Redução da jornada de trabalho na Venezuela
O 1º de Maio na Venezuela e na Bolívia despertou um rancoroso ódio na mídia capitalista, cabendo destacar a cobertura reacionária da TV Globo, no Jornal Nacional e Jornal da Globo de terça-feira, este último apresentado por Will
Publicado 03/05/2007 19:18
“Aqui no Brasil”, proclamou o âncora do Jornal da Globo, “o 1º de Maio teve shows de música – especialmente em São Paulo, onde multidões foram presenteadas com pouco discurso e muita música pelas centrais sindicais” (tudo se passa, na ideologia global, como se não fosse um ato político da classe trabalhadora, mas uma festa a mais em feriado, regada a shows e sorteios). “O cenário foi diferente na Venezuela e na Bolívia”, lamentou o jornalista. “Hugo Chávez e Evo Morales comemoraram o primeiro de maio com um festival de nacionalizações. Ambos querem mais dinheiro para financiar projetos políticos.”
Luta entre capital e trabalho
Não devemos nos surpreender com o tom reacionário e intolerante da mídia capitalista neste caso. As medidas anunciadas por Chávez e Morales não são agradáveis para o imperialismo e muito menos para a burguesia e os latifundiários da América Latina. Entre as iniciativas desses dois líderes (divulgadas no 1º de Maio) sobressai a consolidação das nacionalizações do setor energético (petróleo e gás), que afronta abertamente os interesses dos grandes capitalistas estrangeiros, sediados nas potências capitalistas e naturalmente enseja reações iradas.
O presidente do Equador, Rafael Correa, também aproveitou o 1º de Maio em Quito para criticar asperamente a exploração da classe trabalhadora pelas multinacionais e defender a criação de um “código trabalhista humanista” para a América do Sul, oposto à lógica neoliberal que incentiva a competição por investimentos estrangeiros sacrificando direitos e condições do trabalho.
Esses e outros fatos são emblemáticos de um novo cenário político em nossa região, onde a luta entre capital e trabalho, contra o imperialismo e o neoliberalismo (que fez da depreciação da força de trabalho uma profissão de fé), tende a se situar em novo patamar. Através da luta, os povos vão descartando a agenda neoliberal e pavimentando o caminho para novos modelos de desenvolvimento, fundados na soberania, na valorização do trabalho e nos efetivos interesses das nações.
Adeus FMI e Bird
Demonstrando, uma vez mais, o papel de vanguarda reservado à revolução bolivariana, sem dúvidas o movimento mais conseqüente no processo de mudança política em curso na América Latina, Hugo Chávez foi além. Noticiou que a Venezuela está abandonando o FMI e o Banco Mundial, dois ícones da ordem econômica imperialista tutelada pelos EUA. “Não nos fazem falta nenhuma estes organismos”, declarou o presidente venezuelano, recordando que no período neoliberal os salários ficaram congelados durante vários anos (mesmo quando a inflação chegou aos 100%) devido aos ditames do famigerado FMI.
Outra medida que deve ser recebida com particular entusiasmo pelas forças progressistas e a classe trabalhadora e que tem tudo a ver com o 1º de Maio é o compromisso com a redução paulatina da jornada de trabalho para 6 horas diárias e 36 horas semanais até 2010, assumido por Hugo Chávez, que também instituiu a estabilidade no emprego para os trabalhadores sem cargo executivo nas empresas privadas.
Jornada e socialismo
Com isto, Chávez procura dar novos passos no rumo do “socialismo do século 21” e trata de forjar uma identidade de classe mais nítida à revolução bolivariana, conferindo-lhe um lastro mais sólido na classe trabalhadora em oposição às classes dominantes locais, ao imperialismo e ao capitalismo neoliberal.
Embora a redução da jornada de trabalho por si só não seja garantia de socialismo, nas condições históricas atuais a medida assume certo caráter revolucionário, pois em todo o mundo (e especialmente na Europa) a ofensiva neoliberal segue em direção oposta e tem imposto, em muitos países, a ampliação do tempo de trabalho.
Convém lembrar que, já em sua época, Marx havia assinalado que a regulação da jornada de trabalho, conquistada pela classe trabalhadora, foi o resultado de uma guerra civil secular entre capital e trabalho e traduzia uma vitória da economia política proletária contra a economia política burguesa. O filósofo alemão também sublinhou que a diminuição do tempo de trabalho devia ser entendida pelos revolucionários como uma pré-condição para o desenvolvimento do socialismo. Transformou-se igualmente na atualidade numa medida indispensável para enfrentar o flagelo do desemprego, que na Venezuela atinge cerca de 10% da população economicamente ativa.
A carga de 36 horas semanais pode colocar a república bolivariana na vanguarda da luta proletária (com uma das jornadas mais baixas do mundo num país relativamente pobre e atrasado), revitalizando uma bandeira histórica e estratégica da classe trabalhadora internacional. Uma bandeira que, ao contrário do que supõe o pensamento dominante e a despeito dos interesses capitalistas, tem também um sentido desenvolvimentista na medida em que pode abrir caminho ao pleno emprego, fortalecer o mercado interno e contribuir para a elevação da produtividade do trabalho, sobretudo se o tempo livre for associado à educação.