Golpe nas Lojas Americanas afeta cadeia produtiva
Não são “só” os acionistas e trabalhadores os afetados. Uma enorme cadeia produtiva de fornecedores pode deixar de existir com o fim da varejista.
Publicado 20/01/2023 19:00 | Editado 23/01/2023 13:09
Os maiores bilionários do Brasil, Jorge Paulo Lehmann, Beto Sucupira e Marcel Telles, da 3G Capital, são apontados como cabeças do golpe contábil de R$ 43 bilhões no balanço das Lojas Americanas. O escândalo é tema da maioria das manchetes de periódicos econômicos brasileiros, por desencadear uma guerra silenciosa entre os mais ricos afetados pela fraude. Mas não são só os acionista que deixam de receber dividendos da varejista. Os prejuízos alcançam uma cadeia enorme de empresas fornecedoras e seus trabalhadores.
Além disso, a fraude destrói a credibilidade de todo o mercado financeiro nacional, a instituição sagrada que tenta decidir para onde vai a macroeconomia do Governo Lula III. A dimensão do golpe é tão crescente, conforme se desdobram as informações, que logo todos darão o nome certo para o fenômeno.
Poderosos demais para um país tão desigual, com seus R$ 180 bi de patrimônio, os três supostos golpistas são tratados com cautela pela mídia e pela Justiça. Em vez de apavorar a população brasileira com o golpe de dimensões históricas cometido por seus mais importantes exemplos de empreendedores, todos falam em “inconsistência contábil”. Só o banco BTG, grande prejudicado, rasgou o verbo em clima de briga de rua, ao dizer que esta é a “maior fraude corporativa na história do país”.
Todos tentam arrumar um jeito de jogar a sujeira para debaixo do tapete, e distribuir o prejuízo de alguma forma para tornar a “crise de imagem” coisa do passado. Mas a crise só sobe de nível deixando um rastro de destruição pelo caminho. Um dos problemas é convencer os 150 mil acionistas da companhia, que se depararam com a contabilidade inconsistente no balanço da gigante do varejo. Entre eles estão outros muitos ricos e influentes.
Prejuízo do trabalho, lucro especulativo
Sem mencionar os 100 mil trabalhadores que não sabem sequer se vão receber seus direitos e os fornecedores. A companhia declara ter em caixa R$ 8 bilhões e patrimônio de R$ 14 bilhões em 3.604 lojas físicas, mas deve mais de R$ 40 bilhões. Por sorte deles (e azar do resto), os três caloteiros são os mesmos que acabaram de assumir o controle lucrativo da Eletrobras, privatizada por Jair Bolsonaro.
Nesta quinta-feira (19), a Americanas entrou com pedido de recuperação judicial e pode ganhar seis meses para apresentar uma proposta de pagamento aos credores. Depois disso, a probabilidade da Justiça decretar a falência é grande. São aproximadamente 16,3 mil fornecedores que já sabem que dificilmente receberão, após o prazo, dada a dimensão do rombo. A “inconsistência contábil” seria justamente o fato da empresa teria escondido empréstimos para pagar fornecedores, fazendo parecer que a empresa era mais saneada e superavitária.
Uma das piores consequências do golpe, é justamente a quebradeira de fornecedores (fabricantes) que provoca. Muitos produziam especialmente para a rede varejista, como as fabricantes de ovos de páscoa. As milhares de lojas em shoppings e nas ruas, como também os armazéns de e-commerce tendem a definhar sem a renovação de estoque.
A Comissão de Valores Mobiliários (CVM) afirmou em comunicado que vai investigar o caso por meio de uma força-tarefa, que instaurará sete procedimentos administrativos de análise, apuração e investigação em cooperação com a Polícia Federal e o Ministério Público Federal. A repercussão política pode gerar repercussões no Congresso Nacional. O prejuízo na cadeia produtiva de fornecedores é considerada uma lacuna grave da fiscalização sobre estas grandes varejistas.
Informação privilegiada
Sergio Rial, presidente da varejista que renunciou em apenas 9 dias, anunciou o rombo, dez dias atrás em 10 de janeiro do ano novo, enquanto o país reagia à tumultuada intentona golpista em Brasília. Rial também revelou que a fraude no balanço da empresa se arrasta há quase dez anos. Empresas de consultoria, como a PwC e a KPMG, aprovaram os balanços dos últimos anos das Americanas. Os diretores da Americanas mais que dobraram suas remunerações de 2020 a 2022. A empresa também pagou dividendos recordes aos acionistas em 2022: R$ 333 milhões, a maior parte para Lemann, Telles e Sicupira.
Antes da eclosão da crise, em novembro do 2021, o grupo decidiu abrir mão do controle societário da Americanas S.A., trocando 60,8% das ações ordinárias (com direito a voto) por 29,2% das ações preferenciais (sem direito a voto). Com o anúncio de Rial como novo CEO, em agosto de 2022, as ações dispararam 61%, e a 3G vendeu R$ 223 milhões em ações. Para efeito de comparação, nesta terça-feira (17), as ações das Americanas fecharam cotadas a R$ 1,94, enquanto na venda pela 3G valiam mais de R$ 32.
Horas antes de anunciar o rombo, a Americanas resgatou R$ 800 milhões em investimentos no BTG, segundo o jornal GGN. Além disso, obteve liminar na Justiça do Rio de Janeiro obrigando o banco a devolver R$ 1,2 bilhão. Diante do escândalo, o BTG havia se apropriado do dinheiro da empresa.
Um dos maiores prejudicados, o banco BTG não economiza nas palavras ao desabafar seu ódio. “Os três homens mais ricos do Brasil (com patrimônio avaliado em R$ 180 bilhões), ungidos como uma espécie de semideuses do capitalismo mundial ‘do bem’, são pegos com a mão no caixa daquela que, desde 1982, é uma das principais companhias do trio”, diz ação do banco contra os clientes.
Desconfia-se que pode aparecer mais gente importante que teve acesso à informação privilegiada do rombo e garantiu sua lucratividade vendendo ações.
Com informações da Rede Brasil Atual e Jornal GGN