meu querido Ministro do Esporte, meu caro Nuzman, meu caro Vital, dirigentes e atletas, que a gente consiga este mês ainda aprovar esta lei, para que a gente possa sancioná-la, numa festa com todos os clubes de futebol aqui, principalmente depois da vitória do Corinthians hoje, sobre o River Plate, que estamos carecendo urgentemente.
Bem, a segunda coisa é essa Lei de Incentivo ao Esporte Amador. Vocês sabem que no Brasil e, possivelmente, em algumas partes do mundo, é muito fácil, quando o atleta consegue se projetar nacionalmente ou estadualmente, aparecerem empresas privadas querendo financiá-lo. Afinal de contas, esse atleta passa a dar lucro para a empresa porque já virou uma coisa de superstar. Vejam a propaganda do Maradona com o Guaraná Antarctica. Quando um atleta chega ao nível do Maradona, até aceita fazer uma propaganda, sonhando com a camisa da seleção brasileira, o que é inadmissível ser pensado pelo Maradona ou por um argentino. Mas, de qualquer forma, ele virou top e, quando a gente vira top, qualquer coisa pode acontecer na nossa vida. É só ver o que acontece com os nossos grandes atletas, seja do boxe… Do boxe, nem tanto, mas do esporte, do futebol, sobretudo, do vôlei, do basquete, as pessoas vão ganhando projeção, vão para a seleção brasileira, vão para os times, aí aparece um patrocinador, o Banco do Brasil já tem interesse, a Caixa Econômica tem interesse, não sei quem tem interesse.
Mas, e antes de esse atleta chegar a virar top? Quem é que vai dar uma mãozinha, um dedo, para que ele possa ter a chance? Nós não queremos dar medalha de ouro para ninguém. A nossa medalha é dar oportunidade para que todos tenham a mesma chance, no pódio, do sucesso esportivo neste país. E a Lei, então, vai permitir que empresas privadas possam pegar um percentual do seu Imposto de Renda para Pessoa Física e Pessoa Jurídica e apoiar um clube, uma seleção, um conjunto de atletas ou um único atleta. A gente vai poder garimpar, a verdade é essa, a partir da aprovação da Lei, os clubes, os atletas, nós vamos poder garimpar juntos e pedir para o Pão de Açúcar, pedir para o Antônio Ermírio de Moraes, pedir para os grandes empresários brasileiros, para os bancos, que coloquem um pouco de dinheiro no esporte amador, para que a gente possa ter a chance de nos tornarmos uma Nação mais competitiva no mundo do esporte. Todo mundo fica admirando quantas medalhas os Estados Unidos ganharam, quantas medalhas Cuba ganhou, quantas medalhas ganhou não sei quem lá. Ora, mas eles investem, e nós ficamos apenas apostando na bravura, no heroísmo e na competência individual dos nossos atletas. Ficamos apenas esperando isso, quando nós sabemos que o atleta tem que treinar, tem que ter pista correta, tem que ter quadra correta, tem que ter as coisas adequadas, tem que ter até um tênis decente para ele treinar, e, muitas vezes, não pode comprar.
Eu me lembro da primeira conferência em que eu participei e da primeira reunião que eu tive com os paraolímpicos. A emoção com que eu voltei para casa depois de ver companheiros com deficiência visual, companheiros cadeirantes se esforçando para ir para a Paraolimpíada ganhar alguma coisa. Só o esforço daquelas pessoas merecia que nós tivéssemos a compreensão de que o papel do Estado brasileiro é criar facilidades para que essa gente possa adentrar o mundo dos sonhos a que todos nós temos direito. Sonhar, sonhar e sonhar.
Para isso, nós estamos provando algumas coisas mais. Vocês já têm conhecimento do que significa o Projeto Segundo Tempo neste país. Hoje, praticamente 1 milhão de crianças estão tendo a oportunidade de praticar um pouco de esporte. Muitas vezes a gente não vê divulgado 1 milhão de crianças praticando esporte, mas a gente vê divulgado uma criança na rua, abandonada. Não que não deva ser divulgado, mas era preciso que mostrasse que acontecem coisas neste país que, muitas vezes, não merecem a atenção que deveriam merecer. Nós poderíamos nos lembrar do dinheiro e do compromisso que o governo federal está tendo para que a gente possa fazer, não apenas o Pan-Americano, mas o melhor Pan-Americano já feito em qualquer país do mundo, para a gente provar que a gente tem mais competência do que os Estados Unidos, do que todos que já fizeram, porque nós somos pobres, mas somos orgulhosos, sim, e temos condições de fazer o que a gente pode fazer de melhor.
E é fazendo os Jogos Pan-Americanos que a gente vai se cacifar para fazer uma Olimpíada ou para trazer a Copa do Mundo aqui, em 2014, que é um desejo nosso. Porque se ficar apenas mostrando miséria, ninguém vai fazer Olimpíada aqui porque no Brasil tem muito crime, ninguém vai fazer Olimpíada porque no Brasil tem muita criança de rua, ninguém vai fazer Copa do Mundo aqui porque os estados brasileiros estão quebrados. A nossa obrigação é mostrar que nós temos competência de fazer aquilo que os outros fazem, e até melhor, porque pode ter gente mais rica do que nós, mas eu duvido que tenha gente mais trabalhadora e mais criativa do que a sociedade brasileira, do que os homens e as mulheres deste país.
Portanto, meu querido Nuzman, meu querido Agnelo, meu querido Orlando e meus queridos companheiros, eu queria, Vital, dizer que é um motivo de orgulho ver você, já por umas cinco ou seis vezes no Palácio, ou mais, você está mais aqui do que carrapato, no Palácio. Eu pensei que pelo fato de ele não enxergar, ele viesse pouco ao Palácio, mas deu uma cordinha e ele está todo dia aí, e cada dia com uma reivindicação.
Eu quero dizer do orgulho que eu tenho, como Presidente da República, mas, muito mais do que como Presidente, como cidadão brasileiro, de ver um homem com a deficiência física que você tem mas, sobretudo, com a dedicação, com o carinho, com o esforço pessoal que você faz para fazer as coisas acontecerem. Você, na verdade, enxerga muito mais longe do que muita gente que tem dois olhos.
E é isso, meu querido, e é isso que me fez trabalhar para que a gente pudesse, hoje, assinar este projeto de lei, fazer uma conversa com o presidente do Senado, Renan Calheiros, com o presidente da Câmara, Aldo Rebelo, com os líderes do governo, porque agora a tarefa é de todos nós. Viu, Nuzman? Agora é pegar você, o Vital, pegar os atletas, pegar cada líder de cada partido político, pegar o líder do governo, o presidente da Câmara e mostrar para eles a importância deste projeto, que não pode ficar mofando.
Se é verdade que desde 83 que você briga por isso, e em 2006 saiu o Projeto, agora ele pode ser aprovado em 40 dias, em 50 dias, em 60 dias. Agora é obrigação não apenas do Presidente da República fazer o Projeto, é obrigação de cada atleta neste país, é obrigação de cada dirigente neste país, é obrigação de cada um de nós conversar com os nossos deputados, sem ter preferência eleitoral, sem ter opção ideológica, cada deputado ali tem um voto, independentemente de ser de direita, de esquerda ou de centro. E o que nós queremos não é saber se o voto é de esquerda ou de direita, o que nós queremos saber é que a Lei de Incentivo ao Esporte tem que ser aprovada para o bem do esporte amador do nosso país.
Muito obrigado. Boa sorte a vocês e que consigamos o nosso intento.