Candidata à presidência, Esperanza Martinez quer mudar economia do Paraguai
Em entrevista exclusiva, Esperanza Martinez defende o investimento na industrialização e na reforma agrária para alcançar desenvolvimento econômico e justiça social. A entrevista será apresentada em 3 partes.
Publicado 06/08/2022 13:00 | Editado 07/08/2022 09:14
O Paraguai terá eleição presidencial em abril de 2023. Em entrevista exclusiva, a candidata à presidência pela Frente Guasú-Ñemongeta, Esperanza Martínez, fala sobre as propostas para desenvolver o país.
Esta foi uma longa entrevista e, por isso, será apresentada em três partes.
Esperanza Martinez é médica, foi ministra da Saúde e do Bem-Estar Social do governo de Fernando Lugo, entre os anos de 2008 e 2012; em 2013 foi eleita senadora da República do Paraguai, presidente da Comissão da Fazenda e Orçamento do Senado em 2020 e 2021.
Esperanza defende os eixos centrais para desenvolver o país, como o investimento na industrialização e na reforma agrária; a renegociação do Tratado de Itaipu, para gerar recursos necessários ao fortalecimento da saúde e da educação públicas, bem como em novos empreendimentos, como transporte elétrico. A candidata destaca a importância da frente ampla expressa na unidade de partidos e movimentos progressistas para vencer e governar o Paraguai, denuncia os golpes promovidos pelos Estados Unidos na América Latina e resgata o papel da “Pátria Grande”, com visão de integração e solidariedade para avançar e obter melhores resultados para os países e povos.
O que a Frente Guasú-Ñemongeta apresenta de novo ao Paraguai?
A Frente Guasú é uma concertação em que estamos nove partidos e movimentos políticos, composta por sete senadores. Este processo de construção de uma grande unidade da oposição para a chapa presidencial, soma o setor progressista e de esquerda, mas também mobiliza e aglutina forças verdes, indígenas e companheiros que até agora vinham se posicionando de forma abstencionista em relação às eleições.
Como funciona a Frente Guasú-Ñemongeta?
Ñemongeta significa encontro em guarani. É o que foi feito pelo presidente Fernando Lugo antes de 2008, com conversações para debater e construir juntos, espaço político onde se unem as forças progressistas dentro de uma grande concertação.
Realizamos assembleias territoriais nos diversos departamentos [estados] e vamos realizar encontros ampliados com dirigentes de base e departamentais dos diferentes setores sociais, visando consolidar esta lógica de unidade na ação, que vai muito além de um acordo assinado entre dirigentes partidários em Assunção.
Neste momento, qual é o principal desafio?
Acredito que o principal desafio seja precisamente o de chegar à presidência da República dentro da concertação da grande maioria dos partidos oposicionistas, construindo uma proposta que inclua os dois setores, o progressista e o mais conservador. Queremos que, assim como fizemos em 2008, com o Partido Liberal e Lugo, tenhamos uma composição que represente as duas forças.
Como conseguir essa composição?
Em primeiro lugar, é preciso acordar um plano de governo que tenha eixos que nos permitam produzir resultados sociais concretos. Isso será muito importante não apenas pela expectativa criada, como pela necessidade das pessoas.
É preciso dar ao país uma alternância a 70 anos de Partido Colorado, que só esteve fora do poder por 48 meses durante o governo Lugo, entre 2008 e 2012, quando fomos traídos por nossos próprios aliados. Mesmo assim, na disputa eleitoral de 2018 nos faltaram apenas 90 mil votos para o triunfo.
Quais são os eixos prioritários para essa transformação?
A mudança do modelo econômico. Hoje temos um modelo extrativista em que praticamente não se desenvolveu um processo de industrialização, de valor agregado. Sendo assim, seguimos entregando toda nossa matéria-prima quase sem nenhum processamento.
Para transformar o modelo econômico, o tema da reforma agrária e toda a situação das terras é uma prioridade. Sabemos que há mais de seis milhões de hectares em poucas mãos, resultado da corrupção do período da ditadura de Alfredo Stroessner (1954-1989) e isso dificulta a adoção de uma nova política agrícola. Somos um país que produz alimentos para cerca de 80 milhões de pessoas no mundo e, no entanto, não conseguimos abastecer a cesta básica dos paraguaios com qualidade, com soberania alimentar, com produtos que protejam tanto o meio ambiente como a qualidade de vida das pessoas.
Nesse modelo pecuarista-agro-exportador, 70% dos empregos são informais. Como uma estratégia de luta contra a pobreza, necessitamos melhorar a quantidade e a qualidade dos postos de trabalho.
Como pretendem abordar a saúde e educação?
Outro eixo do nosso programa é a reforma de dois setores extremamente deteriorados, pouco desenvolvidos e que são estratégicos: os sistemas educacional e de saúde. Carente de estrutura e com múltiplas deficiências, particularmente o sistema de saúde se encontrou nas piores condições nesta pandemia e foi alvo de inúmeras reclamações.
E a situação fiscal do Paraguai?
Necessitamos de uma reforma fiscal, porque somos um país com praticamente 70% da arrecadação vinda do Imposto sobre Valor Agregado (IVA) e similares [que é de 10% sobre o valor do produto] e não sobre a renda pessoal ou empresarial. Isso faz com que tenhamos um sistema regressivo, injusto, que necessita ser modificado. Precisamos avançar rumo a uma justiça tributária em que quem ganhe mais pague mais e quem ganhe menos pague menos.