Flip é marcada pela valorização da diversidade e temática antirracista

Feira literária reuniu cerca de 25 mil pessoas em Paraty. Apesar da forte presença negra entre convidados, foi criticada por ter pouco público negro e ingressos altos

Foto: Walter Craveiro/Instagram Flip

A 20ª edição da Feira Literária Internacional de Paraty (Flip), primeira presencial após dois anos devido à pandemia dia Covid-19, se encerrou neste domingo (27) com um balanço positivo no que diz respeito à forte presença de público, à diversidade dos palestrantes e à escolha da homenageada, Maria Firmina dos Reis, autora do primeiro romance abolicionista do país, Úrsula, lançado em 1859. Por outro lado, a feira suscitou críticas quanto ao alto valor cobrado para a tenda principal e à presença menor de negros na plateia. 

Ao escolher celebrar a escritora Maria Firmina dos Reis, a Flip teve, pela primeira vez, uma mulher negra como homenageada, o que sinaliza para a importância de levar ao público nomes que formaram a literatura brasileira para além dos mais conhecidos, dando o merecido destaque e consagrando  a força do feminino e da negritude na cultura nacional e fortalecendo a luta antirracista. 

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As mulheres, aliás, tiveram grande participação tanto do ponto de vista quantitativo como qualitativo. Dentre convidadas estavam nomes como Annie Ernaux — vencedora do Nobel de Literatura e principal atração do evento —; Cida Pedrosa — vencedora do prêmio Jabuti de 2020, que lançou o livro de poesias “Araras Vermelhas”, sobre a Guerrilha do Araguaia —, Teresa Cárdenas, entre outras, além das escritoras trans Amara Moira e Camila Sosa Villada. 

Em sua apresentação, Annie Ernaux destacou: “Quando escrevo, não escrevo algo sobre mim, é uma verdade geral. A escrita é um processo de criação, não podemos nos esquecer disso”, declarou, segundo a revista 451. “Busco algo que acontece, não algo que tem em mim”, completou. 

A pernambucana Cida Pedrosa, por sua vez, salientou: “Cresci no sertão do cordel, dos cantadores, do som da voz do homem que vendia tudo na rua. Não consigo separar a minha literatura da fala”. Ela disse ainda que “cada coisa que escrevo, leio em voz alta. Se alguma palavra sobrar, corto sem medo de ser feliz. Tem que caber no ouvido da mesma forma que cabe na página”. 

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A diversidade da festa também se fez presente com destacados nomes indígenas — como o cineasta Carlos Papá e Cris Takuá, ambos do povo Guarani Mbya — e negros — como a norte-americana Saidiya Hartman, o ator Lázaro Ramos, Cidinha da Silva e Allan da Rosa — entre muitos outros.

A luta antirracista, que permeou a feira desde a escolha da homenageada até temas e convidados, foi um dos pontos centrais de palestra da pesquisadora Saidiya Hartman. Para ela, a perda dos registros de pessoas “escravizadas, subalternas e oprimidas tinha a intenção de fazer com que a nossa história fosse impossível de contar”. Sua opção, escreveu a Folha de S.Paulo, “foi pela fabulação crítica dessas histórias a partir de pequenas pistas que conseguiu obter na exígua documentação histórica disponível”. 

Outro ponto marcante foi a opção dos curadores por valorizar escritores menos conhecidos e editoras independentes, que puderam montar suas bancas em um espaço aberto, destinado à venda de livros. 

Realizada fora do mês em que tradicionalmente ocorre, julho, devido à dificuldades para a captação de recursos, a Flip deste ano, em novembro, acabou tendo valores altos de ingresso, o que acabou gerando críticas. Em 2020, o preço era de R$ 55 para a tenda principal; agora, mais do que dobrou, atingindo R$ 120. 

Apesar disso, segundo a direção da Flip, a ocupação dos hotéis na cidade chegou a 90% e a festa recebeu cerca de 25 mil pessoas, número próximo ao registrado em 2019, último ano da Flip presencial antes da pandemia. 

Também foi criticada a baixa presença de pessoas negras entre o público participante. “Paraty tem uma população majoritariamente negra e dói não ver isso na plateia”, disse Belita Cermelli, diretora de cultura e educação da Flip, segundo o jornal Folha de S.Paulo.

(PL)

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