“Direitos Já!” anuncia maior evento digital pró-democracia no Brasil
O ato – que será transmissão ao vivo pelo Vermelho e por centenas de páginas – reunirá cem lideranças e personalidades brasileiras, sem disputa de protagonismo
Publicado 23/06/2020 22:37 | Editado 03/09/2020 18:07
Quase 20 meses. Este é o tempo que separa a vitória de Jair Bolsonaro nas eleições presidenciais, em 28 de outubro de 2018, e a realização do 3º Ato em Defesa da Democracia, da Vida e Proteção Social, que será promovido pelo movimento “Direitos Já! Fórum pela Democracia”, na noite da próxima sexta-feira (26/6).
O inédito êxito eleitoral da extrema-direita, lá atrás, parecia sinalizar tempos de dispersão e desmobilização das forças progressistas. Mas o “maior evento digital em favor dos valores democráticos na história do Brasil” indica o contrário: o crescente repúdio ao bolsonarismo e às ameaças fascistas acelerou a formação de uma ampla frente democrática.
A princípio, o governador maranhense, Flávio Dino, do PCdoB, seria o anfitrião do 3º Ato, que estava previsto para 30 de março, em São Luís (MA). Com a pandemia do coronavírus e o necessário distanciamento social, os organizadores adiaram o encontro e adaptaram seu formato – de presencial para virtual.
“No momento de uma pandemia como esta, não temos condições de realizar uma grande marcha pelas ruas contra um governo que faz pouco da vida de cada pessoa, especialmente dos mais humildes, que estão mais expostos. Certamente milhões de brasileiros tomariam hoje as ruas do País”, diz, em entrevista ao Vermelho, o sociólogo e coordenador nacional do “Direitos Já!”, Fernando Guimarães.
Em contrapartida, das ruas para as redes, a representatividade do movimento deu um salto. O ato de sexta-feira – que será transmissão ao vivo pelo Vermelho e por centenas de páginas – reunirá cem lideranças e personalidades brasileiras, sem disputa de protagonismo. “Como nas Diretas-Já, estamos trazendo (para o ambiente virtual) a estética de um palanque com todos esses grandes nomes”, afirma Fernando.
Não há exagero na comparação com a frente que se formou em 1984, no Brasil, para exigir o fim da ditadura militar e o restabelecimento de eleições diretas à Presidência. O coordenador do “Direitos Já!” enfatiza o caráter suprapartidário dos dois movimentos. Ao atual, 16 partidos – da esquerda, do centro e da direita – já aderiram formalmente. Lideranças nacionais de outras legendas, como o PT, também participam.
A articulação não se resume à esfera político-partidária “Nosso ato virtual terá personalidades não só da política – mas de todos os campos: das artes, da ciência, do esporte”, agrega. É um grupo heterogêneo e representativo, que, conforme lembra o material de divulgação, vai do cardeal-arcebispo dom Odilo Scherer à atriz Marieta Severo, passando pelo comentarista esportivo Casagrande, da TV Globo.
Na opinião de Fernando, “é importante que todas as forças democráticas da sociedade consigam construir uma agenda comum, apesar das diferenças ideológicas. Uma agenda que nos permita caminharmos juntos, para assegurar a dignidade das pessoas”. Esse desafio se impõe ainda mais com a nefasta junção de bolsonarismo com coronavírus.
“As profundas desigualdades sociais do Brasil se mostram mais explícitas. Para preservar a democracia, é preciso pensar também em assegurar as condições sociais de se preservar a vida. Não se fala em democracia sem feijão no prato”, afirma o sociólogo. “Se dependêssemos apenas do presidente da República e do governo federal – com sua necropolítica –, não haveria possibilidades de respostas.”
É por isso que um dos objetivos centrais do 3º Ato é apresentar um manifesto em defesa “da democracia e da proteção das políticas públicas necessárias na saúde, na economia, no meio ambiente e nos direitos humanos”. Conforme Fernando, o documento teve “a participação de diversos intelectuais e ativistas”, sendo referendado pelo conselho político do movimento. “Abriremos o manifesto para assinaturas de todos os brasileiros. Esse é o sentido de urgência e de contribuição que o ‘Direito Já!’ traz na construção dessa grande frente ampla pela democracia.”
Na eleição presidencial de 2018, Fernando foi voz minoritária dentro de seu partido, o PSDB. Com a polarização no segundo turno, os tucanos não formalizaram apoio nem a Bolsonaro, nem a Fernando Haddad. Mas, enquanto Guimarães, membro da corrente Esquerda para Valer, declarou voto no candidato do PT, João Doria se elegeu governador em São Paulo com uma campanha abertamente atrelada ao bolsonarismo.
Menos de 24 horas após o anúncio da vitória de Bolsonaro, nascia um movimento suprapartidário, de inspiração democrática, para se contrapor à chegada da extrema-direita ao poder. “Já estávamos preocupados com o avanço autoritário da agenda anticivilizatória, o desprezo pelos valores fundamentais expressados na Constituição brasileira”, lembra Fernando. “Construímos, então, um fórum com amplos setores da sociedade civil e lideranças políticas dos mais diversos partidos – uma frente não eleitoral com foco na defesa do Estado Democrático de Direito”.
O “Direitos Já! Fórum pela Democracia” foi, assim, a primeira iniciativa pós-eleitoral de frente ampla. Por sua ousadia – e também pela rejeição à plataforma mais liberal e direitista que Doria tentava impor –, Fernando chegou a ser expulso do PSDB. Não deixa de ser irônico que, passados quase 20 meses do desfecho da eleição 2018, o governador paulista se tornou – ele próprio – um dos mais incisivos opositores do governo Bolsonaro.
Para Fernando, uma das contribuições mais relevantes das frentes contra Bolsonaro é garantir o pleno funcionamento dos Três Poderes da República. “O Direito Já acredita que a sociedade tem de estar cada vez mais articulada e presente, dialogando e se utilizando de todos na defesa da democracia”, resume.
“Defendemos o papel que a Constituição atribui aos demais Poderes (além do Executivo) no seu sistema de freios e contrapesos, seja pelo Congresso Nacional, seja pelo STF. São instituições que a sociedade deve fortalecer nesse processo de equilíbrio – para não permitir que o presidente extrapole suas atribuições constitucionais, nem os limites que seu cargo tem numa República democrática”, conclui Fernando.
(Colaborou Ana Bueno)
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