Magistrado diz que indulto de Bolsonaro a deputado utiliza lei sem validade
O parecer do juiz amazonense faz parte do conteúdo da denúncia contra Bolsonaro apresentada pela Associação Brasileira de Imprensa (ABI) à Organização das Nações Unidas (ONU). A entidade acusa o presidente de colocar em risco a democracia
Publicado 26/04/2022 12:39 | Editado 26/04/2022 12:51
O juiz da Vara de Execução Penal de Manaus, Luís Carlos Valois, disse que o decreto de Bolsonaro concedendo perdão ao deputado Daniel Silveira (PTB-RJ) utiliza artigo de lei sem validade. “Aprendemos na faculdade que quando uma lei específica regula inteiramente matéria regulada por outra, esta perde validade, é revogada. É o caso da graça do Código de Processo Penal (CPP), utilizada no decreto do presidente”, explicou.
O parecer do magistrado amazonense faz parte do conteúdo da denúncia contra Bolsonaro apresentada pela Associação Brasileira de Imprensa (ABI) à Organização das Nações Unidas (ONU). A entidade acusa o presidente de colocar em risco a democracia no país.
Diante da condenação de Daniel Silveira no Supremo Tribunal Federal (STF) por crimes de ameaça ao Estado Democrático de Direito e coação no curso do processo, a ABI afirmou que o decreto de Bolsonaro concedendo graça ao parlamentar “afronta a democracia, a separação de poderes, a independência do Judiciário e a administração da Justiça”.
Luís Valois destacou que a matéria em questão passou a ser disciplinada como indulto individual na Lei de Execução Penal (LEP) e tem outro procedimento nos dos artigos 188 e os seguintes da LEP. “Segundo a nova lei, a LEP, que é de 1984, e não segundo o CPP, de 1941, não há a possibilidade de concessão de indulto individual de forma espontânea por parte do presidente, como havia no CPP, e deve seguir o procedimento específico da LEP”, esclareceu.
O juiz lembrou ainda que o indulto individual, de origem monárquica e derivada do poder absolutista do Rei, deve ser interpretado dentro dos princípios republicanos, ou seja, nos procedimentos específicos da LEP. “No mais, o indulto individual, nunca utilizado na história, deve sim seguir os princípios dos demais atos jurídicos, de impessoalidade e moralidade, além de dever ser fundamentado. Ato discricionário difere de arbítrio, no arbítrio sim não há necessidade de fundamentação e o ato não precisa seguir princípios”, argumentou.
O magistrado também destacou que o indulto só pode ter seu procedimento instaurado após o início da execução da pena (artigos 105 e 106 da LEP). “O executivo declarar extinta pena antes da condenação viola a divisão de poderes, usurpar poder, pois primeiro cabe ao judiciário julgar, obviamente. Para extinguir pena antes do trânsito em julgado só por lei que revogue aquela pena em abstrato”, considerou.
Valois avaliou também que faz sentido a acusação de que o objetivo de Bolsonaro foi criar um ato ilegal para promover o caos. Para ele, o presidente poderia, por indulto coletivo, estabelecer condições em que se encaixariam o deputado.