Meu velho Professor
Meu professor de História do Jornalismo já dizia, numa de suas primeiras aulas do meu primeiro semestre, que o que não dá na mídia brasileira (especialmente na rede Globo) significa para o brasileiro comum que não ''aconteceu''.
Publicado 09/03/2008 17:42
Assim, vendo os últimos noticiários sobre a invasão do território do Equador por tropas da Colômbia, treinadas e financiadas pelos EUA, com a participação de membros do exército de Israel, recordei sua preocupação. A mentira, a omissão e a mudança do foco são atos que desfavorecem a compreensão dos fatos. Elas têm sido a tônica do nosso noticiário, com a participação de “especialistas”, na verdade adversários declarados dos movimentos de soberania que ora pipocam na América Latina.
“Especialistas”, como Mirian Leitão, vêem suas falácias ruírem ante as informações de agências do exterior que a própria emissora, contrariando sua linha editorial, com extrema brevidade, é obrigada a divulgar. Como o fato de que no atual estágio o comandante Raúl Reyes estava em negociações com os governos do Equador e da França, com o conhecimento do governo da Colômbia, para libertação iminente de prisioneiros, entre eles Ingrid Betancourt, ex-aliada do governo Andrés Pastana, um ferrenho adversário das Farc. E o fato revelador de que os 22 guerrilheiros mortos (com exceção de 3 que montavam guarda) estavam com roupas de dormir, o que caracteriza a ação como um massacre.
Os noticiários preferem destacar a mentira cínica do governo Uribe, em sua pirotecnia diplomática, a querer transformar sua grave violação da soberania de um país vizinho numa “justa ação contra o terrorismo”. Sabe-se que não é a primeira vez que isso acontece: Nesta quarta-feira, o Alexandre Garcia, outro “especialista” da rede Globo, no afã de justificar uma tese contra o presidente da Venezuela, deixou escapar informações de suas fontes nas Forças Armadas de que no governo FHC o exército da Colômbia, sob a tutela da agência anti-drogas dos EUA, invadiu o território brasileiro. Inadmissível atentado à nossa soberania que foi resolvido com alguns tragos de uísque do nosso chanceler tucano no palácio de Uribe.
Ano passado, dois episódios, pouco divulgados por nossa colonizada mídia, reforçaram as preocupações com a nova cultura intervencionista da Colômbia, contaminada pelo modelo de Washington para o Iraque. A polícia de Uribe invadiu secretamente o território da Venezuela e foi até Caracas “resgatar” um importante adversário político. Na mesma época, a Colômbia invadiu, sem pedir licença, o espaço aéreo do Equador para borrifar supostas plantações de coca. Resultou em inúteis protestos diplomáticos. As atitudes pouco diplomáticas de Uribe e sua estreita ligação com o narcotráfico e com os diferentes grupos paramilitares lhe valeram uma significativa reprimenda do parlamento europeu.
Pelas mesmas razões, somadas à conta de mais de mil assassinatos de sindicalistas e lideranças comunitárias pelos órgãos de repressão do governo colombiano, o congresso dos EUA vem sistematicamente recusando a sonhada entrada da Colômbia na Alca, a contragosto de Bush que sonha re-introduzir os tentáculos parasitários do mercado estadunidense
Os fatos citados ficaram completamente alheios aos interesses da imprensa brasileira que se limita a ter um ou dois correspondentes para a América do Sul, sediados
Para fugir dos limites da mídia nacional, como recomenda meu velho professor, melhor é pesquisar a mídia de fora. BBC, Le Monde Diplomatique, El País, onde se trata o fato principal como a principal matéria. Não se dá destaque, como nossa imprensa servil, provinciana, às bravatas de Uribe contra os governos da Venezuela e do Equador e atitudes que visam desviar de si próprio o foco das manifestações vindas do mundo inteiro. Sobre o primeiro turno da reunião da OEA, nesta terça-feira, o insuspeito diário argentino Página/12 informou que a Colômbia “logrou até agora frear a condenação. Bush em pessoa saiu a espaldar Uribe”. Em que pese Quito ter “apoio majoritário do continente para sancionar Bogotá” [1].
Por falar em Bush, somente a Folha Online, deu a notícia da agência EFE, desta terça-feira, que revela a presença de alto comandante militar dos EUA em Bogotá dois dias antes do bombardeio contra o acampamento equatoriano no qual foi abatido o comandante Raúl Reyes [2]. A visita foi brevemente registrada no site das Forças Militares da Colômbia, no dia 28 de fevereiro. O contra-almirante Joseph Nimmich, diretor da Força Tarefa Conjunta Interagencial do Sul dos Estados Unidos, foi recebido pelo almirante David René Moreno no Comando Geral das Forças Militares da Colômbia. O objetivo da visita, pelas fontes oficiais, foi de ''compartilhar informação vital sobre a luta contra o terrorismo''.
A presença do comando americano nos dias anteriores à operação, o motivo de sua visita e o modelo de ação, o assassinato de guerrilheiros a sangue frio, confirma o apoio americano à ação militar. Está na hora da Nossa América botar as barbas de molho e pensar como o experiente líder cubano Fidel Castro, segundo a France Presse desta segunda-feira [3], que “a sangue frio ninguém tem o direito de matar. As acusações concretas contra esse grupo de seres humanos não justificam a ação. Se aceitarmos esse método imperial de guerra e de barbárie, bombas ianques guiadas por satélites podem cair sobre qualquer grupo de homens e mulheres latino-americanos, em território de qualquer país, havendo ou não guerra''.